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Teatro

Primeira fase das obras do novo Teatro Cultura Artística será concluída este mês

Por Agência Estado

21 de julho de 2019, às 07h00 • Última atualização em 27 de abril de 2020, às 11h32

Pela pequena porta na Rua Nestor Pestana já entraram os maiores artistas da música clássica do século 20. Ela fica quase no local onde a rua, no centro de São Paulo, faz a curva, passando então pela Catedral Evangélica e seguindo em direção à Rua da Consolação, caminho para a Biblioteca Mário de Andrade e para o Teatro Municipal.

Ao passar pela porta, o curto e escuro corredor logo levava, à esquerda, em direção ao foyer de entrada do Teatro Cultura Artística. Lá ficava uma barbearia que, durante décadas, cuidou dos cabelos de senhores frequentadores do centro e também de artistas ilustres. E dali se podia chegar tanto à Sala Rubens Sverner, onde atores como Cacilda Becker, Jardel Filho e Paulo Autran realizaram atuações memoráveis; ou então subir para o primeiro andar e entrar na Sala Esther Mesquita, que a partir de 1947 testemunhou algumas das principais apresentações de um século de vida cultural em São Paulo, de concertos de Villa-Lobos a recitais de Yo-Yo Ma ou Nelson Freire.

A porta continua lá, no mesmo lugar, mas hoje entram por ela 150 funcionários que trabalham desde junho de 2018 na construção do novo Teatro Cultura Artística. Agora provisório, o corredor ainda é curto. E segue revelando o foyer, despido de sua decoração original, com o chão em concreto batido – mas já revelando também a sala menor, que já tem cara de teatro, com palco e a plateia pronta para receber 400 cadeiras.

Mas antes de entrar na sala, o prédio – ou o que restou dele – carrega ainda história a ser contada. Em uma abertura onde ficava uma das portas corta-fogo, as cinzas, mesmo tanto tempo depois, ainda nos remetem à madrugada de 17 de agosto de 2008, quando um incêndio destruiu quase inteiramente o antigo Cultura Artística. As portas funcionaram. A partir delas até a fachada, decorada com o painel de Di Cavalcanti, o prédio foi preservado. Mas as salas de espetáculos, os bastidores, pianos, cenários – tudo acabou destruído, deixando um espaço quase vazio, não fosse o entulho e o aço retorcido. A cidade parou naquele domingo para assistir ao trabalho dos bombeiros. Incêndio põe abaixo o Teatro Cultura Artística, dizia a primeira página do jornal O Estado de S. Paulo no dia 18 de agosto, com uma foto na qual as chamas se erguiam do teatro já destruído.

Nos meses seguintes, os planos de reconstrução começaram – com desafios próprios. Algumas versões do projeto se sucederam, tentando dialogar com a fachada original, mas incluindo estruturas mais amplas tanto de palco quanto de escritórios, com uma torre ao lado do teatro. Com o tempo, no entanto, o projeto foi redimensionado. A sala passou a ter a configuração de um espaço para música de câmara, ou seja, para pequenas formações. E ganhou uma estrutura para atividades pedagógicas e de formação no projeto assinado pelo arquiteto Paulo Bruna.

“Essa ideia nos pareceu bastante interessante, porque atendia a nossas necessidades e ao mesmo tempo dava a São Paulo um espaço que a cidade não tinha, que é uma sala de qualidade para a música de câmara”, diz o superintendente da Cultura Artística Frederico Lohmann, enquanto caminha pelas obras, cuja primeira fase deve ser encerrada ainda este mês. “Com o prédio começando a ganhar forma, a nossa sensação é de que acertamos exatamente na proporção, à luz daquilo que imaginamos.”

Impacto

De volta ao foyer do térreo, o único ponto de interesse não é a presença já da entrada para a pequena sala de apresentações, que no novo projeto servirá para teatro, palestras e outras atividades, ganhando o caráter de um uso flexível. Olhando em direção à rua, uma fileira de colunas demarca o que é novo e o que foi preservado pelas chamas. Nessa área, as paredes trazem avisos, “respeitados com todo cuidado”, diz um dos funcionários que trabalhavam na obra na manhã da última quarta-feira, 17. “Manter alvenaria”, diz um deles. “Remover revestimento cuidadosamente”, pede outro.

Isso tudo porque, nessa área, o objetivo, respeitando as regras de patrimônio, é manter o projeto original – as pastilhas verdes e azuis que decoravam o chão e as colunas foram extraídas para um delicado processo de recuperação antes de serem colocadas de volta.

O acesso aos pavimentos superiores se dá por escadas na lateral – e aqui o trajeto é acompanhado de noções a respeito de como o novo projeto criou maior espaço de trânsito para o público, assim como para os artistas. Mas, depois de dois lances de subida, as explicações se perdem na memória por conta do impacto provocado pelo que já é possível vislumbrar: a nova sala de espetáculos principal do Cultura Artística.

As dimensões são parecidas com as do teatro antigo. Mas a configuração é totalmente diferente. A primeira diferença está no balcão que fica ao fundo do palco e o rodeia, dando ao teatro a cara de uma arena (ali poderão ficar tanto o público quanto cantores de um coral, quando o concerto assim pedir).

A plateia principal, por sua vez, está dividida entre o térreo e uma arquibancada superior que, ainda em concreto, o observador parece perder de vista em direção ao alto (serão cerca de 750 lugares). Nela, já há um pequeno detalhe em branco, um protótipo de como será a decoração final da sala. Mais ao alto, já está reservado o espaço para a cabine técnica que, mais do que controlar a luz, será também um estúdio de gravação: os microfones estarão instalados em pontos-chave da sala, permitindo o registro, ao vivo e com qualidade, de qualquer apresentação.

A descida se dá pelo outro lado do prédio, onde há uma parede de vidro que permite a quem estiver na Praça Roosevelt observar a sala – e vice-versa. É um dos pontos principais do novo projeto, simbólico da ideia de se estabelecer entre o teatro e a cidade uma nova e mais aberta relação, como diz Lohmann. E, pelo mesmo corredor, se tem acesso à rua mais uma vez. Com o fim da primeira fase das obras, o prédio será fechado, à espera de verbas para a conclusão, o que deve acontecer em 2021. Há ainda muito chão pela frente. Mas, olhando para o alto, o painel de Di Cavalcanti, já restaurado, parece ter cores ainda mais vivas. Pode ser impressão – mas talvez ele esteja feliz por, dez anos depois do incêndio, não estar mais sozinho no número 236 da Nestor Pestana.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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