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Alessandra Olivato

De narrativas e verdades

Verificar a qualidade, a validade e o reconhecimento das fontes das informações nos ajuda a ter maior assertividade sobre todas as coisas

Por Alessandra Olivato

19 de janeiro de 2022, às 07h52

Há assuntos e temas que insistem em permanecer conosco por um tempo. Grandes questões da humanidade como “de onde viemos”, “para onde vamos”, qual o sentido da vida, há vida após a morte sem dúvida roubam a cena entre todas elas. Mas se nos ativermos a questões persistentes mais recentes, sem dúvida alguma as dúvidas sobre a vacina da Covid-19 se destaca a ponto de nos colocar em dúvida se se discute tanto por isso por ser algo muito polêmico e intrigante ou pelo simples prazer de discordarmos e também brigarmos. Eu não sei responder.

Uma ideia que nos ajuda a ter maior assertividade sobre todas as coisas, incluindo a vacina, é verificar a qualidade, a validade e o reconhecimento das fontes das informações. Por mais que alguns discordem tendo o direito de discordar, fato é que se reconhece mundialmente que o que é dito e escrito por cientistas e profissionais idôneos assim como o que é divulgado em meios de comunicação ditos oficiais tende a estar mais próximo da “verdade” do que o que é dito ou escrito em por qualquer pessoa ou profissional e divulgado em fontes de informação não oficiais, digamos, como páginas pessoais na internet, em blogs de grupos com diferentes ideologias, em meios populares de comunicação como WhatsApp etc. Não que esses meios de comunicação e informação e não que as opiniões de pessoas e quaisquer profissionais não sejam legítimas, ou seja, não tenham o direito de serem ditas e pensadas. Mas quando tratamos de assuntos sobre os quais queremos saber o que de fato está acontecendo ou, pelo menos, retrate mais de perto o que de fato acontece, meios oficiais de informação e profissionais reconhecidos como porta-vozes de sua área de conhecimento têm maior validade pelo simples fato de que eles têm que seguir leis, estatutos, regras que, se infringirem, podem lhes acarretar prejuízos em suas carreiras.

Agora, como nem tudo é simples, nem esses estão livres de dizer algo que não seja verdadeiro porque, afinal e como eu já disse em outras ocasiões, praticamente tudo o que pensamos e dizemos passa por filtros que adquirimos ao longo de nossas vidas, visões – parciais – de mundo que construímos o que incluí até mesmo profissionais tidos pela maioria como detentores de maiores verdades sobre as coisas como médicos. Ora, médicos, advogados, cientistas, jornalistas, todos têm visões parciais de mundo também e lidam ainda com interesses corporativos de suas associações e grupos. Mas, ainda assim, são grupos de pessoas que têm no geral que prestar constas do que afirmam, ao contrário das pessoas no dia-a-dia que podem tecer suas análises sem maior cuidado ou preocupados com consequências.

Nesse sentido, é muito importante termos assertividade sobre o que pode ser falso ou verdadeiro sobre algo, incorreto ou correto. Porque a “verdade” sobre as coisas incluem outras possibilidade além do que ser detentor de conhecimento sobre o que está certo ou o que está errado, por exemplo, no caso da vacina. Entre os falsos e errados, portanto, há os que são honestos no que dizem mas têm maior conhecimento como têm os honestos mas com conhecimento limitado e ideias equivocadas; além desses, há os que mentem voluntariamente apenas por prazer ou por algum outro motivo ou interesse sobre o que não vale polemizar agora.  Ou seja, há os honestos que dizem coisas competentes e os honestos que infelizmente dizem coisas equivocadas, e já ainda os que simplesmente não são honestos e criam falácias a bel prazer.

Agora, independente de tudo isso e independente de quase tudo na vida humana existir apenas a partir do significado que damos, o fato é que existem verdades que independem de nossas opiniões, como sobre a vacina: se ela tem uma certa eficácia ou não, e ela tem efeitos colaterais ou não, se ela vai possibilitar acabar com a pandemia ou não etc. De qualquer forma, é importante perceber que no momento em que chegamos, após quase dois anos desde que tudo começou, mesmo os profissionais mais competentes têm algumas dúvidas. E isso é absolutamente normal porque a margem de erro de uma afirmação científica diminui à medida da quantidade de casos analisados, da quantidade de repetições observadas, na possibilidade de se ver algum padrão de efeito e comportamento etc. Dito de outro modo, a validade científica de uma afirmação leva tempo – quanto mais tempo, mais provável de estar mais próxima à verdade dos fatos.

Sempre achei absolutamente hilário quando alguém acredita em informações totalmente recentes sobre algo que acabou de surgir: “o sal do himalaia diminui em x% a chance de ter tal doença”, sendo que o sal do himalaia ou seja lá de onde for acabou de ser lançado no mercado. Além de qualquer afirmação apressada ter uma grande probabilidade de estar equivocada, fazer uma afirmação científica envolve conhecer tantos fatores e tantas variáveis, que por vezes nem dezenas de anos nos faz ter certeza sobre algo.

Isso tudo apenas pra concluir mais uma vez o quanto é absolutamente inócuo brigar porque um ser a favor da vacina e o outro contra, porque nenhuma das opiniões vai mudar a eficácia real da vacina. E porque vivemos em um mundo democrático em que, sim, é importante buscar a “verdade” porque muitas decisões políticas assertivas dependem disso, mas entre nós, acho que nos faria menos mal apenas aceitar a dura realidade de que cada um pensa como quer, por mais certeza que tenhamos de estarmos certos.

Alessandra Olivato

Mestre em Sociologia, Alessandra Olivato aborda filosofias do cotidiano a partir de temas como política, gênero, espiritualidade, eventos da cidade e do País.