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EXCLUSIVO

Padre Leandro é condenado a 21 anos de prisão por abusos sexuais

Religioso era acusado de abusos sexuais de coroinhas durante passagem por paróquia de Araras; ele ficará em liberdade até recurso; defesa afirma que irá recorrer

Por João Colosalle e Ana Carolina Leal

19 de maio de 2022, às 13h59 • Última atualização em 19 de maio de 2022, às 18h20

O padre Pedro Leandro Ricardo, demitido da igreja em março de 2022 - Foto: Arquivo_O Liberal

A Justiça de Araras condenou o padre Pedro Leandro Ricardo a 21 anos de prisão, em regime fechado, por abusos sexuais. O ex-reitor da Basílica de Santo Antônio de Americana poderá recorrer em liberdade. Ele nega as acusações e fala em perseguição. A defesa dele afirmou que irá recorrer.

A sentença foi dada nesta quinta-feira (19). Padre Leandro, que foi demitido da igreja pelo Papa Francisco em março, era acusado pelo Ministério Público de abusar de quatro coroinhas durante sua passagem pela Paróquia São Francisco de Assis, em Araras, entre 2003 e 2006.

A condenação, entretanto, o considerou culpado de dois dos casos, um deles ocorrido em 2002 e outro relacionado ao período de 2005 a 2006, ambos envolvendo adolescentes.

“Com efeito, as vítimas foram claras ao narrar a dinâmica dos fatos, sendo certo que as quatro vítimas possuíam um ponto em comum: todas provinham de um lar desestruturado, carente e humilde”, diz o juiz Rafael Pavan de Moraes Filgueira, responsável pela sentença.

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“Assim, o réu sabia exatamente dos cenários caóticos vividos pelas vítimas e, aproveitando-se de sua autoridade religiosa, sentia-se livre para agir do modo que quisesse, sabendo que não seria questionado ou enfrentado”, continuou o magistrado.

A Justiça concluiu que Padre Leandro valeu-se de sua “posição sacerdotal, de sua boa reputação à época e da força religiosa, para perpetrar os abusos relatados nos autos”.

À Justiça, Leandro atribuiu denúncias a sentimento de vingança de acusadores. Procurado pelo LIBERAL, o advogado de Leandro, Paulo Henrique de Morares Sarmento, afirmou que a defesa irá recorrer.

“A sentença, guardado o respeito ao magistrado, é carente de fundamentação e não teceu linha acerca das provas produzidas pela defesa, sendo assim desconexa da verdade. Iremos recorrer da mesma com a certeza de sua reforma junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, comprovando a inocência de nosso cliente”, afirmou.

A sentença definiu que o religioso cometeu o crime de violação sexual mediante fraude (art. 214 do Código Penal) por duas vezes, com pena aumentada pelo fato de ter autoridade sobre as vítimas, no contexto da relação padre e coroinhas.

Já quanto à acusação envolvendo outras duas vítimas, o crime que o Ministério Público apontava que Leandro havia cometido foi desqualificado para uma contravenção penal, de menor potencial ofensivo, e acabou tendo a punição extinta.

Vítimas

Em depoimento à Justiça, uma das vítimas relatou que conheceu Leandro na casa paroquial em Araras. Em uma viagem feita junto com o padre, o religioso, ao trocar a marcha do veículo, deslizava a mão para a coxa do adolescente, ato que achava ser sem maldade por parte de Leandro. Na volta desta viagem, porém, o padre fez o mesmo ato e apalpou o pênis da vítima. Em outra ocasião, a vítima também relatou que Leandro pediu para que ela praticasse sexo oral.

Já em relação a outro adolescente, o depoimento afirma que era de costume do padre dar “tapinhas na bunda” e “apalpadas no pênis”, que se tornaram frequentes.

Em determinado dia, durante uma conversa no escritório paroquial, Leandro, segundo o depoimento, afirmou que “nós somos a imagem e semelhança de Deus e que devemos ser afetuosos uns com os
outros”, avançou contra a vítima, a beijou e apalpou-lhe o pênis. O adolesce recuou, mas ouviu do padre que, se contasse a alguém sobre o ocorrido, o irmão da vítima, seminarista, seria prejudicado.

Leandro sempre negou as denúncias. Em depoimento à polícia, disse que contrariou interesses econômicos de pessoas ligadas à Igreja e, por isso, foi alvo de uma campanha de difamação contra ele.

Repercussão nacional

As acusações contra Leandro repercutiram nacionalmente a partir de setembro de 2018, quando um dossiê relatando abusos foi enviado para o gabinete da deputada estadual Leci Brandão (PC do B), que o encaminhou ao Ministério Público. Com isso, o caso passou a ser investigado pela Polícia Civil.

Ao LIBERAL, um dos autores do dossiê, o produtor audiovisual José Eduardo Milani, afirmou que agiu por indignação. Ele, que se disse perseguido por Leandro durante as obras de restauração da Basílica, contou, na época, que teve medo de morrer. A entrevista, de julho de 2019, pode ser relida aqui.

Nesta quinta-feira, após a condenação, Milani afirmou que a sentença significa “justiça” para ele. “Se a pena será cumprida é outra história. Mas é um verdadeiro grito de justiça, depois de ouvirmos tantas vítimas e testemunhas e seus relatos”, comentou.

“Creio que essa sentença, além do sentimento de justiça, traz para todos nós que nos envolvemos nesse caso um alívio, depois de tantos anos de luta. Eu não estou simplesmente comemorando essa sentença, minha vida ficou de cabeça para baixo várias vezes durante esses anos por conta desse caso. Estou na verdade respirando mais aliviado, mas comemorar no sentido literal do termo, não”, afirmou Milani.

Sentença esperada

Gustavo Paiva, um dos advogados que representam as vítimas, comemorou a sentença. “Foi o que a gente esperava. A defesa, além de enfrentar a condição de apoio às vítimas, enfrentou um processo dificílimo, foram anos de humilhação da igreja, do padre que tinha prestígio na comunidade e, que muitas vezes, foi defendido por ela”, afirmou.

De acordo com ele, as vítimas estão com senso de justiça alimentado porque a dor dificilmente será sanada.

“Eles vão levar isso para o resto da vida. Essa sentença tem um tom anestésico até o presente momento”, disse Paiva, que contou com a colaboração dos também advogados Roberto Tardelli, Thalita Camargo e Aline Giacon para convencer o Ministério Público a levar o caso adiante.

Apesar de caber recurso, o advogado disse que todos estão confiantes de que os tribunais superiores vão homologar a sentença aplicada pelo juiz.

Demissão e perseguição

Em março, após ser demitido da igreja pelo Papa Francisco, Leandro quebrou o silêncio e passou a falar com a imprensa. Em entrevista ao LIBERAL e à Rádio Clube AM 580, ele afirmou que era vítima de perseguição, e citou ter sido absolvido em processo canônico.

Leandro afirmou ter se surpreendido com a demissão. “Não tive a possibilidade de defesa. Porque qual seria o passo seguinte? Seriam ouvidas as minhas testemunhas de defesa a respeito desse único denunciante”, declarou.

O padre demitido ainda acusou a diocese de tê-lo perseguido por conta de denúncias que ele fez. “No momento exato vou expor à sociedade todas as denúncias documentais que eu tenho aqui em mãos, e por isso estou enfrentando uma perseguição da Diocese de Limeira, porque eu expus todas essas denúncias ao Vaticano”, comentou.

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