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Histórias do Coração

Marília e Renato

Entre o sempre e o nunca existem os encontros, ainda que rápidos, ainda que esporádicos

Por Carla Moro

04 de julho de 2021, às 11h05

Eu sempre gostei de contar histórias, embora nunca tenha sido boa em inventá-las. O real sempre me interessou mais, bem como estas palavras grandes: nunca e sempre. O amor tem a tendência de trazer ao nosso vocabulário essas palavras que custam muito quando são ditas.

“Sempre” é uma palavra que costuma aparecer no início de uma história de amor: “eu sempre vou estar com você” ou, aos mais otimistas, “eu sempre vou te amar”. “Sempre” é uma palavra em que cabe o futuro. E quando o amor começa, o futuro é o único tempo possível.

Já “nunca” pode ser a sentença do fim: “nunca mais me procure” ou, aos mais pessimistas, “eu nunca mais quero te ver”. Embora o amor, mesmo no fim, não tenha um caminho muito certo e possa ir e vir muitas vezes, a palavra “nunca” aparece como uma placa de aviso. “Nunca” também é da ordem do futuro, mas um futuro sozinho. A história do coração deste domingo é escrita sob a sentença do fim.

Quando a Marília e o Renato se encontraram pela primeira vez, era sábado e fazia apenas um mês que a moça tinha se mudado de volta para Americana. Renato, ao contrário, nunca havia saído daqui. Para quem tem o desejo de ficar, ir embora pode ser o maior de todos os medos.

Conheciam-se desde a adolescência, moravam na mesma rua e frequentavam o mesmo grupo de jovens da igreja. A Marília nunca foi religiosa, mas o Renato tinha um terço e a Ave Maria tatuados no peito. Aquele sábado seria o começo de uma história que nunca aconteceu, embora o amor já estivesse presente quando ela fez o café, forte como ele gostava, no domingo de manhã. Muitas histórias de amor começam no fim das noites para, enfim, terminarem no início das manhãs.

Enquanto escolhiam o filme, ele repetia o nome completo dela, como se precisasse afirmar para si mesmo que estavam ali, juntos. Na terceira ou quarta vez, incluiu o próprio sobrenome dele ao dela. Combinavam. Tinham o mesmo sonho de se casar na igrejinha de Carioba. Ela assustou-se, mudou de assunto, escolheu o filme, que eles não viram.

No meio da semana, o Renato apareceu aflito: queria saber se a Marília ia ficar para sempre aqui. O aqui de onde ele nunca quis sair. Aquela história que estava começando podia mesmo começar? E se ela fosse embora dali uns meses? Para o Renato, o futuro era o único tempo possível. Ele queria respostas que a Marília não podia dar.

Então, ele foi embora. Mas o amor, mesmo no fim, pode ainda ir e vir muitas vezes. Um fim repetido nos meses que se seguiram após aquele sábado em que ninguém viu o filme que demoraram tanto para escolher. O Renato, embora já estivesse namorando outra pessoa, voltava. A Marília me diz que achava que ele apenas queria se certificar de que ela ainda estava aqui, de que sempre estaria aqui. E ela abria a porta e recebia o Renato. Os sobrenomes combinavam, ela me diz. E a Igreja de Carioba era logo ali. Sempre estaria ali.

Entre o sempre e o nunca existem os encontros, ainda que rápidos, ainda que esporádicos. A Marília me conta essa história enquanto faz as malas. O Renato acabou de ligar: “está em casa?”. Agora, ela está, mas só agora.

Carla Moro

Formada em Letras pela Unesp, Carla Moro faz neste blog um registro da trajetória dos casais! Quer sugerir sua história para a coluna? Envie um e-mail para colunahistoriasdocoracao@gmail.com