18 de outubro de 2024 Atualizado 06:23

Notícias em Americana e região

8 de Agosto de 2019 Atualizado 13:56
MENU

Publicidade

Compartilhe

Notícias que Inspiram

Superação: de empregada doméstica para advogada

Conheça a história da mulher que batalhou para ser chamada de doutora e hoje defende os direitos dos trabalhadores

Por Jucimara Lima

14 de agosto de 2023, às 07h29 • Última atualização em 14 de agosto de 2023, às 11h30

Quem olha a mulher determinada que encara juiz no tribunal trabalhista e não se intimida diante das adversidades não imagina tudo o que a advogada Abiqueila Moraes, de 44 anos, já passou. Queila, como é carinhosamente chamada, é filha de uma trabalhadora rural com um operador de caldeira, sendo uma das mulheres entre três irmãs e três irmãos.

Aos 12 anos, começou a trabalhar em uma confecção, sonho do pai que lhe pagou um curso de corte e costura para que ela pudesse seguir carreira na profissão. “Na época, ter bastante filho significava ter mais fonte de renda. Meu pai tinha essa mentalidade”, recorda.

Apesar das dificuldades, Queila nunca desistiu de ter uma vida melhor – Foto: Marcelo Rocha / Liberal

Apesar de não gostar, Queila obedeceu ao pai e ingressou na área, trabalho que só durou dois dias, porque ela não tolerou o assédio moral praticado pelo encarregado.

“Ele gritou comigo e jogou um monte de sapatilhas em cima de mim, mandando desmanchar o que tinha feito. Joguei de volta tudo em cima dele, virei as costas e fui embora. Depois, fiquei sabendo que minha ação incentivou outras pessoas a tomarem uma atitude. Então, achei que valeu a pena”, diverte-se.

📲 Receba as notícias do LIBERAL no WhatsApp

Longa Trajetória
Após o episódio, Queila foi babá e pouco depois iniciou sua trajetória como trabalhadora doméstica, algo que fez até se casar, aos 21 anos. Com o nascimento do primeiro filho, Oberdan, ela ficou um tempo sem trabalhar e quando voltou tentou novamente a área têxtil. “Nessa fase, fiquei em um nível de estresse tão grande que tive até problemas estomacais. Como tudo era pago por produtividade, a pressão era muito grande, por isso, preferi voltar para as faxinas”.

Com apenas o ensino fundamental, vez ou outra o marido comentava que ela precisava voltar a estudar. Assim, depois de muita insistência dele, em 2007, Queila foi fazer o Ceeja (Centros Estaduais de Educação de Jovens e Adultos).

“Fiz 6 meses de telessala e o restante das matérias foi eliminado em um dia de prova. Conclui o ensino médio em seis meses e um dia. As pessoas me questionavam, diziam que isso não iria agregar nada. Ainda assim, conclui, especialmente porque me senti desafiada.”

Siga o LIBERAL no Instagram e fique por dentro do noticiário de Americana e região!

Vencendo os desafios
O prazer pelo desafio foi o mesmo que a impulsionou a prestar o famoso vestibulinho da Etec (Escola Técnica Estadual), para o curso técnico de administração, assim como o mesmo que a levou a deixar o curso, por não se identificar com a área, e prestar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).

“Lembro que estava fazendo uma faxina e liguei em um curso preparatório para saber sobre aulas e a atendente até achou engraçado meu interesse, porque segundo ela, quem iria prestar já estava estudando há muito tempo.”

Com 45 acertos de um total de 90 questões e o surpreendente desempenho na Redação (fruto do hábito da leitura), Queila conquistou uma bolsa de 100% no Unisal, em Americnaa.

“A princípio, minha ideia era fazer Pedagogia, porque mesmo me interessando pela área jurídica, o direito era um sonho muito distante, contudo, quando fui me inscrever, tinha vaga no curso e tomei coragem de encarar.”

Assim, em 2011, além de ser caloura do curso de direito, ela tomou posse de seu cargo de monitora de creche, após passar em um concurso público um ano antes, outra conquista muito importante em sua vida. “Falo que foi o ano da virada, porque era estudante do curso de sonhos e uma funcionária pública”, brinca.

Novas Barreiras
Como nem tudo são flores, no meio do curso, Keila ficou grávida do segundo filho, Maria, e por ser uma gravidez de risco, precisou trancar a faculdade. Segundo ela, quando voltou, um problema de saúde da filha prejudicou seu desempenho acadêmico e emocional e a deixou com pendências.

“Demorei três anos e algumas sessões de terapia para tomar coragem de voltar para a faculdade. Meus amigos e minha família me incentivaram muito e graças a eles, consegui”. Formada, em 2019, Queila passou a focar na prova da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Após um intervalo e três tentativas, foi aprovada em 2021.

“Eu pensava: quantas vezes eu reprovar eu volto, porque depois de tudo que passei, nada vai me derrubar”.

A escolha certa. Especializada na área de direito trabalhista, atualmente “doutora Abiqueila” atua no escritório de advocacia de uma grande amiga que conheceu na faculdade. Para Fabiana Fantim, de 39 anos, a história dela é incrível e merece ser compartilhada.

“Ela é uma pessoa muito humana e determinada. Tenho muito orgulho de tê-la conosco, porque sua força inspira outras pessoas”, declara.

Tanto é assim, que hoje, o marido, que sempre lhe incentivou a estudar, está no sexto semestre de direito. “Quando ela luta por uma causa, não veste só a camisa, veste o uniforme todo, sempre com ética, coerência e sem perder seus princípios”, elogia Oberdan Alves de Oliveira, de 45 anos.

Pandemia
Durante a pandemia, dificuldades financeiras a desafiaram mais uma vez. ”Comecei a vender marmita, pois meu marido havia perdido o emprego, e o salário de monitora não dava para pagar o aluguel, então, peguei o que tinha comprado para passar o mês e comecei. Fiquei com a marmitaria até dezembro de 2022”.

Momento Atual. Realizada, a advogada reflete sobre sua trajetória .“Outro dia me perguntaram se eu queria ser advogada, quando crescesse. Respondi que eu só queria chegar viva no outro dia, porque as coisas eram muito difíceis. Hoje, sou a primeira pessoa da família a ter curso universitário, então, eu fui muito além do que meu pai sonhou para mim”, finaliza ela, que mesmo sendo uma iniciante na carreira, já contabiliza vitórias nos tribunais.

SUGIRA E COLABORE
Se você conhece uma boa história que todo mundo merece saber, conte para a gente. Ela pode virar uma reportagem no LIBERAL.

Publicidade