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Esporte

Clubes brasileiros apostam no digital para minimizar impactos pela falta de jogos

Agência especializada em marketing esportivo estima que os clubes vão perder até R$ 2,5 bilhões em receitas em 2020 por causa da pandemia

Por Agência Estado

09 de julho de 2020, às 09h44 • Última atualização em 09 de julho de 2020, às 12h50

Uma crise provocada por uma pandemia sem precedentes nos últimos 100 anos assola o mundo. No futebol brasileiro, são quase quatro meses sem partidas na maioria dos Estados. Ainda com a incerteza do retorno das atividades, os clubes operam com a ausência das principais fontes de renda: transmissão televisiva, bilheteria e ainda enfrentam a dificuldade em manter o sócio-torcedor em regularidade.

A SportsValue, agência especializada em marketing esportivo, estima que os clubes vão perder até R$ 2,5 bilhões em receitas em 2020 por causa da pandemia. O especialista Amir Somoggi chama de “novo normal”. “É uma receita muito mais baixa”, disse.

O estudo aponta que, dependendo de como os clubes reagirem à crise e como se comportará o mercado de transferências, as receitas podem ser similares à temporada 2010/2011. Um retrocesso sem precedentes no futebol brasileiro. A queda é estimada num valor entre 29% a 37% em comparação com 2019, ano recorde em receita para os clubes. O Flamengo, por exemplo, já registrou uma perda de 20 mil sócios durante o período de quarentena.

Os clubes brasileiros tentam botar a criatividade em ação – alguns deles antecipam planos que estavam guardados para conseguir minimizar os impactos da ausência de jogos.

“Como o futebol é um produto ligado à aglomeração, tem queda de receita imediata a partir de uma paralisação como essa. O futebol mostra que vai demorar para recuperar”, pontuou Guilherme Bellintani, presidente do Bahia. Para minimizar o dano financeiro, estimado por ele que esteja em um valor entre R$ 20 a 60 milhões, o clube antecipou uma ideia que estava prevista para ser lançado no final deste ano: a Plataforma Sócio Digital.

Em um modelo de streaming similar ao Netflix, o Bahia lançou um serviço contratado por assinatura, no valor de R$ 10 por mês em que o torcedor tem acesso a mais de 100 horas de conteúdo em vídeo mensal do clube. A plataforma tem entrevistas com jogadores, transmissão de embarque e desembarque do plantel e outros conteúdos. Segundo Bellintani, a ideia é que mais da metade desse conteúdo em vídeo seja ao vivo.

O clube há algum tempo propõe a inovação como algo de sua cultura organizacional. E, no momento, é algo que usa para enfrentar a crise. O Bahia também anunciou um novo pacote de vantagens para os sócios que permanecerem fiéis ao plano durante a quarentena, com sorteio de camisas, carros e outros benefícios. “Tenho segurança em dizer que o Bahia tem um futuro de inovação muito forte”, disse o presidente.

O Botafogo é outro clube que seguiu caminho similar com a sua própria plataforma digital, o E-Botafogo, lançada na segunda semana do mês de junho. Lá, o torcedor pode ter acesso a conteúdos exclusivos, como momentos históricos da história do time. O E-Botafogo cobra valores de 3 vezes de R$ 10, com descontos para sócios, que receberão link para compra no valor total de R$ 24,99.

O Botafogo define a ação como “a maior decisão de 2020”. “Algumas iniciativas furaram a fila de prioridades. A crise canalizou a atenção para todos os assuntos que a gente não pensava antes. O clube se reinventou em algumas áreas”, afirmou Júlio Gracco, coordenador de comunicação. A tecnologia e o ambiente digital se tornaram terreno fértil para planejar algumas ações.

“A visão do Botafogo é de que a atividade do departamento comercial vai ter que reformular o produto” adicionou Caio Araújo, gerente de gestão comercial do clube carioca. Além do E-Botafogo, a BotafogoTV, canal do clube no YouTube, vem criando produtos para manter a torcida com o clube. Uma das iniciativas que ganham força durante a pandemia.

“Estamos focando mais em produtos que possam dar mais entregas virtuais, mais interação virtual e nosso planejamento mira esse novo cenário. Vamos aproximar o torcedor. Se ele não pode vir ao estádio, o estádio vai até ele”, falou Caio Araújo.

NO SUL – Para os clubes do Rio Grande do Sul, Grêmio e Internacional, uma grande prioridade é preservar o quadro de sócios-torcedores. “A gente entende que o quadro social é o grande alicerce do Internacional. Somos o primeiro clube a ter 100 mil sócios e a gente tem 120 mil sócios. Esse quadro social é muito sólido”, pontuou Nelson Pires, vice-presidente de marketing.

Além de ações com benefícios, o Internacional pretende criar um monumento ao sócio que se manter adimplente. Segundo Pires, o clube ganhou mais de cinco mil sócios novos no período de pandemia.

A crise afetou parte do planejamento que o clube projetava para o ano. Uma das ideias era ter um hub exclusivo para inovação – algo que acabou por ter que ser uma ideia posta para o futuro. Para Nelson Pires, o digital é uma boa plataforma para trazer entretenimento ao torcedor. Além de atividades interativas, o clube realizou campanhas conscientização à torcida sobre como se prevenir do vírus e iniciou campanhas de ação social.

O Grêmio também entende que o fortalecimento da marca é fundamental no momento. “A marca é essência e a monetização é consequência. Se eu tenho a marca forte, tenho percepção de valor”, disse Beto Carvalho, diretor executivo de marketing. As ações concentram em incentivar a fidelidade sócio-torcedor.

Além do desconto em itens do clube, o sócio-torcedor ganhará uma placa em homenagem. “Tivemos uma queda na receita de sócio de 15% em relação à média dos três primeiros meses do ano. Quando lançamos essa ação o mês de maio teve o patamar foi o mesmo de abril. Ou seja, estancou a queda”, afirmou Carvalho.

QUAL O CAMINHO? – “A crise não traz oportunidade, mas ela antecipa tendência. Os clubes precisam se transformar digitalmente”, pontuou Amir Somoggi. A transformação digital é a principal iniciativa apontada por especialistas na área como um caminho para geração de fontes alternativas de receita.

De acordo com o estudo da SportsValue, iniciativas como essa aproximam a torcida com engajamento e possibilitam a rentabilização de conteúdo próprio, como planejam Bahia e Botafogo com suas plataformas digitais.

Para Bruno Maia, especialista em marketing e ex-vice-presidente de marketing do Vasco, plataformas de streaming podem ser um bom caminho para o futuro dos clubes brasileiros. “2015 foi o primeiro ano de queda de assinantes da TV a cabo. O streaming começou a subir e vem se colocando no mercado com uma tendência de se posicionar como um modelo rentável”, disse.

Mas o fator mais importante para a inserção digital dos times é algo que começa a ser notado por alguns deles: geração de dados. “Não se tem um trabalho muito sério de geração de dados do torcedor no futebol brasileiro. O streaming é uma forma de se conhecer o comportamento dele”, afirmou Maia.

Ter informações sobre o torcedor permite ter um conteúdo direcionado, personalizado e que seja do interesse do usuário. “O objetivo é fidelizar esse torcedor. Se, por exemplo, você tem a informação que ele vê 10 vídeos de um volante, por mais ruim que ele possa ser, você pode oferecer material a um potencial cliente: a camisa do volante, vídeos do volante”, ponderou Maia. “A ideia é oferecer produtos diversos de modo que ele seja algo além da estatística. Se você tiver um torcedor assim, vai ser muito importante que 20 milhões de torcedores que não consomem seus produtos, não participam da vida do clube”.

O Fortaleza é um dos que começam a adotar os dados como estratégia a ser usada em um futuro breve. O time vem de rápida ascensão no futebol brasileiro após o título na Série B em 2018 e a nona posição na Série A 2019 – melhor nordestino na competição -, acredita que a geração de informação sobre o torcedor é importante para manter o crescimento do clube.

“O que a gente quer fugir é do achismo. Queremos saber o que esse torcedor consome, o que ele compra, o que ele gosta do futebol. Com essas ações, vamos transformar inteligência em ação”, disse Marcio Persivo, gerente de marketing do Fortaleza. O Tricolor pretende lançar uma plataforma digital para o torcedor na segunda semana do mês de julho, de acordo com o presidente, Marcelo Paz. “É um App que vai ter gamificação, quiz, sorteio de camisas após os jogos, diversas situações que o torcedor possa participar. A gente quer que esse super aplicativo seja um canal efetivo de comunicação do torcedor com o clube torná-lo ativo”, afirmou.

Além do Fortaleza, outro time do Nordeste começa a implementar um sistema de big data: o Bahia. Ainda em fase de elaboração, o modelo começou a operar no começo do ano e já deve guiar estratégias do clube no segundo semestre. “São estratégias para aumentar a nossa conexão com o torcedor. Conhecer a torcida é fundamental para saber o que devemos fazer”, afirmou Guilherme Bellintani.

Das equipes do Campeonato Brasileiro de 2020 que falaram com o Estadão, Red Bull Bragantino, Ceará, Grêmio, Internacional e Sport são algumas que já possuem ações operantes em torno do uso de dados mais inteligentes para o planejamentos de estratégias e ações futuras.

O Estadão procurou os 20 clubes da Série A deste ano para perguntar sobre iniciativas de inovação e alternativas propostas por eles. 13 deles responderam e aqui estão as respostas dos clubes que atenderam ao nosso pedido:

BAHIA – O presidente Guilherme Bellintani mencionou como algumas das iniciativas a plataforma Sócio Digital, com conteúdo e ofertas digitais para minimizar perdas com a falta de partidas e portões fechados – algo que era pensado para dezembro e que teve o lançamento antecipado para a metade do ano, iniciativa tecnológica do clube que busca mais aproximação com a torcida, com a integração a um sistema inteligente de big data.

Outra ação de destaque é o “Junto Venceremos”, que garante a possibilidade de solicitar desconto na mensalidade; nome eternizado num monumento que será construído no novo CT do clube, o CT Evaristo de Macedo; nome na camisa do time num jogo do Brasileirão 2020; descontos na loja do clube, em itens consumíveis em jogos na Fonte Nova, camisa gratuita em 2021 e um sorteio de carro por mês, de julho a dezembro de 2020.

O clube também vendeu ingressos simbólicos em jogos de reprise transmitidos na TV como Bahia x Fluminense, válido pela semifinal do Campeonato Brasileiro de 1988, transmitido pelo SporTV.

BOTAFOGO – Caio Araújo, gerente de gestão comercial, destaca que as entregas virtuais são prioridade no momento do clube, que faz o planejamento semana a semana. Entre as ações, estão o E-Botafogo, plataforma de conteúdo do clube por assinatura e o BotafogoTV, canal no YouTube. As lives e distribuição de ingressos virtuais para transmissão de reprises foram outras soluções pensadas no momento.

RED BULL BRAGANTINO – O clube que subiu para a Série A neste ano comunicou por nota algumas das iniciativas do clube. “Nossa visão para um projeto de sócio torcedor, por exemplo, segue a linha onde o principal ativo não é apenas o ingresso para a partida e a preferência na compra, mas também ser focado em experiências e na jornada do consumidor, onde o intuito é gerar conversões e ter o incremento de receita em outras frentes tais como em produtos licenciados, diferentes propriedades e formatos de entregas aos parceiros comerciais e conteúdos, dentre outras verticais do clube”.

CEARÁ – Lavor Neto, gerente de marketing, destacou duas principais frentes de ação do clube: a de preservação dos sócios-torcedores adimplentes e comercialização de produtos próprios do clube. A equipe lançou a marca fabricante de material esportivo própria, a Vozão, e uma camisa especial, a Nação Alvinegra. Já na primeira semana de junho, ela gerou R$ 1 milhão em vendas. Outros produtos como máscaras e álcool em gel são comercializados.

O Ceará usa como principal plataforma digital o “DNA Vozão”, uma “arena digital” do clube, que busca trazer a participação do torcedor com proposta de gamificação, quizzes e outras atividades. “A gente quer entender a nossa torcida. Com os dados e informações sobre o que pensa, podemos fazer um estudo sobre o nosso torcedor, nosso cliente”, analisou Lavor Neto.

CORINTHIANS – O clube foca ações no campo de e-sports. O Corinthians é o primeiro time de futebol no mundo com camisa no Free Fire, jogo Battle Royale – mesmo estilo de Fortnite – com 450 milhões de usuários globais. De acordo com o comunicado do clube, ele “está em posição privilegiada nesse mercado e olhando pra ele com perspectiva de abertura de novas frentes de negócios e de receita. O Corinthians vai estender sua participação a outras franquias de jogos e ter grandes novidades nos próximos meses, como novas equipes licenciadas”.

CORITIBA – O presidente Samir Namur destacou liberou a produção de máscaras para microempresários sem a necessidade de pagamento de royalties para a utilização de sua marca.

O Coritiba fez uma retransmissão da partida em homenagem ao ídolo coxa-branca Dirceu Krüger, vendendo ingressos virtuais em prol da solidariedade para a doação de máscaras para comunidades carentes, além do lançamento da nova camisa do clube.

Sócios em dia ganharão uma placa que ficará no estádio e trabalha na negociação dos direitos de transmissão, já que o Coritiba não tem contrato de TV aberta firmado para 2020.

FLAMENGO – O clube comunicou que vem tentando fortalecer o lado social. Houve a liberação da marca para que pessoas pudessem comercializar, uma live no Maracanã com patrocinadores e artistas convidados. O Flamengo busca atuar de maneira segmentada com seus públicos-alvo, mas integrando 100% das frentes de negócio – das escolinhas ao sócio-torcedor. A aposta rubro-negra está na forte presença do clube nas redes sociais, em que o clube se posiciona a frente dos demais, de modo que preserve a relação com patrocinadores.

FORTALEZA – O presidente do clube, Marcelo Paz, e o gerente de marketing, Marcio Persivo, destacam ações com a torcida como algumas das soluções pensadas no momento de curto prazo. Além de uma série com três episódios sobre a campanha no Brasileirão do ano passado, o clube realizou torneios de videogame em Fifa e Pro Evolution Soccer (PES), simuladores virtuais de futebol e leilões de itens do clube.

O principal lançamento é o aplicativo do Fortaleza, em que o torcedor poderá consumir conteúdo do clube, comprar ingressos e gerar recompensas para torcedores que usarem mais o App.

GRÊMIO – O vice-presidente de marketing Beto Carvalho diz que a crise atual é um momento para entender as percepções do torcedor sobre o clube e de como gerar valor para o torcedor seguir com o clube no momento. A aposta é, sobretudo, no sócio-torcedor. Desconto em itens da loja do Grêmio, placas aos sócios que mantiverem fiéis ao pagamento são algumas das principais ações.

INTERNACIONAL – O vice-presidente de marketing, Nelson Pires, ressalta campanhas de conscientização de prevenção à covid-19 e conteúdo de entretenimento como alternativas de manter o torcedor engajado com o clube durante a pandemia. O quadro de sócio-torcedores é uma prioridade para o clube, que oferece benefícios aos torcedores que manterem adesão ao plano. De acordo com ele, mais 5 mil pessoas se associaram ao Colorado durante o período.

O Internacional já começa o trabalho de gerar conteúdo de inteligência na área de marketing guiada por dados, mas que ainda é tido como incipiente. Durante o período de quarentena, o clube cogita a inserção nos e-sports. Entre os sócios, há a Liga Colorada, com torneios em jogos ainda voltados para o futebol como Fifa e PES, mas que deve inserir Fortnite em breve.

SANTOS – Marcelo Frazão, executivo de marketing e comunicação, aponta que os esforços do clube se concentraram na busca de manutenção das receitas programa de sócios e de patrocínios. Em relação ao programa de sócios, o Santos lançou em abril uma campanha promocional para novas adesões, renovações e resgate de inadimplentes. Como resultado o clube manteve o número de sócios adimplentes que tinha ao final do mês de março.

Para manter os patrocinadores, a foi baseada em nossa plataforma digital. Houve lançamentos de diversos conteúdos patrocinados nas redes, ações de responsabilidade social e de divulgação direta de produtos e e-commerce. Dentre os patrocinadores “pré-pandemia”, houve apenas suspensão de uma renovação, manutenção dos demais contratos e captação de um novo patrocinador para o clube.

SPORT – O clube pernambucano, que retorna à Série A neste ano, inicia processo de inovação em ambientes digitais, em parceria com empresas com a Horizm e Dugout. Jurandyr Gayoso, diretor de comunicação, destaca que o clube ainda enfrenta dificuldades financeiras para implementar algumas das iniciativas digitais pensadas.

O clube inicia campanhas de engajamento com a torcida por suas redes sociais e pelo seu aplicativo. Por lá, há ações de conscientização à covid-19, lives e campanhas solidárias.

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