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Cultura

Galerias e artistas se unem em ações virtuais e colaborativas na quarentena

Por Agência Estado

01 de maio de 2020, às 07h00 • Última atualização em 01 de maio de 2020, às 15h35

Desde que o coronavírus avançou no Brasil, instituições de arte tiveram de se reinventar e intensificar estratégias digitais. Diante desse cenário, as galerias, cuja lógica difere da dos museus, por dependerem principalmente da venda de obras, têm se desdobrado para conseguir manter a fidelidade do público, garantir a sua sustentabilidade financeira e até mesmo ajudar no combate à pandemia.

Muitas delas têm unido forças em diferentes projetos que estão sendo lançados nos últimos dias. É o caso da P.art.ilha, rede de artistas, galerias e agentes culturais de todo o País, que se juntaram para sensibilizar colecionadores e atrair novos públicos por meio de iniciativas online coordenadas. As 17 galerias participantes são conhecidas por apostarem em projetos artísticos inovadores e experimentais. Entre as de São Paulo, estão nomes como Aura, B_arco, Janaina Torres, Lume e Sé.

A primeira ação será lançada hoje e envolve a divulgação de uma seleção de obras de arte, de nomes como Matheus Chiaratti, Andrey Zignnatto, Osvaldo Gaia e Vania Toledo, que serão vendidas com condições especiais. Cada aquisição realizada no mês de maio garante ao comprador um crédito de igual valor para adquirir obras de outros artistas da mesma galeria. Além de estimular a cadeia criativa, a proposta também tem viés beneficente: parte dos recursos será destinada a instituições sociais como a Salvando Vidas e a Por Nossa Conta, de São Paulo, e a Lá da Favelinha, de Belo Horizonte. As informações serão divulgadas na página do Instagram @p.art.ilha.

Na avaliação de Bruna Bailune, fundadora da galeria Aura e uma das idealizadoras da rede, as transformações do momento podem vir para o bem. Apesar da redução de vendas provocada pela pandemia, ela vê o cenário com otimismo, pois trouxe uma conexão inédita entre galeristas e artistas. “Os grupos que estão surgindo são um indício de que talvez o nosso modo de fazer as coisas não vinha sendo o melhor e de que podemos repensá-lo juntos. No dia a dia, ficamos dispersos, fixados em buscar as nossas próprias metas. Nosso sistema já estava com muitas falhas, e agora é hora de todo mundo olhar com atenção para sairmos mais forte dessa”, reflete ela.

Criatividade em isolamento

Uma iniciativa semelhante foi idealizada pelas artistas Lais Myrrha e Marilá Dardot, pela curadora Cristiana Tejo e por Julia Morelli, fundadora da plataforma 55 SP. Trata-se do Projeto Quarantine, lançado em 13 de abril. Marilá e Cristiana moram em Portugal e estavam no Brasil em março, até poucos dias antes do início da quarentena, quando visitaram a exposição de Hudinilson Jr., então em cartaz na Pinacoteca. No retorno, inspiradas pela “arte postal” do artista, elas tiveram a ideia de criar o projeto, adaptando o conceito para o modelo virtual.

A partir dessa proposta, 45 criadores de diferentes regiões do País foram convidados a produzir obras durante o período de confinamento, com os materiais e instrumentos que tinham disponíveis. Entre desenhos, gravuras digitais, vídeos e fotografias, a ideia é que elas possam ser enviadas digitalmente, considerando também as condições de isolamento do comprador, que recebe instruções de como executá-las.

De nomes como Ana Lira, Daniel Lie, Guto Lacaz, Janaina Wagner e Romy Pocztaruk, os trabalhos são vendidos pelo mesmo valor (R$ 5 mil), que, depois, é dividido igualmente entre todos. Uma cota ainda é revertida para o fundo emergencial da Casa Chama, também contemplado pela P.art.ilha. As obras estão à venda na Plataforma 55SP (55sp.art/quarantine).

“É um experimento artístico. A diferença é que é um gesto coletivo, igualitário e distributivo para este momento de pandemia”, explica Julia Morelli, que, assim como Bruna, considera que é uma boa hora de repensar os modelos tradicionais do mercado de arte. “Foi muito gratificante reunir todos os artistas rapidamente, eles foram muito receptivos. Agora, já há outros pedindo para participar e estamos pensando até em novos formatos”, conta Julia.

Focada exclusivamente na filantropia, há ainda a campanha Arte Contra a Covid-19, que reúne as consagradas galerias A Gentil Carioca, Almeida & Dale, Fortes dAloia & Gabriel, Kogan Amaro, Leme, Luisa Strina, Luciana Brito, Mendes Wood DM e Millan. Para essa iniciativa, artistas e galeristas doaram obras para serem comercializadas com valor reduzido em 25%. O montante arrecadado será doado integralmente a instituições sociais como a Associação Civil Ânima e a Associação Cultural Lanchonete Lanchonete.

Estratégias online

Mostras virtuais, lives com artistas e podcasts estão entre as apostas das galerias de arte, incluindo aquelas que não integram essas redes colaborativas. É o caso da Galeria Almeida Prado. “Decidi fechar temporariamente a galeria assim que se confirmaram os primeiros casos no Brasil. Ficaria muito arriscado continuar trabalhando, principalmente nos fins de semana, quando o fluxo de turistas é sempre maior”, relata o galerista Fábio Almeida Prado.

Duas exposições estavam previstas para ocorrer no local no primeiro semestre. Uma delas seria de Lêda Watson, especialista em gravuras em metal. Como a artista já tem mais idade, a realização da mostra agora é incerta. “Saúde em primeiro lugar”, diz o galerista. A outra mostra seria uma coletiva com artistas ligados à arte urbana. “O tema ainda não tinha sido definido, mas agora ficou fácil saber qual será”, diz Fábio, referindo-se, claro, à pandemia.

Enquanto não é possível estabelecer novas datas para essas exposições, ele convidou artistas que representa, como Clarice Gonçalves e Marcelo Jorge, para apresentarem seus ateliês pela internet, mostrando como a quarentena influencia seus processos criativos. A ideia é que eles ainda reforcem com o público dicas de prevenção contra o coronavírus.

Em uma ação semelhante, a Galeria Kogan Amaro convida os artistas com os quais trabalha para assumirem, por um dia, a sua conta no Instagram. Neste fim de semana, são os próprios galeristas que vão interagir com o público. No sábado, 2 de maio, a colecionadora e pianista Ksenia Kogan Amaro faz uma live de sua casa, onde também apresenta um concerto. No domingo, é a vez de seu marido e sócio, o artista empresário Marcos Amaro, assumir a rede.

Antes mesmo da quarentena, a Millan criou uma série de podcasts, disponíveis no Spotify, em que artistas como Paulo Pasta e Rodrigo Andrade falam sobre seus processos criativos. Com o avanço do vírus, a galeria também passou a promover conversas dos artistas com o público. Na próxima terça-feira, 5 de maio, às 17h, David Almeida participa de uma live para falar sobre a sua produção.

Em março, pouco antes do início da quarentena, a Fortes DAloia & Gabriel havia inaugurado uma exposição de Lucia Laguna. Agora, é possível conferir as obras da artista carioca por meio de uma visita virtual disponível no site da galeria, onde há também um vídeo em que ela conversa com o curador Victor Gorgulho.

Multimídia

Já a Luciana Brito Galeria acaba de lançar em seu site uma plataforma dedicada à videoarte. Com o nome LB/Festival de Vídeo Online, a iniciativa contará com um novo trabalho a cada semana. Já é possível assistir, por exemplo, ao vídeo Corda, produzido pelo artista mineiro Pablo Lobato.

Reflexões sobre o futuro do mercado da arte também pautam algumas dessas iniciativas online. Desde o início da pandemia, a Aura tem promovido uma série de cursos online, em que são debatidos temas como o colecionismo e a arte-educação. Além disso, a galeria levou para o meio virtual o encontro Happy Aura, em que diferentes agentes do campo das artes têm discutido, em clima descontraído, o contexto atual. Gratuito, o evento ocorre todas as sextas-feiras, às 18h, pela plataforma Zoom.

Na última semana, a Associação Brasileira de Arte Contemporânea (ABACT) ainda lançou o podcast Arte Contemporânea: da casca ao caroço, com episódios quinzenais, disponíveis nas plataformas Spotify, Apple Podcasts e Google Podcasts. O primeiro deles reúne a artista Mariana Palma e a diretora da galeria Casa Triângulo, Camila Siqueira, em uma conversa sobre como a indústria de arte contemporânea tem se reinventado no ambiente digital e sobre a importância da arte em momentos difíceis – como o atual.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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