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Patrik Camargo Neves

As incertezas do direito

O direito é uma ciência viva, mutante, em constante evolução. E sempre tem uma história por trás de cada decisão

Por Patrik Camargo Neves

05 de julho de 2021, às 11h25 • Última atualização em 05 de julho de 2021, às 11h26

Uma das coisas mais incríveis do direito é que sempre há uma história em cada caso. Isso fica muito mais nítido quando se avalia as decisões, as sentenças judiciais. Sempre proferidas por um juiz, uma pessoa, que tem suas histórias, suas experiências, suas crenças e opiniões. Um juiz é, ou deveria ser, um operador do direito. Uma ferramenta afiada, de alta precisão, que conhecesse profundamente o direito e o aplicasse, da maneira mais pura e imparcial. E quando falo imparcial, falo sobre deixar de lado suas opiniões pessoais, suas experiências, crenças e valores. E pensar, olhar, aplicar puramente o direito. Impossível, obviamente.

E por ser impossível, cabe a nós, operadores do direito, não deixar de considerar que não há decisões absolutamente imparciais. Quer um exemplo rápido para ilustrar o conceito? Imagine que um juiz de direito tenha seu nome indevidamente inscrito no Serasa, como mau pagador. E que este fato lhe cause grandes transtornos, que ele perca a chance de comprar uma boa casa, ou que tenha um crédito negado para financiar uma viagem ou a escola do seu filho. E que ele tenha as mesmas dificuldades que um cidadão comum (aliás, ele é um cidadão comum), para tirar o seu nome do Serasa. Imaginou? Agora imagine que sua empresa negativou indevidamente um cliente, ele entrou com uma ação judicial pleiteando danos morais e esta ação caiu exatamente nas mãos deste juiz do nosso exemplo. Você prefere deixar este juiz julgar este caso da sua empresa ou fazer logo um acordo com o autor da ação? É disso que eu estou falando.

As incertezas do direito – Foto: Alexandre Bassora

Então, o advogado faz tudo como sempre fez: avalia o caso, organiza as provas, apresenta para um juiz utilizando os mesmos fundamentos, corretos fundamentos, que usou em outras vezes e não consegue garantir para o cliente que terá o resultado esperado. E isso é um pouco frustrante, um tanto angustiante, porque seu cliente olha para você e diz: como assim, doutor? E você, com anos e anos de experiência, não consegue dar uma explicação que o conforte, porque o direito é uma ciência viva, mutante, em constante evolução. E sempre tem uma história por trás de cada decisão.

Nós, advogados, geralmente achamos a matemática complicada demais. Difícil demais, quase impossível de entender. Mas conforme o tempo passa e lidamos com centenas, milhares de processos, e nos deparamos com sentenças absolutamente diferentes sobre os mesmos temas, os tribunais superiores divergindo dentro das câmaras e entre as câmaras, desembargadores proferindo votos absolutamente incompatíveis versando sobre os mesmos artigos das mesmas leis, sentimos uma saudade danada dos estudos e aplicações onde 2+2 era sempre igual a quatro.

O direito é lindo, mas é um desafio incrível. E, às vezes, só às vezes, seria bom que qualquer lei ou processo se assemelhasse a um seno ou cosseno. Que pudéssemos encontrar um pi qualquer em um processo, que houvesse o que houver, o resultado seria o esperado. Não é assim. E tudo bem. Seguimos.

Patrik Camargo Neves

Advogado de Americana, especialista em direito empresarial, aborda o cotidiano e os desafios de empreender em textos às segundas