Inquérito das fake news
CPI identifica 2 milhões de anúncios do governo em sites de ‘conteúdo inadequado’
Lista inclui páginas que difundem fake news, que promovem jogos de azar e até sites pornográficos
Por Agência Estado
03 de junho de 2020, às 11h14 • Última atualização em 03 de junho de 2020, às 11h43
Link da matéria: https://liberal.com.br/brasil-e-mundo/politica/cpi-identifica-2-milhoes-de-anuncios-do-governo-em-sites-de-conteudo-inadequado-1223074/
Relatório produzido pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Fake News mostra que o governo federal investiu dinheiro público para vincular 2 milhões de anúncios publicitários em canais que apresentam “conteúdo inadequado”.
A lista inclui páginas que difundem fake news, que promovem jogos de azar e até sites pornográficos. Canais que promovem o presidente Jair Bolsonaro também receberam publicidade oficial.
O documento, produzido por consultores legislativos, tem como base informações da própria Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) referente ao período de junho a julho do ano passado. Os dados foram obtidos via Lei de Acesso à Informação pela CPI e revelados pelo jornal O Globo.
Segundo o relatório, a maior parte dos anúncios está relacionada à campanha do governo para promover a reforma de Previdência, aprovada no ano passado no Congresso. A verba da Secom foi distribuída por meio do programa Google Adsense, que paga um valor ao site a cada vez que um usuário clica na publicidade ou apenas visualiza.
No topo da lista dos que mais receberam verba pública para divulgar a publicidade oficial está o site “Resultados Jogo do Bicho”, com 319.082 impressões – a quantidade de vezes que o anúncio foi exibido aos usuários do site. O jogo do bicho é proibido no Brasil e sua prática é considerada uma contravenção.
Outra descoberta da CPI é que dos 20 canais no YouTube que mais veicularam anúncios da Nova Previdência (nome da campanha governo), 14 são primordialmente destinados ao público infanto-juvenil. Entre eles, até mesmo um que tem todo o seu conteúdo em russo.
“Juntos, esses 14 canais infanto-juvenis concentraram 2.392.556 das 12.026.980 impressões da campanha da Nova Previdência veiculadas no YouTube entre 06 de junho e 13 de julho de 2019 (19,89% de todos os anúncios veiculados no YouTube nesse período)”, diz trecho do relatório.
Ao todo, a CPI identificou que os mais de 2 milhões de anúncios foram exibidos em 843 canais diferentes. Destes, 741 eram no YouTube, mas foram removidos após a página de vídeos apontar irregularidades, como conteúdo inadequado ou que desrespeita direito autoral.
Sites de notícias falsas também embolsaram uma boa fatia da verba pública destinada pelo governo. O relatório da CPI aponta como um dos campeões de veiculação de anúncios oficiais, com 66.431 impressões, o “Sempre Questione”. “O portal traz ‘matérias’ sobre múmias alienígenas escondidas em pirâmides do Egito, colisores de átomos que abrem portais para o inferno e baleias encontradas em fazendas a centenas de quilômetros do litoral”, aponta o levantamento da comissão.
Há também publicidade oficial em páginas de apoiadores e que promovem Bolsonaro. O relatório cita como exemplo o canal de YouTube “Bolsonaro TV” e os aplicativos para celular “Brazilian Trump”, “Top Bolsonaro Wallpapers” e “Presidente Jair Bolsonaro”.
A destinação de dinheiro público para este tipo de conteúdo pode gerar questionamentos legais ao governo com base no princípio constitucional da impessoalidade, pois, segundo a consultoria legislativa, “abre a possibilidade de se interpretar tal fato como utilização da publicidade oficial para promoção pessoal, conduta vedada pela Carta Magna.”
O site “Terça Livre”, do blogueiro Allan dos Santos, também aparece na lista dos que receberam dinheiro público por meio de anúncios da Nova Previdência. Santos é um dos alvos do inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal e teve documentos e equipamentos apreendidos na semana passada pela Polícia Federal. Ele nega irregularidades no conteúdo que propaga.
Procurada, a Secom não se manifestou até a publicação desta matéria.