Alessandra Olivato
Ética e responsabilidade nos concursos públicos
Cada vez mais milhares de pessoas dedicam-se ferrenhamente a estudar para concursos; seria essencial que as bancas organizadoras fossem o mais competentes, honestas e transparentes possível
Por Alessandra Olivato
13 de abril de 2024, às 08h00 • Última atualização em 12 de abril de 2024, às 15h51
Link da matéria: https://liberal.com.br/colunas-e-blogs/etica-e-responsabilidade-nos-concursos-publicos/
Aproximam-se mais dois concursos públicos na cidade de Americana. Aliás, não só em Americana. Principalmente após a pandemia, vivemos o auge dos concursos públicos, resultando até em um concurso nacional unificado.
Quem presta concurso hoje sabe que são totalmente diferentes de há 20, 30 anos. Em primeiro lugar, na maioria dos casos, são concorridíssimos – mais um reflexo, a meu ver, de um país que até hoje não assegurou um nível de empregabilidade decente para seus cidadãos, levando cada vez mais pessoas a verem no funcionalismo público uma das poucas chances de conseguirem um emprego. Afinal, no geral os salários e os benefícios são muito atrativos, além da estabilidade.
Cada vez mais milhares de pessoas dedicam-se ferrenhamente comprando apostilas, cursos, dispendendo não apenas certo investimento financeiro como, mais importante, seu tempo. Por vezes há um esforço considerável, como mães super atarefadas que só conseguem estudar uma ou duas horas à noite, às vezes nem isso; ou pais de família que, desacreditados em voltarem ao mercado de trabalho, colocam-se a árdua tarefa de voltarem a estudar depois de muitos anos. E não é pouco.
Para os que estão a sério na empreitada, no geral a aposta é bem alta: mexe com necessidades, sonhos, esforço, crença em si mesmo. Quem já prestou seriamente pelo menos um concurso sabe o volume do material a ser estudado. Mas não é só volume. Com exceção de alguns poucos casos, que depende de vários fatores, para que você tenha alguma chance real, hoje, deve acertar no mínimo 80% da prova. Mas isso são as provas um pouco mais “fáceis”; no geral, mesmo, o nível de acerto de um aprovado é de 90% – de todas as matérias. Chegar a esse nível requer não apenas qualidade de estudo, mas tempo de dedicação. Lembro-me do vídeo de um rapaz que estudou seis anos para Auditor da Receita Federal, um dos concursos mais difíceis do país. Passou. Imaginem o investimento, a resiliência, a esperança, a determinação. Louvável. Não é para todo mundo.
Nesse sentido, vale dizer que seria no mínimo essencial que todas as empresas realizadoras de concursos (as chamadas bancas), que ganham uma concorrência e dinheiro público para realizá-los tivessem como premissa irredutível serem as mais competentes, honestas e transparentes possível. Que tivessem o devido respeito para com as centenas ou milhares de pessoas que ainda acreditam que exista coisa honesta nesse país, e que possibilidade de conquistar algo com esforço pessoal possa valer em todos os casos.
Há bancas muito respeitadas no Brasil, como a Vunesp, responsável por concursos muito organizados, processos transparentes e provas muito bem elaboradas. Inclusive, apesar da competência reconhecida, a Vunesp não raro anula questões ou muda gabaritos quanto constata que cometeu algum erro. Mas infelizmente não é o caso de todas. Já vi perguntas de provas de concurso praticamente plagiando páginas facilmente encontradas pelo Google. Em sites de exercícios é possível encontrar questões absolutamente mal formuladas, ambíguas, sem resposta certa ou com duas alternativas corretas, além de outras eventualidades. Há casos em que a questão é fora do que está descrito no edital, ou de assunto alheio à disciplina exigida para o cargo. Geralmente as que assim agem são justamente as que não reconhecem os erros, não corrigem gabarito e muito menos anulam questão. Como ficam, nesses casos, as pessoas que estudaram e levam a sério o concurso?
Tiro meu chapéu para os concurseiros desse país e torço para que os próximos certames sejam transparentes, éticos e honestos, e não menos importante, competentes. É uma grande responsabilidade, trata-se do povo brasileiro.
Mestre em Sociologia, Alessandra Olivato aborda filosofias do cotidiano a partir de temas como política, gênero, espiritualidade, eventos da cidade e do País.