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Cinema

Ator e diretor de ‘Simonal’ defendem a atualidade do longa

Por Agência Estado

08 de agosto de 2019, às 07h30 • Última atualização em 27 de abril de 2020, às 11h15

Mais do que swing, ele tinha swagger. O balanço era inerente à figura de Wilson Simonal, à sua postura perante o público. O swagger era algo mais – arrogância, essa certeza, nascida da autoestima, de que era o melhor, o mais gostoso. Fabrício Boliveira não se parece nem um pouco com Simonal, mas, com treino, adquiriu seu balanço, aprendeu a dublá-lo com perfeição nas canções. Já o swagger é coisa dele. Numa temporada nos EUA, era o que as pessoas lhe diziam. O swing atrai o público, o swagger faz inimigos. Simonal fez muitos, em sua vida e carreira.

Numa cena fictícia de Simonal – que estreia nesta quinta nos cinemas, quase um ano depois de passar no Festival de Gramado -, o protagonista, Boliveira, conversa com Elis Regina, interpretada por Lilian Menezes. Ele está sob suspeita no meio artístico, acusado de ligação com o porão da ditadura. Elis foi forçada a cantar na Olimpíada do Exército. Ela diz que isso vai passar, ele retruca, amargo: “Você se esquece de que sou negro.” Um negro muito bem-sucedido, que chegou ao topo e trabalhou, trabalhou para ter fon-fon. Nada que não possa ser destruído. Para Boliveira, é um caso claro de racismo.

“No livro dele de memórias, Ronaldo Bôscoli dedica um capítulo a Simonal e diz que foi o maior caso de racismo da MPB. Ele (Simonal) podia ser arrogante, e isso incomodava as pessoas. Pisou em falso no episódio do contador, mas foi vítima do que hoje claramente se chama de fake news. Daí a importância do filme, que ultrapassa o resgate do grande artista. Racismo, fake news. O filme chega para promover um debate necessário.”

Em entrevista, o diretor conta por que quis contar a história, e explica sua opção pelos chamados planos-sequência. Como montador de Nise – No Coração da Loucura, de Roberto Berliner, Leonardo Domingues viu o material bruto que lhe mostrou todo o extraordinário potencial de Boliveira como ator. “A ideia nunca foi julgar. Nem herói nem traidor, apenas humano. A vida de Simonal foi exemplar como tragédia brasileira, na ascensão e na queda, e Boliveira sacou isso. Tivemos momentos de briga, de tensão, mas tiro meu chapéu, porque ele foi fundo.”

Sua adesão ao personagem foi total, idem a de Isis Valverde, que faz a mulher do artista, Tereza. Isis e Boliveira já estiveram juntos no vigoroso Faroeste Caboclo, de René Sampaio. Estarão de novo na próxima novela das 8 – ela, como protagonista, como uma enfermeira; ele, numa participação especial. Isis jogou-se com intensidade nessa Teresa apaixonada que vê o amado amante ser destruído, e autodestruir-se.

“Ela era bipolar e, naquela época, ninguém sabia. Seu temperamento oscilava. Fui entrando na personagem de forma intuitiva, mostrando reações que não parecem consistentes, mas fazem sentido. Um dia, do nada, me deu uma dor de cabeça terrível no set. Max (filho de Wilson e Tereza) cantou a bola – ‘Mamãe tinha enxaqueca, sofria muito.’ Não sabia, mas, tentando captar a complexidade dessa mulher, emulei até isso.”

Como dramatização de um personagem controverso – Simonal foi acusado de dedo-duro; seria informante da ditadura no meio artístico e a carreira ruiu por isso -, o filme pode e deve reabrir discussões. A controvérsia acompanhou o artista e o filme abre-se com um elaborado plano-sequência, na frustrada tentativa de reerguimento de Simonal com um show que não estourou. Segue-se o relato em flash-back, que tem sempre a dimensão de uma exumação.

Estreante, o diretor Leonardo Domingues dificilmente conseguirá unanimidade com sua abordagem, mas o filme já nasceu clássico, na forma, por duas ou três cenas antológicas e excepcionais. Você é capaz de jurar que Boliveira canta. Ele tem o swing, o swagger.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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