Quando um livro se propõe a abordar um tema delicado como o fim da vida, pode facilmente cair na auto-ajuda. Mas em “O que você está enfrentando”, a premiada Sigrid Nunez consegue trazer uma obra muito diferente do que se espera. Ela escolher trilhar o caminho da franqueza, mesmo que isso signifique trazer à tona lados sombrios do ser humano. O resultado é um livro melancólico, mas incrível.

Lançada em 2021 pela Editora Instante, a obra traz a história de uma escritora que acompanha uma amiga com câncer. As chances de sucesso do tratamento são baixas, e a paciente escolhe não seguir com ele. Nesse caminho até o fim de sua vida, ela reflete sobre seus sofrimentos e alegrias de uma maneira muito sincera.

Ao encarar a morte, a amiga precisa, por exemplo, lidar com o fato de não ter tido uma boa relação com a filha. Em uma obra com outra abordagem, mãe e filha encontrariam um caminho para retomar a relação. Nesta, a personagem diz: “Estou reconciliada com o fato de não termos nos reconciliado”. É dolorido, mas é verdade desta personagem.

Um dos méritos da americana Sigrid Nunez no livro é criar personagens muito reais. A situação com a amiga se reveza com as conversas que a escritora (de quem não conhecemos o nome) tem com outros personagens. Através de sua escuta atenta e interessada, mergulha em histórias de vida comuns, mas que mostram que todo mundo está enfrentando uma batalha invisível.

O leitor conhece as tristes histórias de uma idosa que vai perdendo a sanidade, de uma mulher que lamenta o processo de envelhecimento, da solitária anfitriã de um quarto de aluguel, de um homem que perde a fé na humanidade, e até de um gato que veio de um abrigo. A empatia dói, e o livro consegue traduzir esse sentimento.

Essa leitura foi surpreendente de várias maneiras. Não me oponho a livros que trazem lições edificantes, e abordagens otimistas não me incomodam. Mas “O que você está enfrentando” é corajoso de uma forma admirável, e por isso mesmo faz refletir sobre a vida de forma profunda e franca.

“[…] não existem seres humanos verdadeiramente imbecis, nem vidas humanas desinteressantes, e qualquer um descobriria isso se estivesse disposto a sentar e ouvir as pessoas”, Sigrid Nunez em “O que você está enfrentando”.