22 de outubro de 2024 Atualizado 14:19

Notícias em Americana e região

8 de Agosto de 2019 Grupo Liberal Atualizado 13:56
MENU

Publicidade

Compartilhe

Brasil e Mundo

Grupo europeu refaz convite ao Brasil para cúpula de procuradores contra facções internacionais

Por Agência Estado

22 de outubro de 2024, às 14h15

Em meio aos debates da primeira Cúpula dos Procuradores-Gerais (PG20), no Rio, uma presença em particular pode colocar pressão no governo Lula e no Itamaraty para que a Procuradoria da República passe a integrar o grupo considerado como “o estado da arte” das iniciativas do Ministério Público em âmbito internacional. A parceria pode levar ao avanço das ações de combate ao crime organizado transnacional, inclusive contra o PCC e sua extensa atuação internacional.

A expectativa é a de que as tratativas e encaminhamentos do PG20 – que é realizado no Rio nesta semana, sob presidência da Procuradoria brasileira do G20 – destravem o aceite de um convite ao Brasil ainda no governo Bolsonaro, que parece ser “empurrado com a barriga” desde então.

A presença em questão é a de Boštjan Škrlec, vice-presidente da Eurojust – iniciativa que reúne os MPs de todo velho continente, além de 12 procuradores de países estratégicos. Em reunião bilateral realizada no PG20, Škrlec reiterou, ao procurador-geral da República Paulo Gonet, o convite para que o MPF passe a integrar a organização internacional.

Ao Estadão, ele afirmou que a Cúpula de PGRs é “mais uma confirmação” do compromisso do País em desenvolver parcerias internacionais no combate à crimes transnacionais. “A União Europeia espera logo continuar com as negociações”, disse.

Segundo o vice-presidente da Eurojust, o acordo visado envolve a troca de informações operacionais e permite que o Brasil mantenha um procurador na sede do órgão em Haia, “onde os procuradores atuam lado a lado em investigações”. Esses procuradores têm acesso a uma série de ferramentas únicas e tecnologia de ponta, garante.

Boštjan Škrlec afirma que investigações conjuntas aumentam exponencialmente a partir do momento em que um País é fisicamente representado na sede do grupo. Esse aumento tem relação com o fato de organizações criminosas operarem hoje em escala global, sendo necessário que as autoridades colaborem entre si além das fronteiras.

Na abertura do evento, Gonet afirmou que a expectativa é a de que o Brasil assine o acordo. O procurador destacou como a parceria entre os MPs que compõem o Eurojust permite uma troca de informações em tempo real, assim como a atuação conjunta das Procuradorias.

A comparação mais próxima da magnitude da Eurojust é com a Europol. A Polícia ainda tem uma instituição “mais alta” em nível internacional, a Interpol – a Polícia Internacional, com ramificação em quase 200 países.

No caso dos Ministérios Públicos, não há organização “mais importante” que a Eurojust, indica o vice-procurador geral da República Hindemburgo Chateaubriand Filho. “Não tem nada igual no mundo.”

Hindemburgo explica que a Eurojust coordena toda a cooperação internacional entre os Ministérios Públicos da Europa e também com os países convidados a participar do grupo.

Atualmente doze países fora da União Europeia compõem o grupo: Albânia, Georgia, Noruega, Islândia, Moldova, Montenegro, Macedônia do Norte, Sérvia, Ucrânia, Reino Unido e Estados Unidos.

Segundo o vice-PGR, a Eurojust tem critérios muito restritos para convidar países a participarem do grupo. Trata-se de uma instituição consolidada e amplamente reconhecida, com mais de 20 anos de atuação, e que convida países a integrarem a organização para ampliar as investigações sobre o crime organizado transnacional. O grupo coopera apenas com órgãos análogos.

O Ministério Público Federal já é um ponto focal da Eurojust, tendo participado de forças-tarefa intermediadas pela organização, como as que prenderam integrantes da máfia italiana. Essa parceria foi destacada inclusive por Škrlec, que citou a prisão de integrantes da Cosa Nostra – máfia que inspirou a trilogia O Poderoso Chefão – em outubro, no Rio Grande do Norte.

Segundo ele, as investigações que levaram à prisão de mafiosos italianos no Brasil começou em 2022 e incluiu bloqueios de valores e empresas no exterior.

Apesar de a Procuradoria já atuar, em algumas investigações intermediadas pela Eurojust, se o Brasil se tornar um membro participante do órgão inúmeras possibilidades de investigação seriam abertas, avalia Hindemburgo, considerando que a natureza do vínculo é mais forte. “Há uma diferença entre ser um convidado e ser sócio do clube. O nível da parceria cresce e claro que se abrem possibilidades”, indica.

Segundo Hindemburgo, se o Brasil efetivamente se tornar um membro da Eurojust, as oportunidades se abrem especialmente para o combate do crime organizado e das grandes facções internacionais. A parceria poderia inclusive turbinar as investigações, em nível internacional sobre o PCC, que hoje tem uma atuação marcante em inúmeros países.

A maior facilidade em investigar esses crimes seria um resultado do maior diálogo entre o Brasil e outros países, considerando o acesso mais fácil e qualificado possibilitado pela Eurojust. “Cooperação pressupõe conhecimento e confiança. Você não coopera com quem você não conhece”, explica Hidemburgo.

A aproximação seria, inclusive, física. Isso porque os países que integram a Eurojust mantêm um procurador representante da nação na sede em Haia. Isso permite que os integrantes dos MPs parceiros da instituição possam simplesmente bater à porta do gabinete de um procurador de outro país. A avaliação é a de que são criadas condições perfeitas para o diálogo, troca de informações ou resolução de dúvidas.

Convite

No MPF, a avaliação é a de que o convite veio após a entidade mapear a maneira como hoje operam as organizações criminosas, considerando o grande volume de crimes praticados com origem no País e destino na Europa. Além disso, a atuação do MPF como parceiro fez com que a instituição se mostrasse confiável, pensam integrantes da Procuradoria.

Outra questão que propiciou o convite – algo que sempre foi de interesse do Ministério Público Federal -, foi o fato de o Brasil ter desenvolvido uma legislação mínima que permite a relação almejada, em especial a instituição da Lei Geral de Proteção de Dados.

Para a formalização do ingresso do Brasil no Eurojust foi apresentado ao governo federal, via Ministério das Relações Exteriores, um convite, ainda na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. À época, o chefe do Ministério Público Federal era o ex-procurador-geral da República Augusto Aras, antecessor de Gonet. Portugal presidia o Conselho da Europa.

O documento encaminhado ao MRE estabelece algumas condições para a parceria entre a Eurojust e o Brasil. Uma assinatura implicaria em um tratado internacional que, segundo Hindemburgo, é de “interesse óbvio” do Brasil. “(A parceria) não irá trazer um avanço miraculoso, mas uma vez parte do processo será desenvolvida a capacidade de atuação no combate ao crime organizado.”

O Estadão apurou que a Agência Nacional de Proteção de Dados já deu parecer favorável à parceria entre o Brasil e a Eurojust. No entanto, o motivo de as negociações não terem deslanchado é considerado um “mistério”. Até o impacto da Operação Lava Jato e a disputa de poder envolvendo a possibilidade de eventualmente haver um representante do MPF em Haia são aventados como possíveis entraves internos para as tratativas.

Nos bastidores, considera-se a negociação arrastada, com episódios que se destacam. Em um primeiro momento, por exemplo, o governo teria negado que teria havido uma proposta de acordo formal, o que foi posteriormente contrariado pelo ex-PGR Augusto Aras.

Em outra ocasião, que repercutiu muito no MPF, foi a sugestão, feita pela comissão que analisa a proposta, de o ponto focal da parceria do Brasil com o Eurojust ser a Advocacia-Geral da União, braço jurídico do Executivo, mesmo se tratando de uma organização de Ministérios Públicos.

A sensação interna na Procuradoria é a de que “se empurra o acordo com a barriga”. A expectativa, com o encontro do PG-20 e a presença do vice-presidente da Eurojust é que pelo menos seja estabelecido um processo de convencimento em torno da importância de o Brasil participar do grupo.

Publicidade