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Cultura

Trabalho em dose dupla

Andréa Beltrão celebra exibições e relembra bastidores das gravações de “Hebe” e “Tapas e Beijos”

Por Geraldo Bessa / TV Press

09 de agosto de 2020, às 09h01

Os anos 2010 foram muito frutíferos para Andréa Beltrão. De forma despretensiosa, no início da década, ela topou protagonizar “Tapas e Beijos” ao lado de Fernanda Torres. O que seria uma série de humor de, no máximo, duas temporadas, tornou-se um sucesso que ocupou o horário nobre por cinco anos. Ao final da série, embarcou em um dos trabalhos mais complexos de sua vida ao interpretar Hebe Camargo no filme e na minissérie dedicados à apresentadora.

Agora, em casa por conta da pandemia de coronavírus, Andréa pode assistir do conforto de seu lar ao resultado de seu esforço e comprometimento ao longo dos últimos anos com a reprise da série cômica e a estreia de “Hebe” na programação da Globo.

“O melhor disso tudo é que me sinto muito produtiva. São dos trabalhos que me exigiram muito e me levaram para emoções bem diferentes. Trabalhar cansa, mas é gratificante”, analisa a atriz de 56 anos que, em ambas produções, foi dirigida por Maurício Farias, com quem é casada desde 1994.

Natural do Rio de Janeiro e “cria” do Tablado, prestigiada escola de interpretação fundada por Maria Clara Machado, Andréa estreou na tevê, em 1981, fazendo uma “ponta” em “Ciranda de Pedra”. “Tinha 18 anos. Nessa idade a gente tem de fazer o que aparecer. O importante era ganhar repertório”, relembra, entre risos.

A primeira boa oportunidade na tevê veio em “Corpo a Corpo”, de 1984. Na sequência, brilhou nas três temporadas do sucesso “Armação Ilimitada”, onde viveu a moderna jornalista Zelda, vértice do triângulo amoroso formado com os protagonistas Juba e Lula.

A década seguinte foi marcada por personagens de sucesso como a Tônia de “Mulheres de Areia”, a icônica Radical Chic e a apaixonada Lisa, mocinha de “A Viagem”. Nos anos 2000, se distanciou das novelas e encontrou prestígio e popularidade em produções como “A Grande Família” e “Som e Fúria”. “Minha relação com a tevê é de muita liberdade. Fiz tanta coisa diferente nos últimos anos que meu próximo projeto é uma novela. Vai ser como uma volta às raízes”, celebra a atriz, escalada para “Em Seu Lugar”, trama prevista para 2021.

Andréa acompanha com ressalva as reprises de seus trabalhos mais antigos pelo canal Viva – Foto: Divulgação

A quarentena acabou fazendo a Globo decidir pela exibição de “Hebe” na tevê aberta e pela reprise de “Tapas e Beijos”. Essa exposição dupla é uma surpresa para você?
Bastante. “Hebe” foi produzida já pensada para a Globoplay. Mas era esperado que em algum momento a emissora fosse exibir na programação, já que é uma obra de forte apelo popular. “Tapas e Beijos” foi um dos projetos mais felizes da minha carreira, que poderia ter sido estendido, mas saiu de cena no momento certo. Esse sim, achava que só mataria as saudades pelos canais fechados ou “streaming”. A Globo tem um monte de série para reprisar e eu fiquei muito feliz que escolheram a nossa.

A série chegou ao fim em 2015 e o Brasil mudou muito ao longo desses últimos cinco anos. Você acha que os temas de “Tapas e Beijos” envelheceram bem?
Muito bem. A pauta feminista voltou com força e a série já abordava a história de mulheres fortes e independentes dispostas a conquistar um lugar no mundo de forma muito contundente e bem-humorada. Fátima (Fernanda Torres) e Sueli continuam muito atuais, oscilando entre a valentia e a fragilidade e sempre defendendo o equilíbrio entre amor e liberdade. Elas eram muito destemidas e é interessante como foram crescendo e se transformando durante o desenvolvimento da série.

Você é acostumada a viver uma mesma personagem por muito tempo. Foi assim em “Armação Ilimitada” e “A Grande Família”, por exemplo. Quais os prós e contras dessa longevidade?
Tudo depende de como a personagem vai evoluindo. O risco da história se perder é muito grande. Tive a sorte de viver o mesmo tipo por longos períodos que foram ganhando outros contornos e me dando novas referências. O momento que a gente precisa se despedir desses papéis é que é muito complicado. Mesmo que esteja saindo de cena no momento ideal, fica um vazio estranho. Sinto saudade dos bastidores de “Tapas e Beijos” até hoje.

Do que mais sente falta?
Era um ambiente muito harmonioso. Eu conhecia a Fernanda (Torres) antes da série, mas a sintonia foi tão grande que hoje a tenho como uma irmã. E é um carinho que se estende por toda a família dela. No caso do Fábio (Assunção), foi um encontro artístico muito bonito, onde pude compreender a razão dele ser essa pessoa tão querida por quem faz e por quem assiste televisão. Sinto saudade de trabalhar com todo esse elenco incrível, ficamos todos muito próximos.

O projeto de filme e série sobre a vida da apresentadora Hebe Camargo surgiu quando você ainda estava gravando “Tapas e Beijos”. Foi um trabalho importante para curar a “ressaca” do fim da série?
Eu me cerquei de trabalho para não sentir tanto. Atuei em quatro filmes e realizei o sonho de fazer “Antígona” no teatro. Paralelamente, me preparava para interpretar a Hebe. A personagem exigiu um grande mergulho e por muito tempo pensei que não seria capaz de fazer esse papel com propriedade. Foi um processo realmente difícil, onde tive de testar tudo o que eu sabia até então sobre interpretação.

Qual foi sua maior dificuldade?
Fiquei muito insegura em interpretar alguém com a imensidão da Hebe, uma mulher muito famosa, que está no inconsciente coletivo dos brasileiros e que nunca teve medo de se expor. Ela errou muito, falou diversas besteiras, defendeu políticos indefensáveis e tinha uma postura muito conservadora. Ao mesmo tempo, era uma importante apoiadora dos direitos das minorias, foi uma das primeiras pessoas a falar e defender o aborto de forma pública e enfrentou toda uma série de assédios que uma mulher com a visibilidade dela poderia sofrer em um ambiente masculino como a tevê.

Como a personagem chegou até você?
A Carolina Kotscho, roteirista responsável pelo filme e pela série, me procurou quando ainda estava na fase de pesquisa para o projeto. Eu levei um susto, pois foi algo realmente inusitado. Pouco tempo depois, ela convidou o Maurício (Farias) para dirigir e tudo foi ganhando mais forma. Os dois foram fundamentais para que eu ganhasse mais confiança para esse trabalho. Geralmente, a interpretação em produções biográficas segue por uma linha mais da imitação e eles queriam um caminho diferente, onde o elenco tivesse liberdade de criar uma versão mais livre sobre os personagens. Foram três anos de muita pesquisa e referências até eu me considerar realmente pronta para filmar.

E qual foi o ponto mais difícil de todo esse processo de construção?
O sotaque! Foi muito complexo entender a dinâmica de como ela se expressava. Hebe nasceu e se criou em Taubaté, cidade do interior de São Paulo e tinha um sotaque muito carregado. Depois, quando ela se mudou para a capital, mexeu no jeito de falar, puxando menos os “erres”. E, às vezes, quando ela cantava, ainda colocava um “carioquês” em algumas palavras. A maneira dela falar mudava o tempo todo. Eu só consegui captar isso quando entendi que o “gatilho” era o modo que ela estava se sentindo. Isso acontece com todo mundo. O sotaque é definido pelo nosso estado de espírito (risos).

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