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146 anos

Entre lembranças e histórias dos bairros tradicionais de Americana

Antigos moradores contam como bairros da cidade eram no passado e como mudaram ao longo dos anos

Por Maria Eduarda Gazzetta

29 de agosto de 2021, às 08h19

Americana soma bairros tradicionais, com pessoas que moram há anos nestes locais. Elas os escolheram por conta de trabalho, lazer, política habitacional ou até mesmo pela tranquilidade em se constituir família e criar os filhos.

A reportagem conversou com moradores antigos de cinco bairros tradicionais da cidade que contaram como foi acompanhar o progresso de cada um deles durante anos e as memórias que guardam destes locais.

São Domingos

Este é o caso do senhor Osmar Zanini. Desde quando nasceu, em 1934, ele mora no Bairro São Domingos e, com o passar de seus 87 anos, foi acompanhando a evolução do bairro, que teve loteamento aprovado só em 1951.

Osmar Zanini e a esposa Neide: ele mora há 87 anos no bairro – Foto: Ernesto Rodrigues / O Liberal

Osmar nasceu na casa dos avós, um sítio que hoje não existe mais. A rua onde era localizado leva o nome de seu avô, o então proprietário, Agostinho Zanini. “Cresci aqui no bairro. A estrada principal era de terra, parecia um sítio”, comentou.

Ao lembrar da evolução do bairro, Osmar diz que a rede de água e esgoto chegou ao São Domingos em meados 1950 e cerca de dois anos depois, a Avenida 9 de Julho, que na época ligava Americana até Santa Bárbara, já recebeu asfalto.

Ele conta que trabalhou e se aposentou em tecelagem. Trabalhou na Companhia Industrial de Tecidos Rayon de Americana, a chamada Citra, onde conheceu a esposa, Neide. Já depois de aposentado, prestou concurso público e passou para o cargo de auxiliar de limpeza em uma escola do bairro Bela Vista, onde ficou até 1992.

“Fiquei na casa onde nasci até 1942, depois mudei para a casa da esquina e em 1969 construí nossa casa no terreno onde meu pai tinha feito uma casa para minha irmã. Criamos nossas filhas, que também cresceram e estudaram no bairro”, comentou.

As três filhas de Osmar e Neide estudaram na Escola Estadual Professora Risoleta Lopes Aranha. Hoje eles têm três netos e dois bisnetos. “Gosto muito do bairro, vi crescer. Há 80 anos não tinha nada, só fazenda e sítio. Foi crescendo e crescendo. Não tem mais jeito de sair daqui”, comentou rindo.

Até mesmo Neide, que veio de Parapuã com a família aos 9 anos para a Vila Rasmussen, não se vê longe do São Domingos. “Me mudei aqui quando casamos, há 65 anos. Hoje, quando eu saio, não vejo a hora de voltar para nossa casa”, diz Neide, aos 84 anos.

Jardim São Paulo

Quem passa por Americana, não deixa de notar o bairro próximo à Avenida Brasil, via que é um dos cartões postais do município. Mas ninguém imagina que em 1961, quando o loteamento foi aprovado, todo seu entorno era mato. Isso é o que conta o casal Lourdes e José Basso. Eles têm 91 anos e desde 1965 são moradores do bairro.

“Não tinha asfalto, não tinha esgoto e nem muitas casas aqui ao redor. A Avenida Brasil não existia, era um mato só. Já hoje, não tem lugar para estacionar”, conta Lourdes, rindo ao lembrar.

O casal Lourdes e José estão entre os primeiros moradores – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

Seu José relembra que o terreno da casa onde ele e a esposa moram até hoje, na Rua Fonte da Saudade, foi doado pelo seu pai. “Ele deu o terreno e nós construímos a casa. Todos os nossos filhos foram criados aqui”, informa. Ele e Lourdes tiveram três filhos, sendo dois já falecidos. Hoje eles têm três netos e dois bisnetos.

Ao relembrar sobre histórias marcantes no bairro, Lourdes conta que toda segunda-feira era dia de rezar o terço com as amigas. “Desde quando viemos morar aqui, fiz amizade e toda semana nos reuníamos na casa de alguém para rezar. Sempre no fim do ano fazíamos uma festinha. Hoje, infelizmente, por conta da pandemia, tivemos que parar”, conta com saudades.

Seu José fala sobre as boas lembranças que tem não só do bairro, mas também da cidade. “Americana era muito importante na tecelagem. Eu me aposentei como contramestre na Oyapoc, empresa que ficava no Nova Americana. Também me lembro que eu ia passear lá em Carioba, tinha baile, era muito bom”, disse. O casal, que está junto há 70 anos, também não quer deixar o bairro e a casa onde formaram família.

Vila Omar

Já um pouco mais recente, com aprovação de loteamento em outubro de 1974, a Vila Omar atraiu a família do senhor Enoc Luis de Lima, de 95 anos.
Nascido na Bahia, Enoc veio pequeno para São Paulo e junto com sua família se instalou na região de Marília. Já casado e com três filhos, aos 43 anos escolheu Americana para morar.

”Americana estava se formando, tendo boa fama de emprego. Tinha um amigo que veio para cá e falou que aqui tinha progresso. Então foi quando viemos”, conta.

Quando Enoc mudou para o bairro, eram apenas quatro moradores no local e muito eucalipto – Foto: Ernesto Rodrigues / O Liberal

Quando chegou, em 1968, se instalou na Vila Amorim, mas depois de cinco anos já estava na nova casa, na Vila Omar. “Com três anos no bairro, comprei o terreno, mas como o campo do Guarani ficava aqui, precisamos esperar eles saírem. A trave ficava bem onde hoje é a sala”, relembra.

Ele conta que quando chegou ao bairro eram apenas quatro moradores. “Tinha plantação de eucalipto e dava para contar quem morava aqui”. O morador também lembra que o bairro não possuia água e nem esgoto e que foi o então prefeito Ralph Biasi quem fez a instalação das redes no bairro.

Enoc foi funcionário da Prefeitura de Americana por seis meses e depois acabou transferido para trabalhar no DAE (Departamento de Água e Esgoto) do município, onde ficou por 21 anos, até se aposentar, em 1992.

Hoje, aos 95 anos, ele conta que ama o bairro que escolheu viver. “Sou feliz aqui, nunca tive vontade de sair e não posso reclamar”, diz ele, que é viúvo e tem três netas, um neto e dois bisnetos.

Vila Dainese

Apesar de se mudar, de fato, para a Vila Dainese em 1977, aos 25 anos de idade, Neusa Maria CarolinaPereira da Silva conta que passou boa parte de sua juventude frequentando o bairro com amigos, colegas de turma do antigo Colégio Kennedy, hoje Escola Estadual “Dr. Heitor Penteado”.

Neusa passeava na gruta aos finais de semana e participava de eventos beneficentes – Foto: Ernesto Rodrigues / O Liberal

“Eu também era da igreja do bairro. Então vinha para encontro de jovens. Também íamos para a gruta no fim de semana, era muito bom. Eu posso dizer que era uma época muito boa”, comenta.

Dona Neusa relembra que participou de eventos beneficentes para angariar fundos para a construção da Paróquia Divino Espírito Santo. “Fizemos muita quermesse com a irmã Generosa e com o padre Vitor, que na época estava aqui. Foi muito bom mesmo”, detalha.

Ela conta que quando comprou sua casa na Vila Dainese, mesmo após 26 anos da aprovação do loteamento do bairro, que aconteceu em 1951, o local não tinha asfalto e o entorno era formado por plantações de algodão.

“Depois veio o asfalto e hoje está cheio de indústria, prédio, e muitas melhorias”. Neusa, hoje com 69 anos, conta que constituiu família no bairro, onde teve três filhos. “Criamos nossos filhos com muita liberdade, andando de bicicleta, brincando na rua. Eles curtiram muito o bairro”, finaliza ela, que hoje é avó de uma neta e quatro netos.

Zanaga I

Moradores do Zanaga I desde novembro 1978, ano em que o bairro foi entregue, Odete e Francisco de Azevedo contam que quando saíram do tradicional bairro Vila Medon e chegaram no Zanaga, não havia luz e tampouco asfalto.

Neste ano, todas as 709 casas do bairro já haviam sido sorteadas e entregues por meio do programa Cohab (Companhia de Habitação Popular, de responsabilidade dos governos municipais), mas a família deles foi uma das poucas que logo se mudaram para o novo bairro.

“Não tinha iluminação nas ruas, então durante a noite as pessoas deixavam as luzes das casas acesas para iluminar a rua e quem passasse”, comenta Francisco, hoje com 89 anos.

Odete, Francisco e Cris são antigos moradores do bairro que viram crescer e progredir – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

Naquela época, lembra, muitas famílias ainda não tinham se mudado para o bairro porque estavam reformando as casas. “Nós também reformamos. Tinha uma sala, banheiro e cozinha, era uma casa de dois cômodos. Então, aos finais de semana, eu e meu cunhado, que era pedreiro, fomos arrumando e ampliando”, informa.

Cristiane de Azevedo, filha do meio do casal, relembra que quando chegou no bairro não havia ônibus. Ela tinha 12 anos, enquanto seus irmãos 5 e 14 anos. Ela diz que para ir à Escola Estadual Doutor João de Castro Gonçalves, no também tradicional bairro Conserva, onde terminaria o ano letivo, era necessário andar muito tempo para pegar o transporte público.

“Sem asfalto, o que tinha era uma terra vermelha. Para pegarmos ônibus, tínhamos que descer e tomar cuidado para não cair. Se caísse, principalmente em dias chuvosos, tínhamos que voltar para casa para trocar de roupa”, relembra Cris, sobre os primeiros anos como moradora do Zanaga.

Ela conta que depois de um bom tempo, a instalação de iluminação
e a construção de asfalto foram acontecendo. “Não sei precisar quando isso aconteceu, mas lembro que foram muitas as reivindicações que a Sabvaz [Sociedade Amigos de Bairro da Vila Antonio Zanaga] conquistou para todos os moradores”.

Depois de um ano no Zanaga, Cris transferiu os estudos para o bairro e fez parte da turma inaugural da Escola Estadual Prefeito Antônio Zanaga, a escola PAZ, como é conhecida. Dona Odete, também já adaptada ao bairro, prestou um concurso municipal para ajudante de merendeira na Escola Municipal de Educação Infantil Toriba e passou. Lá ficou até se aposentar e viu muitas crianças, hoje já jovens e adultos, crescerem.

Seu Francisco também começou a trabalhar no bairro, onde fez parte do quadro de membros do Sabvaz por 10 anos. “Lembro que fizemos campeonatos de futebol, o Vilanza, e também bailes no centro comunitário”, relembra.

Depois de 48 anos no local, a família é unânime em dizer que não trocaria o Zanaga por outro lugar para viver. “Não dá nem para acreditar em ver como está o Zanaga hoje, melhor impossível. Para mim está nota 10, daqui não saímos”, finaliza seu Francisco.

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