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Cultura

Manoel Carlos, o mais cronista dos novelistas

Mosaico diverso e instigante, reprise de “Mulheres Apaixonadas” no Viva mostra todo o poder da obra do autor

Por Geraldo Bessa / TV Press

18 de setembro de 2020, às 16h01

Sem as vilanias calculadas das tramas de Gilberto Braga ou os exageros de Aguinaldo Silva, Manoel Carlos, que escolheu o charme do bairro carioca do Leblon para desenvolver seus dramas, por muito tempo, soube prender o telespectador em longuíssimas cenas de café da manhã, missas ou um simples passeio à beira-mar. A “receita” que potencializa todo esse naturalismo deu muito certo em, ao menos cinco novelas, e chegou ao seu ápice em “Mulheres Apaixonadas”, sucesso que acaba de ganhar uma reprise no canal pago Viva.

As heroínas sempre foram uma grande fonte de inspiração para o autor e, nesta obra, ele conseguiu criar um mosaico apropriado e interessante que contempla personagens complexas que não deixam nada a desejar para a figura marketeira de Helena, vivida na trama por Christiane Torloni.

A protagonista, na verdade, parece apenas costurar os casos que se desenvolvem ao seu redor, como a possessiva Heloísa, um dos tipos mais marcantes da carreira de Giulia Gam, a alcoólatra Santana, uma atuação carregada de sensibilidade de Vera Holtz, a vítima de violência doméstica e perseguição Raquel, de Helena Ranaldi. E, por fim, o casal lésbico jovem Clara e Rafaela, de Alinne Moraes e Paula Picarelli, respectivamente.

O cotidiano da classe média e das grandes elites sempre foi o pano de fundo perfeito das tramas de Manoel Carlos. Em “Mulheres Apaixonadas”, entretanto, ele abre espaço para conflitos de classe em um Brasil que se preparava para um grande crescimento econômico. Pobre ainda era pobre e os ricos continuavam dominando a cena, mas sem os típicos arquétipos que envolvem essa disputa, como fica claro em personagens como a insossa Edwiges, de Carolina Dieckmann, ou a egoísta e decadente Dóris, personagem interpretada por Regiane Alves, que fez o País discutir sobre os maus tratos contra idosos.

Apesar dos temas mais pesados e dos dilemas sem fim, impressiona o modo como Manoel Carlos aglutinava assuntos sem perder o equilíbrio, a elegância e o clímax a cada novo bloco de capítulos.

Injetando boas doses de energia a um texto essencialmente contemplativo, é importante exaltar a parceria do autor com a direção certeira e “ligada” de Ricardo Waddington. A visão de Ricardo tem o mérito de não deixar o texto cair em um possível marasmo e, sempre a serviço da história, o diretor criava junto com um autor, com a intimidade de quem também esteve por trás das lentes de outros êxitos como “Por Amor”, de 1997, e “Laços de Família”, de 2000.

FIM DA PARCERIA

O fato é que, depois de “Mulheres Apaixonadas”, aconteceu a ruptura entre Manoel Carlos e Waddington. Incomodado com o tom mais autoral do diretor, o autor resolveu fazer uma nova dupla com Jayme Monjardim. Lentas, monótonas e com audiência aquém do esperado, tramas como “Viver a Vida” e “Em Família” retiraram Manoel Carlos da fila das novelas das nove e ele segue até hoje na “geladeira” da Globo.

Sempre com um projeto de série ou especial que, infelizmente, não saem do papel. Mesmo que resista ao poder voraz do tempo em muitos aspectos, “Mulheres Apaixonadas” também têm seus deslizes aos olhos de hoje, como a aceitação de posturas machistas demais, em especial de Theo, personagem de Tony Ramos.

No mais, a reprise é um deleite para o público do Viva, que pode refrescar a memória com os devaneios de Estela, a pobre menina rica apaixonada por um padre, interpretada por Lavínia Vlasak, ou a paixão racional entre a experiente Lorena e o bruto Expedito, papéis de Susana Vieira e Rafael Calomeni. Mesmo ambientadas no Leblon, as emoções criadas por Manoel Carlos são universais e merecem serem revisitadas e exaltadas.

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