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Revista Saúde

Moradores de Americana que chegaram nos 100 anos contam suas histórias

A Revista L conversou com centenários que ainda possuem uma vida ativa, para desmistificar a ideia de que uma pessoa com três dígitos na idade está debilitada ou com problemas de saúde

Por *Natália Velosa

18 de novembro de 2020, às 08h12 • Última atualização em 18 de novembro de 2020, às 12h06

Viver por cem anos pode ser uma tarefa difícil para alguns, mas pode ser natural para outros. A pesquisadora e coordenadora do programa de pós-graduação em gerontologia da FCM (Faculdade de Ciências Médicas) da Unicamp (Universidade de Campinas), Anita Liberalesso Neri, explica que todos os seres são programados geneticamente para viver até certo tempo, mas estender esse período é uma consequência de um progresso da sociedade.

“Não faz muito tempo que acreditavam que pessoas de 45 anos eram idosas. No Brasil, hoje uma pessoa de 60 anos não é considerada velha, ela continua ativa. O código genético não mudou, o que mudou foram as mudanças públicas, como vacinação, tratamento de água e esgoto, tratamento de saúde básica, entre outros”, explica Anita.

A pesquisadora informa que com o passar dos anos, o corpo humano perde a força muscular, velocidade, facilidade em aprender coisas novas e a capacidade de lembrar de eventos recentes. Em contrapartida, Anita conta que dificilmente pessoas centenárias possuem problemas psiquiátricos, pois viver bem está relacionado a ter uma boa saúde mental.

“Quando você encontra centenários que são saudáveis, parece que é um milagre, mas na verdade eles são os vencedores de uma corrida. Provavelmente tiveram uma genética ótima, um ambiente que não os tornou debilitados, boas condições de vida ao longo dos anos, foram cuidadosos. É a ideia de Seleção Natural de Darwin”, avalia a pesquisadora e coordenadora do programa de gerontologia da Unicamp.

A Revista L conversou com quatro centenários de Americana que ainda possuem uma vida ativa, para desmistificar a ideia de que uma pessoa com três dígitos na idade está debilitada ou com problemas de saúde. 

Tintin, 104 anos

O seu charme está no cabelo azul. Para ela, tudo o que os outros acham estranho é bonito – Foto: Marcelo Rocha – O Liberal

Maria Eutropia Ferraz Ferreira, ou como todos a conhecem, dona Tintin. A senhora de 104 anos está com a saúde em perfeito estado. Com todos os exames regulados, só reclama da dificuldade para ouvir. Também utiliza a ajuda de um andador, porque quebrou o quadril no ano passado e precisa de uma forcinha extra para se manter ativa.

Quando questionada sobre a alimentação, a resposta foi direta e entre risadas: “Como o que colocam na minha frente”. Com elogios à comida preparada pela filha única, com quem mora atualmente, Tintin não tem dieta regrada e adora comer de tudo.

Na rotina diária, o sono é prioridade. Tintin acorda por volta das 12h, lê o jornal, almoça pelas 16h, às 18h assiste televisão nos canais religiosos e novelas. Volta a dormir por volta das 23h. Apesar do sossego de agora, a aposentada sempre teve uma vida muito ativa e não gostava de ficar parada. Trabalhava à pé revendendo produtos de beleza, então sempre caminhou nas vendas de porta em porta.

Mesmo negando que é vaidosa, Tintin cuida dos cabelos azuis e unhas coloridas no salão de beleza, inclusive durante o período de pandemia do novo coronavírus (Covid-19), só que agora os profissionais é que vão até a casa dela. Tintin garante que o charme está no cabelo colorido, afirmando que “tudo o que os outros acham estranho, é bonito”.

Tintin acredita que o segredo da vida longa vem da genética. Ela veio de uma família com 20 irmãos. Seus pais faleceram com 100 anos de idade. Uma das irmãs mais velhas faleceu com 101 anos e o irmão que morreu mais novo foi aos 80 anos. “Vou viver enquanto Deus quiser. Não reclamo, estou aqui porque o Senhor me colocou”, completou.

Amélia Paulini, 100 anos

A senhora de 100 anos cozinha, borda sem precisar usar óculos e se mantém informada – Foto: Marcelo Rocha – O Liberal

Amélia Paulini de Carvalho completou 100 anos em março deste ano. Descendente de italianos, nasceu no interior de São Paulo, em Taquaritinga, mas vive em Americana há 50 anos.

Durante os 100 anos, gerou 16 filhos e tem uma família composta por mais 13 netos e 17 bisnetos. Se casou uma vez e ficou viúva cedo, há 44 anos. Se orgulha em falar que batalhou para manter o bem-estar dos filhos e que foi fiel ao seu marido, pois não se casou mais.

Amélia assegura que a saúde está em perfeito estado, com os exames todos regulados. O único problema é a audição, que se perdeu um pouco. Em contrapartida, a visão está excelente e não usa óculos até hoje, garantindo belos bordados que produz como hobbie.

“Comer, beber, dormir e ser amada”, assim é o dia a dia que Amélia relatou. Apesar de atualmente morar com um dos filhos, Amélia é bem independente. Costuma cozinhar diariamente e não gosta quando a ajudam. Também não abre mão de ler o jornal todos os dias de manhã para se manter informada. Na alimentação, a senhora de 100 anos tenta ser saudável. Não toma refrigerante, nem come muitas “besteiras”, mas não abre mão de um gole de vinho.

O segredo para a longevidade pode ser mais fácil do que se imagina. Para Amélia, para viver tantos anos, é preciso “não falar coisa ruim, ser divertido, falar com todo mundo, falar com Deus, tomar um vinhozinho e ser feliz”.

Em meio à tantas experiências vividas, Amélia não perde o bom humor. “A idade não importa, o que importa é a cabeça. E a minha, graças a Deus está bem, e a língua também”, brincou.

Luiz Bertier, 100 anos

Em meus pensamentos, lembro muito da nossa chácara, onde se plantava todo tipo de fruta. Ao fundo havia um córrego, onde eu tomava banho – Foto: Marcelo Rocha – O Liberal

Luiz Bertier é mais uma das figuras centenárias de Americana. Descendente de italiano, mora na região do Jardim São Domingos desde a infância. Se casou uma vez, em 1947, e teve uma filha, com quem mora atualmente.

Aos 100 anos é lúcido e com a saúde em bom estado. Com a idade, perdeu um pouco da audição e sente o corpo mais debilitado, por isso precisa da ajuda de uma bengala para andar. Evita sair de casa por conta disso, mas não abre mão de ir à feira toda semana. Palmeirense, também não deixa de ouvir um jogo de futebol.

Quando jovem, teve os estudos interrompidos para ajudar a família trabalhando na chácara. Ele lembra em detalhes desta época. “Em meus pensamentos, lembro muito da nossa chácara, onde se plantava todo tipo de fruta: laranja, figos, marmelo, limão, carambola, pêssego, maçã doce, uvas, romã. Tinha também castanha, pés de café, arroz e feijão, além de criação de vacas leiteiras, galinhas e porcos. Lembro de uma mula em que sempre montava. Ao fundo havia um córrego, onde eu tomava banho”, contou.

Também trabalhou como contramestre em indústrias têxteis. Era frequentador da Praça Comendador Muller, onde se reunia todo domingo com amigos da cidade. Vaidoso, ainda possui disposição de se cuidar e não abre mão de estar com boa aparência. Costuma ir ao barbeiro para cortar o cabelo e aparar o bigode, mas a barba ele mesmo faz. O segredo para a longevidade, segundo Luiz, é “ter sossego, não fazer extravagâncias e andar bastante”. Hoje, se orgulha por ter sido um homem bondoso e nunca ter prejudicado ninguém.

Eutrópio ao lado da neta Cláudia Gonzaga – Foto: Arquivo Pessoal

Gonzaga, 102 anos

Eutrópio Gonzaga de Almeida, mais conhecido por Gonzaga, tem 102 anos e vive uma vida bem ativa. Com uma memória a invejar, lembra com riqueza de detalhes o passado que viveu. Sempre ligado a fatos históricos, também se lembra dos detalhes do passado político da cidade.

Apesar do físico estar um pouco debilitado por conta da idade avançada, não deixa de ser independente. Mora sozinho com a cachorra Duqueza, que carinhosamente atende por Duca. As atividades diárias de casa, faz sozinho. Por vezes, realiza até reparos, como conserto hidráulico e pintura, entre outros.

Filho de fazendeiro, Gonzaga sempre foi envolvido com o setor agrícola e de criação animal. Dedicou parte da sua vida também à construção civil. Casou-se duas vezes, gerou 14 filhos e tem uma família composta por 27 netos e 10 bisnetos. Da juventude, o americanense conta que gostava de dançar. Nos finais da tarde de sábado, vestia um terno, selava o cavalo, ia para o baile e tirava a dama para dançar. Lá, bailavam pela noite toda e, assim, voltava para casa satisfeito.

Sempre vaidoso, nas últimas décadas aproveitava os aniversários para fazer uma foto para marcar a data em um estúdio de fotografia. Alagoano, veio para Americana há 46 anos, mas não perdeu o sotaque nordestino, do qual tanto se orgulha.

O segredo da vida longa para Gonzaga é ser uma pessoa de bem e ser responsável por encaminhar as pessoas para o bem. “Agora eu espero é paz. Sem essa de tempo ruim”.

*Estagiária sob supervisão de Valéria Barreira

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