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Cinema

Cineclube Estação celebra 15 anos de existência

Projeto manteve como principal marca a divisão de experiências por meio da sétima arte; apesar de dificuldades atuais, membros estão cheios de planos

Por Rodrigo Pereira

09 de agosto de 2019, às 08h11 • Última atualização em 27 de abril de 2020, às 11h15

Trata-se de um roteiro com inúmeros capítulos, com cenas rodadas em diversas localidades de Americana, do Centro à periferia, falando sobre diferentes gerações, sobre a causa feminista, LGBT, racial, sobre a reforma agrária. Um roteiro que envolve o falecimento de importantes personagens, sorrisos, frustrações e um ponto-chave: união das pessoas por meio de experiências pessoais.

Mas não é um roteiro de um filme, e sim da vida real. É a trajetória da ONG (Organização Não Governamental) Cineclube Wagner de Oliveira, responsável pelo projeto Cineclube Estação, de Americana, que nesta sexta-feira completa exatos 15 anos de existência.

Foto: Marcelo Rocha / O Liberal
História do projeto é marcada pelo amor ao cinema não comercial e as perdas de dois de seus fundadores

A história, no entanto, começa antes, em 2000, e em Recife. Foi lá, em um congresso da UNE (União Nacional dos Estudantes), que o fundador Eduardo Minatel participou de uma oficina sobre como montar um cineclube que o fascinou. Enquanto se organizava para oficializar seu projeto, exatamente em 31 de agosto de 2001, Americana perdia o Cine Cacique, seu último cinema de rua.

Eduardo se aliou a um grupo de interessados por cinema e recebeu a ajuda de Paulo Cesar dos Santos, coordenador do MAC (Museu de Arte Contemporânea) para iniciar as atividades.

“A gente começou onde é a biblioteca hoje. Funcionava o MAC lá. A sessão de inauguração foi ‘Terra em Transe’ (1967), de Glauber Rocha. Teve 130 pessoas e foi muito bacana. Superou as expectativas e a gente fez a sessão para fazer a ata de criação do cineclube”, conta Eduardo. À época, devido às lotações das sessões era preciso fazer uma segunda exibição na sequência para contemplar todo o público na “fila de espera”.

Mudança de hábito

Cenário bem diferente dos dias atuais, segundo Márcio Zagallo, o responsável pela reativação do cineclube, em sua “segunda fase”, após um período de inatividade de dois anos, no final dos anos 2000.

“Convidei um amigo meu chamado Bruno Nunes, ele aceitou a ideia e a gente foi formando a equipe […] Sempre tinha público, mas ultimamente, por mudanças de hábitos culturais, são menos pessoas que frequentam”, compara.

Nesse ponto, ele e outros membros ressaltam o papel preponderante deste tipo de projeto, que é o de reunir pessoas pela divisão das experiências e não apenas para ver um filme fora do circuito comercial, algo que já é proporcionado por serviços de streaming.

“Acho que as pessoas que curtem ir ao cineclube não vão mais pela necessidade de se informar e sim para se encontrar, compartilhar ideias, culturas e fazer novas amizades”, avalia Bruno Nunes.

Atual presidente da ONG, Luan Augusto detalha a pluralidade das discussões pós-exibições. “Sempre teve alguns temas pouco mais sensíveis, a gente já falou sobre suicídio, feminicídio, LGBT, a questão dos negros, todas as minorias”.

Descentralização

Chegando nesta sexta-feira aos 15 anos de existência, o Cineclube Estação, desenvolvido pela ONG (Organização Não Governamental) Cineclube Wagner de Oliveira, tem um histórico voltado à descentralização das exibições. Chegou a levar sessões a bairros e a um espaço ocupado pelo MST (Movimento Sem Terra) e realizou parcerias com grupos como o Marielle Vive, voltado às causas feministas.

Agora, a intenção é retomar esses tipos de projeto, mas antes disso passa por um processo de reestruturação, no qual procura novos parceiros e regulariza algumas condições burocráticas para que possa participar de editais públicos.

Foto: Arquivo / Cineclube Estação
Sessões do projeto foram realizadas em praças de bairros como Jardim da Paz e Gramado

“Fizemos algumas parcerias com o pessoal do cineclube com intuito de, através de filmes com olhar voltado à problemática da mulher, refletirmos com a comunidade sobre os problemas reais enfrentados por ela e como isso tudo repercute na falta de polícias públicas do município”, conta Rúbia Missioneiro de Lira, integrante do grupo feminista Marielle Vive.

Fundador do cineclube, Eduardo Minatel recorda de um projeto junto com a Suzano, que na época se chamava Ripasa, por meio do qual realizaram várias sessões nas periferias. “Quando a gente passava cinema no Mathiensen, na Cidade Jardim, ou no Parque Gramado, você via crianças que nunca tinham visto uma tela de cinema e isso marcou bastante”, conta.

Atual presidente da ONG, Luan Augusto observa que o cinema comercial de hoje não é acessível a todos os grupos sociais. Isso, acrescentado ao fato de Americana não contar mais com salas comerciais de exibição.

“Hoje não dá para você chegar numa família com uma renda baixa e exigir que essa pessoa possa ter esse tipo de entretenimento. A gente queria chegar a todos os lugares da cidade, porque a gente acredita que alimentar-se da cultura é essencial pra vida do ser humano”, afirma.

Regularização

Atualmente, o cineclube realiza rifa de cestas culturais para arrecadar R$ 400 e dar andamento a projetos.

“Com esse dinheiro que entrar vamos colocar a documentação em dia do cineclube. Burocraticamente nós temos que fazer isso para buscar parcerias com a prefeitura e participar de editais”, explica o cineclubista Márcio Zagallo. O Cineclube Estação realiza exibições no MAC (Museu de Arte Contemporânea).

Cenas e acontecimentos marcantes:

Homenagem: Quem dá nome à ONG é Wagner de Oliveira, que estudou Rádio e TV na Unimep e começou a ideia do cineclube com Eduardo Minatel. Ele faleceu após contrair uma doença grave em uma transfusão de sangue.

Sucesso: Outro fundador do cineclube, André Ortega se tornou um VJ de sucesso no Brasil e chegou inclusive a participar do clipe da música “Will I See You”, da cantora Anitta. Ele faleceu aos 34 anos, em 2017.

Pipoca: Uma frequentadora que chorava toda vez que um filme antigo era exibido, porque se lembrava da infância, foi quem começou com a ideia de distribuir pipoca gratuita nas sessões. A ONG acabou adotando a ideia ao longo do tempo.

Zé do Caixão: Um dos fatos mais marcantes para o cineclubista Márcio Zagallo foi a tentativa de trazer o cineasta José Mojica Marins, o Zé do Caixão, para uma exibição do seu último filme. No entanto, não foi possível reunir a verba para pagar seu cachê, mas conseguiram trazer sua filha, Liz Vamp.

Documentário: Em outubro de 2017, a ONG lançou o documentário “Cineclube Estação: 13 Anos de Cineclubismo”, que mostra as três gerações do projeto. O filme foi financiado pelo Fundo Municipal de Assistência à Cultura e pode ser visto no Youtube.

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