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Revista L Educação

Literatura como ferramenta para mudança de hábitos em crianças e adolescentes

Para psicopedagoga, a leitura é fundamental para o processo cognitivo e sociocultural infantil, e atua no aprimoramento da linguagem e entendimento

Por Natália Velosa

24 de novembro de 2021, às 08h14

Uma menina travessa que aos cinco anos de idade tinha o hábito de rasgar e rabiscar os livros. Não contente, atrapalhava a irmã mais velha na hora dos estudos e também estragava seus livros. Era desorganizada e não conseguia manter os cuidados com os manuscritos de papel. Quem via a estudante Júlia Del Conte assim, não imaginava que ela iria se tornar hoje, aos 13 anos, tão cuidadosa com os livros.

A mãe, a dona de casa Fabiana Del Conte, conta que não sabe ao certo porque Júlia era arteira com os livros, mas que ela achava divertido. Os hábitos da menina, porém, mudaram ainda aos cinco anos, quando Júlia visitou a Casa do Conto, em Americana. Era o dia da leitura do livro “Bicho do Livro”, escrito pela psicopedagoga Cristina Lazaretti, conhecida pela
personagem “Tininha”.

A história se resumia ao bicho que gostava de comer livros. Com o efeito contrário inesperado, o bicho se tornava analfabeto, porque ele só destruía as obras literárias. Um dia, o dono da casa em que ele vivia morreu e o bicho precisou sair para procurar alimentos. O personagem acaba se descobrindo um grande vilão, destruindo patrimônios culturais.

Depois do arrependimento, decide devolver todas as histórias, escrevendo-as novamente. No fim, o bicho se compromete a ser um guardião dos livros e convoca todas as crianças para fazerem o mesmo.

abiana e a filha Júlia; a estudante parou de destruir livros aos cinco anos depois de ouvir história do “Bicho do Livro”, obra de Cristina Lazaretti – Foto: Ernesto Rodrigues / O Liberal

Com os olhos vidrados, Júlia sentou na primeira fileira e focou na contação de história pela primeira vez. Fabiana diz que estranhou, já que ela sempre foi muito imperativa. Foi a partir desse dia que a menina assumiu o legado do bicho do livro para si. A obra, posteriormente, foi dedicada a ela. “Ler tem uma importância muito grande, você conhece novas coisas, novos mundos”, diz Júlia hoje.

Autora do livro, Cristina Lazaretti, explica que contar uma história para uma criança é um convite para a experimentação de algo diferente do que ela está vivendo naquele momento. O efeito que causou na Júlia ocorreu pelas vivências da narrativa, quando a menina encontrou um aprendizado para a vida.

“A história tem um poder incrível de mexer com a nossa identidade, nossas crenças e verdades, nossas angústias e incertezas, e o mais mágico é que nela a criança vive o papel do outro sem precisar se expor”, explica Cristina.

Boas narrativas

O estímulo para adentrar no universo da literatura deve começar cedo. “Quanto mais se lê, melhor se fala”, afirma a psicopedagoga. Para ela, a leitura é fundamental para o processo cognitivo e sociocultural de uma criança, e atua no aprimoramento da linguagem e entendimento. Para que aconteça o estímulo não é necessário investir em um livro eletrônico, como também não é suficiente deixar uma criança em uma biblioteca.

“É preciso ter uma boa, agradável e estimulante proposta literária, que ofereça para as crianças prazer, descobertas e a vontade de saber o que vem depois. E isso pode ser através de aparelhos eletrônicos, manuais ou de qualquer objeto que lhe seja atribuído significado”.

O segredo para uma grande obra literária ganhar a concentração do público infantil é não subestimar a criança e apostar na inteligência dela. Quem confirma a afirmação é a doutora em linguística e membro do conselho editorial da Editora Adonis, Patricia Aquino.

Ela explica que hoje os livros infantis evoluíram. Um exemplo é que não necessariamente um livro precisa ter uma lição de moral, que muitas vezes pode subestimar a inteligência da criança. A literatura, como a arte em geral, tem o poder de transportar leitores para outras realidades.

“Lições de moral tendem a interromper esse processo e trazer o leitor de volta, de forma abrupta, para a realidade dele. Um final aberto, com possibilidades a serem imaginadas, por exemplo, pode manter a criança nesse outro mundo por mais tempo”, explica.

Outro elemento que teve mudanças foram as ilustrações. Antigamente, as imagens tinham a tendência em reproduzir o texto escrito. Nos livros atuais, a ilustração tende a acrescentar elementos que dialoguem com o texto escrito, mas que não o reproduzam.

“O que nos move é a consciência de que um livro infantil pode produzir diferentes sensações, diferentes níveis de identificação com personagens, que cada leitura pode levar à observação de determinados detalhes da história”, finaliza Patricia.

Influência do berço

A história da estudante Alyssa Tomiyama, de 14 anos, com os livros começou cedo. A menina ouvia histórias ainda na barriga da mãe Márcia Tomiyama, quem sempre foi sua grande referência de incentivo à leitura. A casa sempre foi recheada de livros e nos passeios que faziam, a menina sempre ganhava livros.

Allysa compartilha o amor pelos livros através do canal que criou aos 9 anos – Foto: Marcia Tomiyama / Arquivo pessoal

Aos nove anos, Alyssa teve o incentivo da mãe para criar o primeiro projeto “Alyssa e a magia da leitura”, como forma de poder repassar o que ela sentia em relação à leitura para as pessoas, através de vídeos no YouTube. As redes sociais da estudante, que hoje carregam 13 mil seguidores, são repletas de posts ligados aos mundos da literatura e cultura.

“O objetivo é sempre mostrar o quanto a leitura é importante na vida das pessoas, o quanto um livro pode abrir um mundo de possibilidades. Com um livro você pode ter diversão, esclarecimento, reflexão, mas também magia e encanto”, comenta.

Além do gosto por ler, a estudante carrega um currículo como escritora. Ela é autora do “Letra Viva” e co-autora do livro “Sinto o que conto, contos que sinto”, que possui nove histórias infantis de autoria de nove mulheres.

Sendo a literatura um alicerce na sua vida, Alyssa não se vê sem os livros. “É como perder as asas, ela fica impossibilitada de viajar em outros universos. Os livros me ajudam a viver e a sobreviver”, conclui a jovem autora.

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