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Americana

Com normas mais rígidas, segurança do trabalho melhora em Americana

Acidentes tiveram queda nos últimos anos; especialistas atribuem parte dos números à NR-12, na mira de Bolsonaro

Por Marina Zanaki

14 de julho de 2019, às 08h43 • Última atualização em 14 de julho de 2019, às 17h29

Normas de segurança mais rígidas, ampliação da fiscalização e crise financeira foram os fatores que provocaram queda no número de acidentes de trabalho nos últimos anos em Americana. Levantamento realizado pelo LIBERAL junto ao Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho aponta que, a partir de 2012, o número de notificações de CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) passou a cair em Americana. Até então, a tendência era de aumento ano a ano.

A série histórica começa em 2002 com 1.415 notificações. Os casos foram aumentando até atingirem o pico de 3.205 em 2012. A partir daí a tendência foi de queda, com oscilações em alguns anos. Em 2018, o número chegou a 2.059 acidentes de trabalho na cidade.

Especialistas ouvidos pela reportagem apontaram como um dos fatores para a queda o fato de que normas de segurança mais rígidas para máquinas e equipamentos – a NR (Norma Reguladora) 12 – entrou em vigor em 2012. A partir dela, a comercialização de máquinas precisa estar vinculada à comprovação de que o equipamento possui sistemas de segurança. Antes dessa modificação, a proteção era como um elemento acessório, facultativo ao empresário.

Professor do curso Técnico em Segurança do Trabalho da Etec (Escola Técnica Estadual) Polivalente de Americana, Márcio Marzocchi apontou que a maioria das empresas não adquiria os sistemas de segurança para baratear o custo das máquinas.

O professor criticou a possibilidade de revisão dessa norma, apontada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL). O chefe do Executivo Nacional declarou que deve reduzir em 90% as normas de segurança relacionadas à NR-12. “O governo estuda retirar a validade, porém as normas brasileiras estão sendo adaptadas segundo a tendência mundial em proteção”, apontou o professor.

Uma outra mudança recente e que pode ter ajudado na queda é a fiscalização indireta, que passou a valer em 2014. Por meio dela, o Ministério do Trabalho convoca as empresas a apresentarem documentação dos sistemas de segurança e, caso sejam constatadas irregularidades, são realizadas fiscalizações. Antes, a única ferramenta para fiscalização eram as vistorias no local.

Engenheiro de Segurança do Trabalho e Produção Mecânica, além de membro da AEAA (Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Americana), Valdir Vitor Franciscatto indicou que a mudança possibilitou ampliar a extensão da fiscalização do ministério, melhorando assim os sistemas de segurança e diminuindo os acidentes.

“Eram poucos fiscais para várias cidades, e atendiam só acidentes com óbitos para fazer a vistoria ou se tivesse alguma denúncia de sindicato”, explicou.

Ambos os especialistas concordaram que a diminuição da atividade econômica ligada à crise também teve papel importante na redução de acidentes, já que com menos funcionários nas empresas a exposição a riscos também diminui.

Coletor que já se machucou faz apelo por cuidados com o lixo

Foto: Divulgação
Já furei a mão com um espeto de carne e cortei um pouco em cima do pulso com vidro, deu sete pontos”, relata o coletor Clayton Rodrigues

O trabalho como coletor apresenta vários desafios diários, como lidar diretamente com as mudanças climáticas, a correria para conseguir retirar os sacos e jogá-los no caminhão, além do próprio contato com o lixo. Contudo, algumas atitudes simples podem evitar que esses trabalhadores acabem se acidentando e tornando a profissão ainda mais difícil.

O coletor Clayton Robert Balduino, que trabalha há cinco anos na área, lançou um apelo à população. Vidros, espetos, seringas, galhos, pedaços de madeira e qualquer outro tipo de material que possa perfurar deve ser descartado dentro de garrafas plásticas ou caixas de papelão. Além disso, um bilhete informando que o conteúdo pode perfurar também ajuda e evita acidentes.

“Já furei a mão com um espeto de carne e cortei um pouco em cima do pulso com vidro, deu sete pontos. As pernas o vidro esfrega, corta a calça e as pernas, tenho amigos que se machucam sempre”, lamentou. O coletor atuou por cerca de um ano em Americana e está há quatro em Sumaré. Ele relatou que a população americanense tem o costume de indicar com bilhetes onde há materiais cortantes, mas que em Sumaré tem sofrido com objetos descartados sem o devido cuidado.

LESÕES. O carpinteiro Carlos Anibal de Camargo, de 64 anos, está afastado após sofrer uma lesão há cerca de oito meses. Ele machucou-se ao transportar uma caixa de concreto de mais de 100 quilos.

Recentemente, ele foi liberado pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) para retornar ao trabalho, mas não conseguiu por conta da dor. “Rompeu dois tendões pra cima da clavícula. Não estou em condições de trabalhar, o músculo do braço direito ‘desceu’. Eu estava pegando um peso e a pessoa soltou um lado, deu um tranco”, relatou.

Questionado se entende que o acidente poderia ter sido evitado com alguma medida de segurança, Anibal acredita que foi apenas algo que “aconteceu”. Ele segue agora na expectativa de saber se vai precisar fazer uma cirurgia no braço, e aguarda conseguir o afastamento novamente pelo INSS.

Esta foi a segunda vez que ele se acidenta no exercício da profissão – em 2006, ele amputou o dedo da mão direita em uma serra.

Subnotificações têm aumento de 420% em 2018

O Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho realiza uma estimativa de subnotificações de acidentes de trabalho que resultaram em afastamento previdenciário. De acordo com a plataforma, houve um aumento de 420% nos acidentes não registrados em 2018 em relação ao ano anterior. As subnotificações passaram de 48 para 250.

A subnotificação pode ocorrer para que a empresa evite que o funcionário tenha direito à estabilidade de um ano garantida pelo acidente de trabalho. Além disso, segundo informações do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, quando um funcionário fica afastado por auxílio-doença em vez de acidente de trabalho, a empresa não é obrigada a recolher FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) pelo período correspondente.

De acordo com o sindicalista Cicero Pereira da Silva, isso pode ter ocorrido porque muitos trabalhadores deixaram de procurar o sindicato após a Reforma Trabalhista, que entrou em vigor em novembro de 2017.

“Às vezes o trabalhador não procura o sindicato, principalmente com a legislação nova. Machucou na empresa, mas o patrão fala para dizer que foi em casa que aí não o manda embora. Nisso o trabalhador se afasta como auxílio-doença”, alertou.

O Observatório explica que a estimativa da subnotificação leva em conta que “que muitos registros de acidentes são gerados no momento da concessão do benefício, sem correspondente emissão anterior na forma da lei. Em razão da inexistência de outra métrica para os casos em que não há afastamento do trabalho, esta é, por aproximação, a melhor forma de estimar subnotificações e também nesses casos”.

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