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AMERICANA, 145 ANOS

Populares: cinco conhecidos personagens de Americana

Sapataria, restaurante e sorveteria que todo mundo ouviu falar, política, cultura e educação: confira as histórias

Por Isabella Holouka

27 de agosto de 2020, às 08h50 • Última atualização em 09 de dezembro de 2020, às 16h55

A história de Americana está intimamente ligada às trajetórias de cidadãos, americanenses ou não, que na cidade se dedicaram as suas famílias, à comunidade e aos negócios – muitos deles com capacidade de deixar marcas positivas na memória afetiva do município.

O que torna estas pessoas populares de Americana é o reconhecimento público pela dedicação ao longo do tempo, além do fato de que elas acabam por se tornarem notáveis referências em informações e causos ocorridos na cidade, que se desenvolveu e mudou nas últimas décadas.

Embora sejam incontáveis as mulheres e homens que poderiam ser apontados como figuras populares na cultura americanense, em um esforço para afirmar a importância destas pessoas e de suas contribuições para a cidade, o LIBERAL separou algumas histórias.

Alemão 1 e 2

Por trás da fachada simples do número 199 da Rua Carioba, dois irmãos vivem uma trajetória de resistência e dedicação a um ofício.

Olivir e Euclides Bonaldo, de 78 e 72 anos, se dedicam ao conserto de sapatos há mais de 60 anos, e contam ter acompanhado, por detrás do mesmo balcão da Sapataria do Alemão, o crescimento de Americana.

Eles tiveram contato com a profissão ainda na infância. “Com 8 ou 9 anos já fui aprendendo, meio dia na escola e meio dia como sapateiro. Meu irmão começou e eu segui o caminho dele”, conta Euclides, mais extrovertido que o irmão mais velho.

Olivir e Euclides, ou Alemão 1 e 2, donos de uma das sapatarias mais antigas e tradicionais de Americana – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

“Estamos aqui desde a época em que não existia a SP-304. Então, você passava pela Rua Carioba e subia a Washington Luiz para ir para Piracicaba. Tudo era aqui. Naquela época quase não tinha comércio, era tudo residencial. Praticamente vimos o centro se expandir”, lembra Euclides.

Tanta modernização ao redor acaba refletindo também no trabalho da sapataria. “Os sapatos vem mudando, então todos os dias estamos aprendendo com eles”, conta o sapateiro, se voltando para a parede repleta de fotografias em tons de sépia.

“Tudo de Carioba e de Americana. Avenida Antônio Lobo, banda de Carioba, grupo e time de Carioba, Rua Carioba e a enchente aqui também, acho que foi nos anos 1950”, aponta.

Nesta pandemia a dupla fechou as portas e tirou férias pela primeira vez. Entre clientes fiéis novos e antigos, os sapateiros resistem.

“Tivemos muitos clientes antigos, mas a maioria já foi embora, os filhos continuam vindo, e vem ficando. E nós, por enquanto, vamos sobrevivendo”, afirma Euclides.

“E quem é o Alemão? Este é o Alemão 1 e eu sou o Alemão 2”, ri o sapateiro.

Professora Fanny Olivieri

É impossível contar a quantos estudantes americanenses a professora Fanny Olivieri, de 84 anos, lecionou ao longo dos seus mais de 50 anos de profissão.

“Eu digo para você que em qualquer parte que eu passe, tenho ex-alunos. Eu tenho uma gratidão imensa, porque eu os tenho no meu coração. Tenho alguns ex-alunos em posições de muito destaque no País, mas são muitos, se eu citar não fica bem”, garante a professora, que iniciou a vida profissional no Ginásio Estadual e Escola Normal de Americana, em fevereiro de 1957.

A professora Fanny Olivieri em sua casa – Foto: Arquivo Pessoal

O ginásio foi nomeado posteriormente como Instituto de Educação de Americana, Instituto de Educação Presidente Kennedy e, finalmente, Escola Dr. Heitor Penteado – Fanny esteve presente em todas estas fases.

Ela também atuou na Secretaria de Educação de Santa Bárbara d’Oeste e publicou livros, dentre eles um didático e outros dedicados à história de Americana, sobre a Paróquia Matriz de Santo Antônio de Pádua e a vinda da estátua do santo para a cidade, em 1876.

Atualmente, Fanny se define como “fissurada em leitura, música e poesia”. Ela conta que ainda mora na casa em que nasceu, “uma casa bem antiga, cheia de flores e plantas, porque eu sou também muito consciente do meio ambiente e me preocupo muito com esse problema”, acrescenta.

A professora relata ter vivido um período em que Americana era uma grande referência educacional e comenta com saudades sobre os encontros que organiza desde a década de 1990, os almoços reunindo professores do Instituto de Educação Presidente Kennedy e da Escola Dr. Heitor Penteado.

“É uma coisa de que eu me orgulho, porque eu gosto de gente e sempre amei o meu trabalho. A educação para mim é a mola mestra de uma nação”, afirma.

Trajano (ou Bode)

Aos 80 anos, Trajano Andrietta é conhecido como Bode até hoje. A Sorveteria do Bode, da qual ele foi proprietário no número 215 da Rua Carioba, marcou os numerosos frequentadores com receita familiar e as clássicas taças sundae, colegial, banana split e ula ula.

“Abrimos em 1949, bar e sorveteria. Em 1977, eu fiz bar de um lado e sorveteria do outro. Era cheio de gente e naquela época a gente fazia taças, o que hoje ninguém mais faz. As receitas eram do meu pai”, conta.

As taças eram montadas com sorvete de primeira, com leite de vaca pasteurizado com equipamento próprio, cerejas, coberturas. Dentre os sabores mais pedidos, ele recorda de abacaxi com limão, coco e morango, sempre com fruta de qualidade.

Trajano Andrietta, também conhecido como Bode, dono da Sorveteria do Bode, point da Rua Carioba – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

“Eu tinha 12 mesas e 48 cadeiras, e enchia. Em 40 minutos a gente fazia de 40 a 50 taças. O namorado ia com a namorada, o sogro e a sogra. Os tecelões eram os nossos fregueses. Tinha muita tecelagem naquela rua”, conta ele, que afirma ter enfrentado uma grande baixa no movimento após a abertura do shopping barbarense, na véspera dos anos 2000.

Infelizmente não lhe sobraram fotos dos negócios, apenas histórias. Dentre os acontecimentos marcantes naquelas décadas, Trajano cita a inauguração da ponte da Rua Carioba, em 1951, evento do qual guarda fotos até hoje, e as passagens dos astros da Velha Guarda pela mesma via.

“Com a porteira fechada fazia fila de carro. E nós conversávamos com o Roberto Carlos, com o Erasmo, com a Vanderleia. Eles paravam na fila e a gente ia lá tietar eles”, lembra.

Frequentador da Rua Carioba, Trajano ainda passa por ali todos os dias, não só porque mantém os prédios alugados, mas, segundo ele, também porque sente saudades.

Titio do Bar Garoto

“Tudo o que acontecia na cidade era lá, isso era tradicional, e todo mundo sabia”, afirma João Pértile, de 74 anos, que ficou conhecido como Titio do Bar Garoto, restaurante que ficou marcado na história da Rua Trinta de Julho, onde funcionou por mais de 40 anos.

O número 280 era bar, restaurante, lanchonete, tudo junto e misturado, de acordo com Titio, que “tocou” o negócio com os irmãos até o ano de 2008.

“Quem colocou o nome de Garoto, eu nem conheci, foi João Gobbo. Ele tinha uma barbearia lá naquela época, isso já faz 60 ou 70 anos, fechou e abriu um bar. E tinha uma molecada que estava sempre ali perturbando ele, na Rua Trinta. Então, ele pensou ‘eu vou abrir o bar e por o nome de Garoto, em homenagem à molecada, à esperança’”, conta.

“Abríamos às 8 horas da manhã e íamos até 2 da madrugada. Às vezes, de final de semana, até 7 horas da manhã. Era tudo. A turma da imprensa estava direto lá, do LIBERAL, das rádios, de lojas, de bancos, prefeito, delegado, juiz, famílias, bastante jovens, todo mundo lá conversando. Das escolas, tudo o que era confraternização de final de ano era lá”, recorda o antigo proprietário, que acredita ser difícil hoje em dia um estabelecimento ser tão popular entre públicos tão diferentes.

João Pértile, que comandava os balcões do antigo Bar Garoto – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

“Até hoje, a cada pouco aparecem no Facebook fotos, reportagens, tudo”, acrescenta ele, sobre o saudosismo em torno da história do local.

O apelido de Titio, que vem daquela época, nomeou o negócio atual de João, na Avenida Abdo Najar, onde serve lanches e pizzas. “De Titio, sou bem conhecido. A turma sabe que eu era do Garoto, então ficou Titio do Garoto”, explica.

Divina Bertalia

Mineira por ascendência, goiana de nascimento, matogrossense de criação, paulista por opção e americanense de coração. É assim que Divina Bertalia, aos 64 anos, inicia a apresentação de sua história.

“Meu pai, Josefino Ramos, jornalista, cristão e árduo defensor da democracia em Goiás Velho, antiga capital de Goiás, foi aconselhado a evadir-se rapidamente. Seus fervorosos editoriais pró-democracia, no seu jornal local, incomodavam muito a ditadura militar”, narra Divina, que também se lembra de conhecer, na infância, Cora Coralina.

Em Americana, foram mais de 30 anos de dedicação à docência de disciplinas da área de Direito na ETEC Polivalente de Americana, além de três anos como presidente voluntária do Comcult (Conselho Municipal de Cultura de Americana) e mandato como vereadora.

Professora, ex-vereadora e historiadora de Americana, Divina Bertalia – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

“Eu tenho 32 anos de Americana e uma relação de amor muito grande. Até brincamos que eu sou mais americanense que o meu marido [o médico Aluísio Bertalia], que nasceu em Carioba”, afirmou ao LIBERAL por telefone.

Divina impulsionou o “Guia Cultural e Turístico de Americana” e o projeto “Americana Canta”. Recebeu o título de “Cidadã Americanense” e a medalha de mérito “Princesa Tecelã”, concedidos pela Câmara Municipal de Americana.

“A minha área é a cultural, sempre. A política foi um desvio de percurso”, brinca.

Autora de quatro livros, ela conta que planeja outros quatro, todos sobre a história da cidade.

“Eu tenho muita vontade de ir registrando. Cada escola tem uma história que precisa ser registrada, eu acho muito importante isso ficar para a posteridade. Você tem uma praça e pode escrever um livro sobre ela, e deixar registrado para as pessoas que frequentam. Tem muita coisa na história que a gente pode fazer”, defende.

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