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Histórias de Americana

Entre vozes e papeis amarelados

Por Gabriela Simonetti Trevisan

10 de julho de 2021, às 08h44 • Última atualização em 10 de julho de 2021, às 08h45

Os documentos nos seus mais diversos suportes – oral, iconográfico, escrito etc. – compõem a trama no qual se enredam os historiadores com o objetivo de costurar uma narrativa sobre os fatos passados a partir de olhares que passam longe da neutralidade.

Em Americana, a fonte oral tem um destaque profundo nas publicações patrocinadas pelos órgãos públicos. Isso significa que boa parte da narrativa produzida sobre o passado americanense se confirma a partir de relatos, memórias e testemunhos de alguns cidadãos, quase sempre escolhidos por algum tipo de inserção política local.

Isso mostra uma espécie de inversão na forma de construir a história de Americana: ao contrário do que geralmente ocorre com a história dita nacional, que exclui a oralidade em primazia da fonte escrita, podemos notar que o relato oral teve um maior destaque na composição do corpo de documentações dos trabalhos historiográficos do município.

Ainda que seja um tipo de fonte histórica de fundamental importância e riqueza, é perceptível a dificuldade desses trabalhos de articulá-la com documentos de outros tipos, como os cartoriais ou jurídicos.

Assim, muitas vezes, observamos um tratamento pouco metodológico sobre esses relatos orais, interpretando-os como “reflexo do real”.

Dessa forma, vale reforçar a importância de uma recuperação das fontes escritas que podem compor uma complexa costura entre a oralidade e a documentação dita oficial. Documentos como o Registro de Terras da Província de São Paulo ou os inventários do Tribunal de Justiça da Comarca de Campinas são alguns exemplos.

No primeiro caso, falamos de uma descrição detalhada das fazendas nas diversas regiões brasileiras, o qual é decorrente da Lei de Terras, de 1850 (aprovada quase em conjunto com a Lei Eusébio de Queirós, não coincidentemente: visava-se garantir a propriedade dos brancos às terras e inviabilizar ao máximo seu acesso à população negra).

Já no segundo, encontramos extensas inventarianças, nas quais há uma variedade de informações populacionais, sociais, culturais e políticas da região.

Ambos, ainda que produzidos pela elite local, podem ser “escovados a contrapelo”, como sugere Walter Benjamin, para repensarmos algumas narrativas consolidadas que criaram espaços de verdade sobre pilares de areia.

Claro que não se pode confiar a esses papeis amarelados um status de prestígio sobre o relato oral, senão estaríamos sepultando a importante crítica ao positivismo, consolidada há décadas. Mas é preciso olhar para a história de Americana com rigor e metodologia: que passados construímos sem a confrontação de olhares?

Gabriela Simonetti Trevisan
Membro do grupo Historiadores Independentes de Carioba, dedicado à pesquisa histórica sobre Americana

Historiadores de Carioba

Blog abastecido pelo grupo Historiadores Independentes de Carioba, que se dedica à pesquisa histórica sobre Americana.