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Música

Rockdown: astros com mais de 70 anos aquecem suas carreiras na pandemia

Por Agência Estado

29 de novembro de 2020, às 07h30 • Última atualização em 29 de novembro de 2020, às 11h37

Isolada em fazendas, mansões, quartos e estúdios caseiros, a geração mais clássica do rock não vai usar o isolamento para anunciar suas retiradas de cena. Pelo contrário. Gente com mais de 70 anos, como Eric Clapton, Mick Jagger, Elton John, Paul McCartney, AC/DC, Roger Waters e Bruce Springsteen, reativaram suas carreiras e, mesmo aqueles que já haviam falado em aposentadoria antes da pandemia, surpreenderam ao colocar datas em agendas bem antecipadas. Alguns colhem boas críticas do que fizeram nos últimos meses e outros têm na agulha trabalhos inéditos para o final do ano.

Clapton, 75 anos, era quem inspirava mais cuidados. Em 2017, anunciou em uma entrevista estar com um mal chamado neuropatia periférica, uma doença que afeta o sistema nervoso e a movimentação dos membros. “Ainda posso tocar, mas tem sido um trabalho duro. Estou ficando velho. Sento-me em um canto de nossa sala, pego uma guitarra e toco na parte da manhã.” A pandemia parecia enterrar as chances de vê-lo sobre um palco até ele anunciar três datas para se apresentar em sua segunda casa, o Royal Albert Hall, de Londres, em 14, 17 e 18 de maio.

Sua gravadora acaba de colocar nas plataformas a nova edição do Eric Claptons Crossroads Guitar Festival, uma jam session estelar que ele dirige desde 1999. O projeto foi gravado ao vivo em 2019, no Texas, quando recebeu no palco Peter Frampton, Jeff Beck, Bonnie Raitt, Sheryl Crow, Tedeschi Trucks Band, Buddy Guy, John Mayer, Robert Cray, Gary Clark Jr., Vince Gill e protagonizou, ao lado de Frampton, uma versão matadora de While My Guitar Gently Weeps, dos Beatles. O que pouco se comentou também foi o relançamento de Riding With the King, o álbum gravado com BB King em 2000.

A Reprise lançou uma edição comemorativa de 20 anos em LP duplo nas versões azul ou preto de 180 gramas. As novidades são duas faixas gravadas nas sessões originais que não haviam sido usadas: uma Rollin and Tumblin, de Muddy Waters, que Clapton havia tocado com o Cream no primeiro álbum, Fresh Cream, de 1966, e um cover de Let Me Love You Baby, do baixista e prolífico bluesman, Willie Dixon.

Outro bravo inglês é Elton John, 73 anos completados ao lado do marido David Furnish no início da pandemia, em 23 de março. Sua Farewell Yellow Brick Road, a turnê da despedida, seria feita pelos Estados Unidos e Canadá entre março e maio até os deuses o impedirem de dizer adeus. Corajosamente, ele jura que os shows vão começar em New Orleans no dia 19 de janeiro de 2022. Não 2021, mas 2022. Não há notícias de que Sir Elton estaria com algum problema de saúde. Um episódio triste em fevereiro, na Nova Zelândia, o fez interromper um show antes da hora, depois de perder a voz. Elton estava com pneumonia, não conseguiu cantar e deixou o palco às lágrimas. Mas passou.

Quando os bisnetos de Bruce Springsteen perguntarem o que ele fez em 2020, aqueles dias que os livros contarão terem sido dos piores, ele poderá dizer que fez Letter to You. Um discaço, cheio de alma e com o rock mais puro que sai metade do Boss, o chefão, como o chamam, e metade de uma das mais espetaculares bandas do mundo, sua E Street Band. Ele voltou a gravar com o grupo dos guitarristas Stevie Van Zandt e Nils Lofgren depois de seis anos, quando fizeram High Hopes. Letter to You foi feito em cinco dias, com todos tocando ao mesmo tempo e sem refazer um take para aproveitar o calor das vontades. “Eu amo a natureza emotiva de Letter to You”, disse Bruce. “E amo o som da E Street Band tocando ao vivo, de uma forma que nunca fizemos antes.”

A agenda de Bruce segue parada e quem já o viu no palco sabe o que significa estar em seu show. Três horas ou mais de rock que perpassam, além dos álbuns que lança, covers que a plateia pede e canções que nem sempre estão no repertório. Sobre o que virá depois da pandemia, ele diz a seus seguidores: “Quando essa experiência acabar, vou dar a festa mais louca que vocês já viram”.

Aos 78 anos, Paul McCartney foi para a fazenda da família. Cheio de tempo ocioso, acabou ficando muitos dias na sala de música para rever canções inacabadas e desengavetar ideias que começaram a ganhar forma. Criou linhas melódicas sobrepostas a linhas que já existiam e, quando percebeu, já tinha material para um álbum inteiro. Ele mesmo escreveu o seguinte em suas redes sociais: “Eu tinha algumas coisas nas quais trabalhei ao longo dos anos, que às vezes ficavam sem conclusão. Todo dia eu começava gravando com o instrumento com o qual escrevi a música e aí, gradualmente, fui adicionando camadas. Foi muito divertido. Foi sobre fazer música para você mesmo em vez de fazer música que tem de cumprir um trabalho”.

Mas aquilo tudo se tornou trabalho e McCartney, isolado, lembrou dos dois discos que já fez tocando todos os instrumentos, em 1970 e em 1980, e começou a gravar McCartney III. Mais uma vez, ele toca todos os instrumentos e assina todas as letras, as músicas e os arranjos. O álbum está previsto para sair em 18 de dezembro.

O repórter Stuart Stubbs, da revista Loud And Quiet, falou com Paul em outubro e comparou o álbum de agora com o disco de 1970, feito em isolamento espiritual, logo depois da traumática separação dos Beatles. Haveria alguma semelhança? “Eu acho que é parecido. Tem a ver com liberdade e amor. Há uma grande variedade de sentimentos nisso…”

Matt Everitt, da BBC Radio, falou com o músico em outubro e quis saber se a pandemia havia interferido em seu jeito de escrever. “Sim, acho que sim”, disse Paul. “Algumas das canções mais recentes, como esta chamada Seize the Day, tem ecos da pandemia quando diz quando os dias frios chegarem, gostaríamos de ter aproveitado.”

Mick Jagger, 77 anos, andou em atrito com Paul no início da quarentena sobre a longevidade dos Stones versus a inexistência (física) dos Beatles. Quem começou foi Paul, em uma entrevista à BBC, dizendo como via que os Stones haviam caminhado sempre na cola dos Beatles: “Observe a história. Os Beatles vão para os Estados Unidos, um ano depois os Stones também vão. Escrevemos o primeiro single deles, I Wanna Be Your Man. Entramos na psicodelia, eles também entraram. Nos vestimos como feiticeiros, e eles também”. Mas Mick não se calou e parece ter definido tudo ao mandar essa: “Uma banda é inacreditavelmente sortuda tocando em estádios e a outra banda não existe”.

Mick com Ron Wood, Charlie Watts em sua bateria imaginária e Keith Richards fizeram uma aparição comovente em abril, talvez com o que será um dia reconhecido como o hino dos tempos quarentenais, no festival online One World: Together at Home, cantando You Cant Always Get What You Want. Paul também esteve lá, mas sua Lady Madonna, tocada delicadamente no órgão de sua sala, não teve tanto impacto. Os Stones também lançaram Living In A Ghost Town. “A vida era tão bela e agora todos estão presos”, cantam em uma parte da canção sobre a cidade fantasma, a primeira inédita desde Doom And Gloom e One More Shot, as duas de 2012.

Roger Waters, 77 anos, não tem exatamente um novo álbum na manga, mas, depois de liberar ao público sua apresentação de Another Brick in the Wall, o músico dispôs também uma versão de Time, feita no show que ocorreu em Amsterdã, em junho de 2018. E lançou um clipe comovente de Mother em estética pandêmica, com o vídeo em preto e branco dividido em telas nas quais os músicos entram aos poucos até tudo chegar a um grau explosivo e atingir o ponto das lágrimas. Outro grupo usou os meses do isolamento social de 2020 para, enquanto só falavam em mortes, ressuscitar. Quando as notícias levavam a crer que os australianos do AC/DC estavam com seus dias contados, dizimados pela ausência de Malcolm Young, líder e compositor de quase tudo do grupo, morto em 2017 depois de agonizar em uma demência por três anos, eles vieram com uma pancada de álbum chamada Power Up.

Parecia maldição

Antes de Young partir, o baterista Phil Rudd foi preso por porte de drogas e tentativa de assassinato, uma denúncia que foi retirada, mas que lhe custou oito meses de prisão domiciliar. Logo depois, o baixista Cliff Williams desiludiu-se e pediu aposentadoria. E então, os ouvidos do vocalista Brian Johnson jogaram a toalha depois de décadas suportando toneladas de decibéis e pararam de funcionar. A pandemia então, por incrível que pareça, realinhou as órbitas da banda ao redor de Angus Young, o novo líder, e tudo começou a ser refeito. Rudd pagou sua dívida com a Justiça; Stevie Young, filho de Malcolm, veio reforçar o time juntando-se a Angus no paredão de guitarras; Rudd saiu da depressão; e Brian recebeu uma espécie de prótese de tímpano espetacular, que lhe devolveu a sensibilidade para ouvir cada solo de Angus. Power Up ignora a quarentena e as baladas para fazer o som de um mundo que, ao menos para o AC/DC, é exatamente o mesmo de sempre. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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