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Cultura

Vida familiar do diretor Bruno Risas é levada a festivais

Por Agência Estado

18 de outubro de 2020, às 07h50 • Última atualização em 18 de outubro de 2020, às 09h11

Diretor de fotografia de filmes que fazem a diferença no cinema brasileiro atual – A Rosa Azul de Novalis, de Gustavo Vinagre, Era o Hotel Cambridge, de Eliane Caffé, e Desterro, de Maria Clara Escobar -, Bruno Risas estreia na direção de longa com Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu. O filme circulou por festivais nacionais e internacionais. Passou na Mostra Aurora, de Tiradentes, e no Festival de Turim, na Itália. O curador do evento deixou Bruno todo sorrisos – disse que depois de ver o filme três vezes em link, a quarta, na tela grande, revelou outro filme, muito mais belo.

Bruno quer continuar sua carreira de autor, mas nem sonha em abandonar a direção de fotografia. Ama o trabalho em equipe, a troca. Reflete sobre a fotografia de filmes: “A gente faz o filme pensando na tela grande, mas cada vez mais a multiplicidade de telas permite que as pessoas escolham como e quando vão ver os filmes. Tem gente que vê no celular, no ônibus, no metrô. Não é a mesma fruição do cinema, mas a gente segue trabalhando para fazer os filmes fortes, intensos.”

Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu começou a nascer há dez anos, num momento de crise. Desde a quinta-feira, 15, encontra-se disponível na Netflix. A crise econômica que atingira os EUA e a Europa tinha seus reflexos no Brasil de 2010, que também fazia a transição da presidência de Luiz Inácio Lula da Silva para Dilma Rousseff.

“Minha família havia experimentado certa ascensão social, mas aí vieram os problemas. Perda de emprego, disputa pela casa, com os meus tios. Comecei a filmar algumas imagens com eles – minha mãe, meu pai, minha avó, que morreu no ano passado, minha irmã. Filmava, sem saber o filme que estava fazendo. E aí, um dia, descobri o que queria fazer. Todo mundo que vê o filme e com quem converso fala nessa pegada de documentário, mas embora seja a minha família, a obra é uma ficção. Estou falando de conflitos familiares numa dimensão meio fantástica, com um toque de ficção científica.”

O filme venceu o prêmio da primeira obra no Festival Cinéma du Réel. A coisa estranha no céu é um disco-voador. A mãe é abduzida. Como fica a vida familiar? “Comecei a filmar numa situação de desemprego que estava atingindo a minha família, mas aí ocorreu uma coisa curiosa. Estava fazendo o filme sozinho, mas ganhei um dinheiro para a produção e a situação mudou. A Flora Dias veio filmar comigo e eu pude empregar as pessoas, num esquema mais profissional. (Flora assina a fotografia do filme concluído e também tem crédito de assistente). Até os meus pais passaram a ter uma atitude diferente em relação ao que estávamos fazendo.” E foi aí que houve a grande mágica: “Conversava muito com amigos sobre o absurdo da vida cotidiana, que, para nós, não difere do absurdo da ficção científica. Os códigos que definem as funções sociais das pessoas são invenções, e por isso foi possível encarar o gênero num formato de drama familiar documental.”

A sacada de Bruno foi descobrir que sua mãe, Viviane Machado, poderia ser uma verdadeira, e grande, atriz. A dona de casa que nunca representou revela uma beleza particular. Possui a boca amarga de estrelas como Jeanne Moreau e Lilian Lemmertz, e fuma muito, como a primeira. Encara a câmera sem piscar e num silêncio que amplifica o drama. Numa das cenas, ela não consegue manter o silêncio, ou finge que não consegue. Começa a rir e explode, batendo boca com o filho cineasta. Bruno aparece bastante no filme, que começa com sua voz. Em outra montagem, chegou a aparecer mais, mas achou que estava sendo narcisista e reduziu a presença. Nesse caso específico, a discussão com a mãe, em que as vozes de ambos se alteram – ela em primeiro plano, ele, fora de campo -, Bruno não consegue diferenciar o que é ficção e o que é documentário. “São as duas coisas, o híbrido é muito forte.”

Justamente o híbrido. “O filme circula muito por diversas formas. É metalinguístico, faz perguntas para si e para os personagens. E era um processo que todo mundo vivia de forma muito intensa. No começo era tudo muito simples e direto, mas quando a equipe cresceu e tinha um monte de gente na casa, passou a haver uma construção elaborada, com travelings, refletores. E havia a rotina de filmar, que não era a da casa. A gente chegava cedo, definia a cena, filmava. E quando ocorriam coisas interessantes no set, a gente agregava. Tudo isso eu tinha de discutir principalmente com minha mãe, que é quem mais aparece.”

Bruno está acostumado a filmar personagens reais. Sabe que a exposição é grande, quando as pessoas aparecem e se veem na tela. Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu aborda questões íntimas da família – feridas. “Não queria expor meus pais, mas quando levamos o filme a Tiradentes, e eu vou muito à Aurora, percebi que eles estavam tranquilos. Os problemas deles foram ressignificados para a plateia.” Com certeza. Com essa mãe, Bruno deu universalidade à história de sua família. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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