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Saúde em Pauta

Apendicite: o médico que operou a si mesmo

Leonid Rogozov estava isolado em uma base soviética na Antértida, em 1961, e fez sua própria cirurgia

Por Paulo Renato Monteiro da Silva

19 de fevereiro de 2023, às 11h19

O ano era 1961 e muita coisa estava acontecendo. Yuri Gagarin havia dito que “a Terra é azul”, John F. Kennedy havia assumido como o presidente mais jovem dos EUA e, alguns meses depois, através da CIA, passou vergonha na invasão da Baía dos Porcos, em Cuba. Por aqui, Brasília completava um ano, Jânio Quadros iniciava seu mandato presidencial, diga-se de passagem, meteórico.

Muita ocorria no Brasil e no mundo e impactava a vida de milhões, mas uma pessoa viveu um drama sem par, isolada, na Antártida, mais especificamente na base soviética número 6: o médico Leonid Rogozov.

No amanhecer de 29 de abril, ele começou a se sentir indisposto, com dor de cabeça, náuseas e dores abdominais, situação que foi piorando. No dia seguinte, a dor no abdome acabou se fixando na parte baixa da barriga, do lado direito. Ele percebeu que ao apalpar esta região, a dor se tornava mais intensa ao retirar a mão do que quando se apertava. Aliado a isso, passou a ter vômitos e surgiu a febre.

Rogozov contava com apenas 27 anos e embora tivesse se formado recentemente, não tinha dúvidas quanto ao diagnóstico: apendicite. Precisaria agir rápido. O médico ficava sem tempo. Sendo apendicite, sempre tinha a possibilidade de que ele estourasse. Se isso acontecesse, não teria chances de sobreviver. Foi então que começou a considerar a ideia de fazer sua própria cirurgia. Uma loucura, mas sua única opção.

Antes de realizar a cirurgia, Rogozov teve que pedir autorização ao governo soviético, pois se viesse a morrer durante o procedimento, poderia ser uma propaganda negativa para a expedição russa.

Sem nenhuma chance de remoção, quer por navio ou por avião, e como os sintomas haviam piorado – a febre se elevara, os vômitos se acentuaram e a dor estava mais forte –, havia o risco real de que o apêndice perfurasse. Então, se preparou para realizar a cirurgia.

Escolheu dois auxiliares, um engenheiro e um meteorologista. Orientou-os quanto aos cuidados se viesse a ter um desmaio ou uma parada respiratória, e mãos à obra.

Um deles ficou responsável por atuar com os materiais e o outro segurava um espelho para que Rogozov pudesse ver o lugar da operação. Porém, logo abandonou esse espelho devido à dificuldade em se orientar pela imagem invertida.

Iniciou fazendo anestesia local, fez a incisão e foi seguindo de acordo com sua programação. Logo neste início quase perdeu a consciência, mas continuou com calma e paciência. Precisava fazer pausas frequentes, pois se sentia fraco.

Depois de muito lutar, e muitas vezes usando apenas o tato como ferramenta de orientação, Rogozov finalmente encontrou o apêndice – e pela mancha escura em sua base, havia indicativo de que poderia estourar a qualquer momento. Continuou com calma e retirou o apêndice, completando a cirurgia.

Havia conseguido e anotou em seu diário: “ao terminar o procedimento, olhou para seus auxiliares e eles estavam mais brancos que a roupa branca que usavam”. Duas semanas depois, o médico já estava recuperado.

Quando voltou para a URSS, um ano depois, Rogozov foi considerado um herói nacional, comparado a Yuri Gagarin, que tinha se tornado o primeiro homem a chegar ao espaço, dado que esses destacavam a coragem, empenho e capacidade de agir, mesmo em situações adversas.

Paulo Renato Monteiro da Silva – médico alergologista e imunologista
alergiaseculo21@gmail.com

Paulo Renato Monteiro da Silva

O médico Paulo Renato Monteiro da Silva, especialista em alergologia e imunologia, fala sobre temas da saúde em alta e sobre como manter hábitos saudáveis