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Revista L Educação

Educação financeira ganha espaço nas escolas

Conquistando cada vez mais adeptos e importância, ela foi incluída como tema transversal na Base Nacional Comum Curricular

Por Isabella Holouka

18 de novembro de 2021, às 07h46

Para incentivar, a dica é estabelecer com a criança uma data para abertura do cofrinho e contage - Foto: Adobe Stock

Endividamento familiar, consumo desenfreado e uso irresponsável dos recursos naturais se somam à desigualdade social, de direitos e de oportunidades. Os problemas são apontados por especialistas como razões para que a educação financeira ganhe cada vez mais espaço e importância, sendo incluída como tema transversal na BNCC (Base Nacional Comum Curricular), aprovada em 2017 e que deve ser implementada nas escolas públicas e privadas do País a partir de 2022. Entretanto, os professores não devem se limitar a apresentar o tema e sim buscar, junto aos estudantes, uma abordagem dialógica que contribua para o desenvolvimento de consciência crítica. É o que aponta Marcus Vinicius Maltempi, pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) na área de educação matemática.

Para tornar o assunto mais acessível e atraente, ele afirma que as escolas precisam “valorizar o cotidiano dos estudantes, de modo a aproveitar suas experiências referentes ao uso do dinheiro, consumo, recursos naturais, desejos e desigualdades sociais”. Já as famílias podem aproveitar notícias e vivências compartilhadas para conversarem sobre o tema, abordando os desafios cotidianos que envolvem recursos financeiros.

A Revista L Educação buscou escolas em Americana e Santa Bárbara d’Oeste onde a educação financeira assume um posto importante entre as matérias.

Nelas, além dos conceitos relacionados ao gerenciamento financeiro, destacam-se as iniciativas que incentivam o empreendedorismo. Coordenadora pedagógica do Sesi 101, em Americana, do primeiro ano do ensino fundamental até o ensino médio, Juliane Cristina Pereira Moreira afirma que a educação financeira é abordada junto aos alunos da rede em toda a vida escolar, com especificações a cada etapa.

No ensino fundamental I, o assunto é integrado nas disciplinas escolares, com diferentes abordagens, sendo que nos 4º e 5º anos os estudantes têm a oportunidade de desenvolver projetos – como bazares ou simulações de compras acompanhadas de professores – dentro de uma proposta social e cultural. A partir do 6º ano, até o fim do ensino médio, a educação financeira é através de uma disciplina específica que concentra temas diversos, chamada “eixo integrador”. “Os alunos desenvolvem projetos relacionados à educação financeira e ao empreendedorismo, junto aos professores de diferentes áreas, com aplicabilidade na vida e na rotina deles”, explica Moreira, que conta ter um feedback positivo dos estudantes do ensino fundamental e especialmente do ensino médio.

Já no Colégio Pilares, em Santa Bárbara, os estudantes têm, a partir do 6º ano, uma disciplina semanal intitulada “educação financeira e empreendedorismo”, em que a abordagem é interdisciplinar, resultando em uma feira de empreendedorismo realizada anualmente há mais de 10 anos.

“Cada turma se comporta como se fosse uma empresa. A classe é dividida nos setores, como gerenciamento, marketing e financeiro, eles levantam custos, calculam lucro, fazem gráficos, decidem o nome da empresa, o logo, a arte. Então, no dia da feira, é como se eles abrissem o negócio deles”, contou a diretora Heliana Batáglia Beltrame.

Em casa. Escolas e famílias precisam trabalhar juntas para que crianças e adolescentes consigam aplicar e desenvolver seus conhecimentos sobre finanças. Contudo, em casa, não vai adiantar dar dinheiro se o tema não for bem conversado, aponta a especialista Marta Maria Pasquali, professora e coordenadora do curso de pedagogia, no campus Maria Auxiliadora do Unisal (Centro Universitário Salesiano de São Paulo), em Americana.

“Muitos oferecem a mesada, mas sem um objetivo, sem um planejamento do que a criança pode comprar, em quanto tempo. E assim ela guarda e gasta aleatoriamente, mas precisamos atrelar o dinheiro à necessidade. Isso é fundamental para que ela entenda o que são coisas necessárias e o que é supérfluo”, explica.

Sete anos é a idade recomendada pela pedagoga para que os pais comecem a tratar sobre o tema. “Explicando para a criança que o dinheiro tem um valor, como se fosse um escambo, uma troca. Quando a criança diz o que ela gostaria de comprar, os pais intervêem para mostrar o que não se compra, o que tem um valor muito alto, e o que ela consegue adquirir com o valor que vai receber”, complementa Pasquali, que enumerou recomendações aos pais:

A regularidade ideal. Seja a mesada, quinzenada ou semanada, precisa ser combinada previamente. A dica é ajustar de acordo com a idade da criança: para as mais novas, deve-se privilegiar uma regularidade maior. “A orientação temporal da criança é muito frágil. Se eu estabelecer que será mesada, pode ser que demore muito para ela receber, então que seja uma semanada de R$ 10, totalizando R$ 40 por mês”, exemplifica.

Defina um montante. Costuma variar de acordo com a condição financeira da família, mas valores altos devem ser evitados. “Nunca dê mais do que R$ 50, a não ser que seja um valor mensal. A criança não vai entender o que aquilo significa, o que ela pode comprar com aquilo, e a atividade fica contraproducente”, explica Pasquali.

Comece um cofrinho. É muito comum que as crianças ganhem moedas aleatoriamente dos familiares, e elas podem ser guardadas em um cofrinho. Assim, os pequenos começam a poupar enquanto compreendem o valor de papéis e moedas. Para incentivar, a dica é estabelecer com a criança uma data para abertura do cofrinho e contagem do dinheiro.

Dê sentido ao ensinamento. Mais do que oferecer dinheiro para a criança, a ideia é que os pais trabalhem o tema em conjunto. “Precisamos conversar com a criança sobre dinheiro, e proporcionar momentos. Quando for ao supermercado ou à feira, por exemplo, explique: ‘temos tantos reais para gastar no total, e o pacote de bolacha custa tanto, então será que podemos pagar?’”, aponta Pasquali.

Ensine o registro de gastos. Cada movimentação financeira precisa ser registrada, justamente para que a criança consiga compreender os acontecimentos, melhorar a noção temporal e iniciar o gerenciamento financeiro, entendendo suas necessidades e gastos supérfluos. “Registrar o quanto a criança tem, o quanto gastou e qual a previsibilidade daquele gasto. Pode ser que ela queira algo e só consiga comprar em dois meses, e tudo bem. Trabalhando a orientação temporal, ela vai computando com o calendário, vendo o quanto se aproxima a data de abrir o cofrinho ou fazer aquela aquisição previamente combinada”, diz.

A evolução da criança. Tropeços podem acontecer, e os pais precisam ter paciência para acompanhar a evolução gradual de cada criança. Iniciando aos 7 anos – com mesada, cofrinho e planner – as famílias também podem contar com materiais didáticos e jogos educativos relacionados ao tema.

Estimule doações. As doações auxiliam as crianças a compreenderem o valor do dinheiro, além de que incentivam a caridade. A recomendação é que as famílias introduzam a prática da doação inicialmente com roupas e brinquedos, passando posteriormente aos valores em dinheiro, que devem ser destinados às organizações sociais competentes.

Ensine sobre investimentos. Conforme a criança evolui em sua educação financeira, aos 9 ou 10 anos, os investimentos já podem ser abordados. “Explique que, se nós guardarmos o nosso dinheiro em um determinado lugar, ele rende, então ao invés de ter R$ 50, no final você terá R$ 55, por exemplo. Assim começamos com a caderneta de poupança, que tantas crianças têm”, sugere Pasquali.

Sem barganha, nem castigo. Segundo a especialista, a mesada não pode ser usada como uma maneira de ameaçar, propor trocas ou chantagear as crianças, sob o risco de atrapalhar a aprendizagem. “Não comercializamos tarefas que são de obrigatoriedade da criança, como arrumar a cama de manhã ou ir bem na escola, porque são obrigações. Sem barganha, nem castigo”, orienta.

Dê um bom exemplo. Muitos conhecimentos podem ser trabalhados dentro da proposta da educação financeira, mas de nada vai adiantar impô-los às crianças se a família não der um bom exemplo nesta área. “Aquela compra que é supérflua para a criança, precisa ser supérflua também para a família. Então, precisamos abraçar a causa conjuntamente, porque é através do exemplo que eles aprendem cada vez mais”, finaliza. 

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