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Economia

Indústria abandona carros mais populares

Além do Uno e do Gol, são considerados carros de entrada o Renault Kwid e o Fiat Mobi

Por Agência Estado

13 de junho de 2021, às 16h01 • Última atualização em 14 de junho de 2021, às 08h01

Eles já contribuíram com mais da metade das vendas de automóveis no País e ajudaram o mercado a deslanchar. Agora, carros de entrada, antes chamados de populares, estão sendo deixados de lado pelas fabricantes.

A categoria de hatchs – que abriga os modelos de entrada como subsegmento – é tradicional líder de vendas também está prestes a perder a posição. O foco das montadoras agora são os utilitários-esportivos (SUVs), que passaram a ser prioridade nos investimentos das montadoras em busca de maior margem de lucro nas vendas.

Carro popular, na concepção em que foi criado, não existe mais há algum tempo e há quem aposte, até entre montadoras, que a categoria de entrada vai desaparecer pois não há lançamentos previstos nessa faixa.

Carro popular, na concepção em que foi criado, não existe mais há algum tempo – Foto: “FIAT Uno” by alcides OTA is licensed under CC BY-NC 2.0

No início do ano havia sete carros de entrada em produção. Agora são quatro, e o viés é de baixa. Já saíram de linha Ford Ka, Volkswagen up! e Toyota Etios. Há informações, não confirmadas, de que no fim do ano o Fiat Uno deixará o mercado e, em 2023, o Volkswagen Gol.

Hoje, além de Uno e Gol são considerados de entrada o Renault Kwid e o Fiat Mobi. O Onix Joy, versão antiga mantida pela General Motors após a chegada do novo Onix, não consta da relação de versões de entrada da Fenabrave, associação dos concessionários, embora o mercado o coloque nessa categoria.

Segundo a Fenabrave, de janeiro a maio foram vendidos 102,9 mil carros de entrada, uma participação de 15,3% do total de automóveis comercializados no período. Os preços ao consumidor variam de R$ 44,4 mil a R$ 60,2 mil e boa parte deles é adquirida por frotistas.

“Todo mundo está querendo pular fora desse segmento e procurando vender carros que dão mais rentabilidade”, diz Paulo Cardamone, da Bright Consulting. Para ele, contudo, o segmento deve ser mantido, mas em nova configuração, com carros mais equipados e de maior conteúdo tecnológico. Isso, porém, acarreta em custos, o que descaracteriza ainda mais o conceito de popular.

Cardamone avalia que o consumidor cada vez mais quer veículos com conectividade, segurança e conforto. Além disso, a própria legislação obriga a introdução de equipamentos de segurança que também encarece o produto. “Mas sempre haverá consumidores de faixa de renda menor querendo carros mais em conta”, pondera.

A categoria de hatch saiu de uma fatia de 48% das vendas de automóveis e comerciais leves em 2011 para 32% neste ano. É nesse segmento que está a maioria dos modelos 1.0, muitos deles super equipados como o Novo Onix adquirido por Ricardo Silveira, que custou R$ 89 mil.

Há dez anos, a participação dos SUVs nas vendas de automóveis e comerciais leves era de 7%. Nos cinco meses de 2021 está em 31% e tende a passar os hatches no curtíssimo prazo. A maioria dos utilitários custa a partir de R$ 90 mil.

Há 40 modelos de SUVs à venda, e os hatches são metade disso. Dos 24 lançamentos previstos para o ano, 15 são utilitários. Há informações de apenas dois hatches, o Polo Track e o Honda City nessa configuração.

Usado. Ao ver o preço do carro de entrada longe de sua capacidade de compra, o consumidor da classe C está migrando para o usado. Até maio, a venda de usados e seminovos (com até três anos) superou em 56% a de igual período de 2020. Já as vendas dos zero cresceram 25%.

“Sem dúvida está ocorrendo uma migração, seja em razão da falta de produtos nas revendas, dos preços altos ou por querer um veículo na mesma faixa de preço, mas mais completo”, diz Ilídio dos Santos, presidente da Fenauto, a associação de vendedores de veículos usados.

Ricardo Bacellar, da KPMG, não acredita que as montadoras vão desprezar o potencial de mercado de carros mais baratos e pouco conteúdo tecnológico. “É preciso considerar o perfil do mercado brasileiro e não faz sentido atender só a classe média.”

Para ele, a solução está na modalidade de assinatura, em que o consumidor aluga o carro por um a três anos e paga mensalidade que inclui custos como seguro, manutenção e documentos. O assinante assume gasto com combustível e pode trocar o carro quando quiser. “O modelo tradicional de venda estrangula a capacidade de uma grande massa de ter acesso ao carro novo”, diz.

Modelos ‘mil’ mantêm um público fiel

Embora ainda associado por muita gente aos modelos mais básicos, o carro “mil” hoje não é mais sinônimo só de veículo “popular”. Profissional da área financeira, Ricardo Silveira acabou de comprar um Onix 1.0 depois que seu outro veículo, com motor 1.4, foi furtado. “Tive uns três ou quatro carros mil na sequência. Sempre gostei. Comprei esse, mas decidi voltar para a categoria.”

O fator que definiu a escolha de Silveira foi a economia de combustível. Ele mora em Taboão da Serra e trabalha no bairro do Jabaquara, em São Paulo. “Viajo 20 quilômetros para ir e mais 20 para voltar todo dia. Com o preço do combustível, isso foi decisivo.”

E, como roda muito, Silveira gosta de trocar de carro a cada três anos para não ter problemas com manutenção. O modelo de entrada, motor 1.0, sempre teve mais “trânsito no mercado por ser bem aceito, na opinião dele. E isso facilita a troca. “Mas a quilometragem não pode aumentar demais, se não fica difícil dar o carro como entrada na troca por outronovo.”

Nessa volta às mil cilindradas, porém, Silveira deu um passo além. Embora seja 1.0, o Onix escolhido por ele tem pouco de popular. Custou R$ 89 mil e tem um aditivo – é turbo. “Mesmo sendo mil, ele rende igual ao 1.4, mas com a economia da versão popular, diz ele. Fora isso, o modelo tem acabamento de luxo, câmbio automático, central multimídia, chaves com sensor de presença e vários outros penduricalhos. “Estou bem feliz. Vou ter a economia que preciso, terei a potência do turbo e o conforto de um veículo de luxo.”

Enquanto há quem renove o carro 1.0, outros decidem manter sempre o mesmo. É o caso do empresário paulistano Alexandre Brazales, que comprou há 21 anos um Gol 1.0 de 1994. O veículo “durou até a semana passada”. “Nunca me deixou na mão. Esse carro era melhor que um Jeep: enfrentava lama, subida, tudo”, conta.

Ele acabou de vender o “xodó” depois de um acidente. “Um louco de BMW não me viu e me acertou num cruzamento”, conta. Mas Brazales fez questão que o veículo tivesse uma nova vida. “Esperei para vender para alguém que se propusesse a restaurar o Gol. Os documentos estão todos em dia, manual e tudo”, diz ele, que passou o automóvel para frente por R$ 1,3 mil para um funileiro interessado em fazer o veículo “ressuscitar”.

Máquina do tempo

Entre 80 carros antigos e estilosos, como Pumas e Kombis, o representante comercial Wlamar Paiosin, de Campinas (SP), guarda um Corsa Wind 1.0 de 1995 – um dos símbolos dos carros populares no Brasil. Mas o carro é suficientemente icônico para figurar em uma coleção? Para Paiosin, sim. “Gosto de carros que marcaram época. E o Wind foi um deles. Entrar nele é como voltar para 1995. É uma máquina do tempo.”

O Corsa tem 12 mil km rodados. “Comprei de um senhor que queria, em 1995, dar um carro zero para a filha. Mas ela, em seguida, se mudou para os Estados Unidos e o carro ficou parado esses anos todos com ele, até eu comprar, há quatro anos”, afirma o colecionador.

Fusca foi mote para produção de veículos 1.0

Os carros populares tiveram origem em 1993, após o recém-empossado presidente Itamar Franco reclamar que os preços dos modelos mais em conta no Brasil eram caros demais. Ele dizia que era preciso ter um carro com apelo igual ao do Fusca, que tinha se mantido no mercado ao longo de 27 anos e foi tirado de linha em 1986.

Itamar assumiu o cargo após o impeachment de Fernando Collor. Em uma única reunião que manteve com executivos da Volkswagen ficou acertado que, sete anos após o fim de sua produção no País, o icônico modelo seria ressuscitado.

A contrapartida para a montadora foi a quase isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com taxa de 0,1% e outros “agradinhos” tributários. Após o acordo, as demais fabricantes também quiseram se beneficiar da medida e a regulamentação estabeleceu que o carro popular só poderia ter motor com até 1.000 centímetros cúbicos, ou 1.0. Também foi estabelecido um limite de preço em dólar.

A Fiat já tinha o Uno Mille e, sem muita demora, a General Motors lançou o Chevette Júnior, a Ford veio com o Escort Hobby e a Volkswagen também expandiu sua linha com o Gol 1.000. O Fusca foi produzido por mais quatro anos, teve vendas de 47,7 mil unidades e saiu deixando o “legado” do imposto menor para novos modelos que surgiram no mercado.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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