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Motors

Sem peças, montadoras priorizam carros caros

Levantamento mostra que 68% dos carros vendidos no País atualmente custam acima de R$ 70 mil

Por Agência Estado

20 de julho de 2021, às 08h00 • Última atualização em 20 de julho de 2021, às 09h37

Diante da escassez global de peças e componentes, a decisão das montadoras de direcionar os poucos materiais disponíveis para a produção de automóveis mais caros inverteu a pirâmide do mercado de veículos novos no Brasil. Os carros populares, que no passado estiveram na base dos melhores anos das vendas de automóveis, hoje têm uma parcela mínima da produção da indústria. O protagonismo é dos modelos mais caros, em especial dos utilitários esportivos (os SUVs, na sigla em inglês).

De acordo com levantamento feito para o Estadão/Broadcast pela consultoria Jato Dynamics, 68% dos carros vendidos no País atualmente custam acima de R$ 70 mil, enquanto os veículos abaixo desse valor representam os demais 32%. Até três anos atrás, a situação era inversa. Os veículos com preço acima de R$ 70 mil eram 40% do mercado.

A mudança de portfólio das montadoras já vem ocorrendo há quatro anos, em parte por causa da introdução de tecnologias exigidas por regulação, que são mais caras. As fabricantes também fizeram uma reorientação. Em vez de apostar no volume, preferiram buscar o reequilíbrio financeiro com produtos voltados ao público que pode pagar por maior conforto, espaço, conectividade, segurança e eficiência dos automóveis.

A pandemia introduziu um novo elemento à equação, ao obrigar a indústria a ser ainda mais seletiva em razão da falta de peças à disposição.

Conforme o estudo da Jato, feito com base nos volumes de vendas de janeiro a junho deste ano, os carros que custam menos de R$ 50 mil, os mais baratos do mercado e que se resumem a subcompactos, representam agora só 3% das vendas.

O segmento formado por carros de R$ 50 mil a R$ 70 mil também perdeu participação. Ele é ocupado por grande parte dos modelos de entrada das montadoras. Hoje, representa 29% das vendas, menos do que os 36% do ano passado.

É justamente nas duas faixas acima que estão posicionados modelos produzidos em fábricas que pararam por períodos mais prolongados desde o início da crise de abastecimento de peças, agravada nos últimos meses pela falta de componentes eletrônicos no mundo inteiro. A fábrica do Onix, da GM – em tempos normais, o modelo mais popular do Brasil -, está parada desde março.

Neste mês, foi interrompida, por alguns dias ao mesmo tempo, a produção tanto do Gol quanto do HB20 em fábricas da Volkswagen e da Hyundai, no interior paulista. A Fiat, marca líder em vendas no ano, vem alternando férias a grupos de mil trabalhadores em Betim (MG), onde são montados modelos como Uno e Argo, além do Mobi, o subcompacto que disputa com o Renault Kwid o posto de carro mais barato do Brasil.

“A falta de semicondutores está afetando o segmento de entrada porque o foco da indústria está na rentabilidade. Os preços estão, em média, muito altos”, diz o diretor de Desenvolvimento de Negócios da Jato, Milad Kalume Neto.

Valores

O preço médio dos carros vendidos no Brasil gira hoje na faixa de R$ 90 mil a R$ 95 mil. Em 2012, no auge das vendas, eles custavam em média R$ 63 mil, segundo a Bright Consulting, em valores já corrigidos pela inflação acumulada.

Modelos definidos pela Jato Dynamics como carros populares, caso de Onix, Gol, Mobi e Fox, representaram menos de 2% das vendas da indústria nos últimos três meses. Por outro lado, os SUVs, que tiveram 32% das vendas no segundo trimestre, formam, junto com as picapes (18%), metade do mercado.

Carros populares

A ruptura provocada pela escassez de chips atingiu a indústria automotiva de forma indiscriminada, gerando perdas de US$ 100 bilhões, segundo estimativas da consultoria KPMG. Ao menos 5 milhões de veículos deixarão de ser produzidos neste ano, calcula a Boston Consulting Group (BCG). No Brasil, estima-se que até 120 mil unidades tenham deixado de ser fabricadas no primeiro semestre.

Nesse quadro de alta seletividade na fabricação, o Brasil tem a desvantagem de seu parque produtivo depender de modelos que não estão, no momento, na lista de prioridades. Eles devem ser os últimos a voltar a uma produção sem restrições.

Os planos de produção das montadoras na América do Sul, onde o Brasil é o principal produtor, estão mais comprometidos do que os de fabricantes da Europa. Essa é uma das conclusões extraídas do estudo da BCG usado como base na estimativa feita recentemente pela Anfavea, a associação da indústria nacional de veículos, de que o Brasil já deixou de produzir neste ano entre 100 mil e 120 mil veículos por falta de peças.

Segundo estima a BCG com base em dados do segundo trimestre, a falta de eletrônicos impediu 14% da produção planejada por montadoras sul-americanas. Na Europa, as fábricas deixam de produzir 9% do volume esperado. Só na América do Norte, onde as paralisações também viraram rotina, o impacto é maior do que aqui: 20% do total previsto.

Na avaliação do consultor Paulo Cardamone, da Bright Consulting, além de os próprios fornecedores de semicondutores privilegiarem a indústria de tecnologia, em detrimento das montadoras, a cadeia automotiva direciona as matérias-primas para os produtos mais rentáveis. Nessa dinâmica, modelos populares vão para o fim da fila. “Não só no Brasil, mas em todo o mundo, esse tipo de produto será o último a voltar”, diz o consultor.

Segundo Besaliel Botelho, presidente da Bosch, grupo que fornece sistemas eletrônicos para as montadoras, a cadeia de suprimentos costuma evitar que apenas um ou poucos clientes fiquem com todo o volume disponível. No entanto, a escolha de quais carros serão produzidos é uma decisão individual das montadoras. “Estamos numa situação em que o cobertor ficou mais curto para todo mundo”, diz Botelho.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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