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Alessandra Olivato

Fla-Flu

Por Alessandra Olivato

19 de outubro de 2022, às 09h37 • Última atualização em 19 de outubro de 2022, às 09h38

Pudemos constatar claras mudanças nas últimas décadas no pensamento e comportamento social sobre política e eleições, com maior participação do tema nas conversas nas calçadas e bares, mais brasileiros participando de passeatas e assistindo a debates na TV.

Um exemplo talvez pouco notado: praticamente metade dos eleitores que pretende votar no candidato, me perdoem a expressão generalista, “mais feio”, por si só já representa uma mudança interessante em relação à primeira tentativa de Lula, quando perdeu para Fernando Collor de Mello, em boa parte, e não é exagero, pela boa aparência e aura de playboy do alagoano. Também me parece uma mudança relevante a de que muita gente que votará no candidato “menos feio” e atual Presidente da república não o fará por esse motivo, mas porque adquiriu alguma ideia sobre o que é um governo de direita, além da rejeição à alternativa que considera mais corrupta, demonstrando uma parcial deslegitimação da corrupção como atitude pública – sem colocar em pauta, aqui, de que lado está mais a corrupção. Comento apenas mudanças aparentes das motivações do eleitorado brasileiro nos últimos 20, 30 anos.

Entretanto, a despeito dessas e outras mudanças inegáveis, uma parcela não desprezível da população ainda pauta sua escolha em velhos clichês e equívocos gerados não apenas por fake news mas, igualmente, pela irresponsabilidade dos próprios candidatos em reforçar tais imaginários ultrapassados, sobretudo no contexto acirrado da disputa nessa reta final.

Boa parte do voto pela permanência do atual governo e da rejeição a Lula não se deve apenas ao fato de os anos do PT terem sido marcados por corrupção e pelo aparelhamento do Estado mas, sim, ao preconceito contra um brasileiro que tem uma aparência “ruim”, daquele típico brasileiro que é “encrenqueiro”, que nunca teria trabalhado e, na pior das alternativas, que pretende invadir nossas casas e roubar nossas coisas, e que sustentará presos com “mamatas”. Pior ainda, que defende direitos humanos! Enfim, uma série de ideias simplistas, equivocadas, preconceituosas e frágeis diante de qualquer análise mais embasada. Que não se vote no referido candidato por discordar de seu projeto para o país ou por rejeitar a corrupção em seu governo, mas não por esses clichês.

Do outro lado, “intelectuais” e “esclarecidos” que se colocam do lado do bem – ao contrário do “mal” que reforçam em sua visão maniqueísta do mundo – insistem em dizer que a reeleição de Bolsonaro representa um futuro fascista, mesmo que o chefe do executivo esteja participando normalmente do jogo eleitoral, com artimanhas que não perdem em nada para qualquer outro candidato. Nesse sentido, aliás, concordo com a pontuação colocada pelo governador mineiro Romeu Zuma, segundo o qual não parece lógico acreditar que um país do nosso tamanho e com a trajetória democrática que já trilhamos vá virar uma ditadura fascista porque o Presidente diz um monte de impropérios. Isso sempre me pareceu óbvio, assim como me parece óbvio que Lula não tomará nosso patrimônio. Nem este o fez durante seu governo, nem o atual deu um golpe até agora. Claro, posso estar equivocada, mas…

Se nos declaramos democratas, temos que respeitar o resultado das urnas seja qual seja, uma vez presumida a idoneidade e democracia do processo eleitoral, lembrando, inclusive, que a alternância de grupos de interesses no poder é uma autotutela democrática e condição sine qua non para que ela continue a existir.

Mas eu lamento que velhos clichês, preconceitos e equívocos infundados ainda nos limitem a um jogo de fla-flu, impedindo-nos de dar espaço a outras alternativas que morrem antes de chegar à praia. Ainda nos engana soberbamente a crença em um salvador da pátria, típico de uma sociedade paternalista. Um dia, quem sabe, pararemos com essa carência de esperar por um “pai” e enxergaremos as nuances que podem existir entre 8 e 80. Nesse dia sim poderemos dizer que tivemos uma mudança de consciência significativa.

Alessandra Olivato

Mestre em Sociologia, Alessandra Olivato aborda filosofias do cotidiano a partir de temas como política, gênero, espiritualidade, eventos da cidade e do País.