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José Mojica

Prefeitura de Americana abriu processo contra Zé do Caixão

Invasão de cemitério ocorrida em março de 1975 é um dos vários fatos folclóricos na vida do cineasta falecido na quarta-feira, aos 83 anos

Por Luciano Assis

21 de fevereiro de 2020, às 08h04 • Última atualização em 27 de abril de 2020, às 11h14

Na madrugada do dia 22 de março de 1975, o padre João Rodrigues, em Americana, foi acordado por moradores indignados. A reclamação era que um grupo de atores estava gravando cenas de nudez no Cemitério da Saudade. O caso, que acabou na delegacia e num processo por invasão de propriedade, é uma das muitas histórias folclóricas do cineasta José Mojica Marins, o popular Zé do Caixão, falecido na noite da última quarta-feira, aos 83 anos de idade.

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Na verdade, neste primeiro momento, Mojica não estava presente no cemitério. Quem fazia as filmagens era uma trupe de cem alunos de seu curso de atuação, em São Paulo. “Era uma espécie de ‘prova final’”, resume os jornalistas André Barcinski e Ivan Finotti no livro “Maldito – A Vida e o Cinema de José Mojica Marins” (Editora 34), que resgatou essa história em 1998.

Foto: Reprodução
Cena de ‘Exorcismo Negro’, filme que estava sendo lançado na época

O filme, registrado em Super-8, se chamava “Materialização” e causou alvoroço nas redondezas do bairro São Manoel. Vários curiosos subiram no muro do cemitério para observar a produção, que misturava ação e erotismo. Revoltados, alguns membros da comunidade católica correram até a casa paroquial chamar o padre.

“Havia mais ou menos dez moças, quase sem roupas, umas com véus transparentes”, contou o padre Rodrigues, na edição do jornal O Liberal do dia 25 de março.

Foi o próprio padre que organizou os presentes para atacarem os artistas, alegando desrespeito aos mortos.

“A multidão não resistiu ao apelo e invadiu o cemitério, botando os atores para correr. Os cristãos de Americana destruíram todo o equipamento e surraram uma dúzia de alunos, que correram para se abrigar na casa do zelador do cemitério. A massa enfurecida começou a apedrejar o prédio e tentou arrombar a porta. A polícia chegou poucos minutos depois e evitou o linchamento”, descreve a biografia, que ouviu alguns dos atores que participaram do episódio.

Desculpas e processo

O caso bizarro rendeu publicidade para Mojica em todo o Brasil. Após um período difícil, o diretor de clássicos como “À Meia Noite Levarei Sua Alma” (1964) e “Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver” (1966) estava voltando à cena com um novo e elogiado filme, “Exorcismo Negro” (1974).

No dia do quase linchamento, ele estava em Belo Horizonte lançando o filme, mas a estreia no circuito comercial do interior de São Paulo, em abril daquele mesmo ano, fez com que o cineasta viesse pessoalmente até Americana pedir desculpas pelo episódio.

Em entrevista ao LIBERAL na edição do dia 19 de abril, com o título “Zé do Caixão agradece ao povo americanense”, o diretor afirmava que havia repreendido os atores pela filmagem sem autorização e que pretendia voltar a Americana para tomadas de um novo filme. Falou ainda que lançaria “Materialização” nos cinemas com os 25 minutos de cenas gravadas no município.

A diplomacia do pai do terror nacional de nada adiantou. A prefeitura abriu um processo contra o diretor por invasão de propriedade, a pedido do padre Rodrigues – o documento foi arquivado no ano seguinte – e as cenas aqui feitas nunca viram a luz do dia.

Além da Capa, o podcast do LIBERAL

A mobilização em Americana e Santa Bárbara em torno do Carnaval, a festa mais popular do País, é o assunto dessa edição do podcast “Além da Capa”. Ouça:

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