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Kit corona

Ivermectina gera corrida à farmácia e desabastecimento do remédio

Apesar de não haver comprovações científicas de sua eficácia, antiparasitório é tratado como “garantia”

Por Leonardo Oliveira

09 de agosto de 2020, às 14h32 • Última atualização em 11 de agosto de 2020, às 17h11

A busca pela “cura mágica” do novo coronavírus (Covid-19) levou as farmácias de Americana a registrarem um aumento expressivo nas vendas de remédios sem eficácia comprovada contra a doença. A ivermectina chegou a ter um volume de vendas até 1000% maior durante a pandemia.

A avaliação é feita por funcionários de cinco grandes redes do ramo farmacêutico instaladas em Americana. Ao LIBERAL, há relatos de pessoas comprando caixas do medicamento para estocar em casa, clientes furiosos por não conseguir a medicação sem a receita e desabastecimento pelo crescimento na demanda.

Ivermectina é o item mais requisitado, mas há outros na relação “anticorona” – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

Isso acontece pela facilidade na compra do medicamento. Até o mês passado não era preciso ter uma receita para adquiri-lo. Como houve uma procura desenfreada pela ivermectina, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) obrigou a prescrição médica para venda – a resolução passou a valer no dia 23 de julho.

“Mais de 1000% [o aumento nas vendas]. Tanto que a gente recebia a Ivermectina com limite, era fracionado. Eu queria mil caixas, o distribuidor mandava 100”, afirma ao LIBERAL o proprietário da Rede Droga Pires, Gustavo Pires.

A gerente de outra rede do ramo, que pediu para não ser identificada, relata uma situação de “desespero” dos clientes na busca pelo produto. “De cada dez pedidos, oito eram [de ivermectina]. A cada três chamadas no telefone, duas eram atrás do remédio, foi desesperador mesmo”.

A ivermectina é um remédio usado no tratamento contra parasitas, como piolho e sarna. Uma pesquisa australiana chegou a indicar que a droga conseguiu inibir a replicação do novo coronavírus em células isoladas em laboratório – não houve, no entanto, comprovação de que ela funcionasse em seres humanos.

“É importante dizer que quando se faz um teste em laboratório, o resultado encontrado nesse teste pode ser absolutamente diferente do teste realizados em seres humanos. O organismo humano pode reagir completamente diferente”, explica a advogada Mérces da Silva Nunes, especialista em Direito Médico.

Além disso, o medicamento, segundo o professor de microbiologia e imunologia da PUC-Campinas, Thiago Miranda da Silva, pode causar efeitos neurotóxicos, gerando danos no sistema nervoso central. Em junho, a OMS (Organização Mundial da Saúde) publicou uma nota alertando sobre os perigos do uso indiscriminado da droga.

Azitromicina sempre demandou receita médica para compra – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

“Não tem nenhuma fórmula mágica. A comunidade científica deseja que algum medicamento fosse eficaz para combater a Covid-19, mas esses que estão disponíveis não são eficazes, então não adianta ficar tomando”, acrescenta Thiago.

No mesmo período, houve também aumento na busca pela Cloroquina, Hidroxicloroquina, Nitazoxanida e Azitromicina – como são fármacos que sempre demandaram receita médica para compra, o volume de vendas foi bem menor na comparação com a Ivermectina, avaliam os funcionários.

Evidências
O médico Samy Chitayat, de 31 anos, veio do Rio de Janeiro para Americana há cerca de duas semanas para atuar no combate ao coronavírus no Hospital Municipal Dr. Waldemar Tebaldi. E nesse período já teve que lidar com pacientes pedindo a prescrição dos medicamentos sem eficácia comprovada.

“Alguns pacientes já chegam falando que viu no jornal, que viu na internet, e que um conhecido fez uso e melhorou e pede para a gente prescrever, mas a gente não prescreve. Independentemente se o paciente pede ou não, a gente vai prescrever o que a gente acha que é o certo, baseado em estudos científicos de peso”, afirma.

Ivermectina, Nitazoxanida e Azitromicina: remédios que estão sendo procurados nas farmácias – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

Samy também revela que, das drogas inseridas no “kit corona”, somente a Azitromicina é utilizada na rede de saúde de Americana. Não para a Covid-19 em si, mas para tratar casos suspeitos de pneumonia bacteriana associada ao coronavírus.

“Nitazoxanida, Ivermectina e cloroquina não tem benefício, a gente não usa eles em nenhuma situação específica na Covid. A gente usa essas medicações para outras situações clínicas que não tenham nada a ver”, conclui.

Podcast Além da Capa
Depois de três semanas novamente na fase vermelha, Americana e região completaram um ciclo de duas semanas na fase laranja e, na última sexta-feira, avançaram à fase amarela do Plano São Paulo pela primeira vez. Esse episódio dá o tom do contexto local diante da etapa mais flexível vivida até agora desde o início da quarentena provocada pela pandemia do novo coronarívus (Covid-19).

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