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Liberal Explica

A revolta que levou São Paulo à Revolução

O LIBERAL ouviu historiadores para entender as motivações, desdobramentos e o legado do movimento

Por Isabella Holouka

10 de julho de 2022, às 12h02

Inaugurado em 9 de julho de 1984, na Praça Comendador Müller, um obelisco trabalhado em granito e bronze homenageia jovens vítimas da Revolução - Foto: Junior Guarnieri - Liberal

Noventa anos depois, a Revolução Constitucionalista de 1932, considerada o maior conflito militar no século passado e última guerra civil ocorrida no País, continua a ser celebrada como data magna do Estado de São Paulo. O LIBERAL ouviu historiadores para entender as motivações, desdobramentos e o legado do movimento.

Também chamada de contrarrevolução, a Revolução de 32 foi uma resposta aos desentendimentos iniciados após a Revolução ou Golpe de 1930, que depôs o presidente da República Washington Luís, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes, pôs fim à República Velha e deu início ao chamado “Governo Provisório”, sob o comando do gaúcho Getúlio Vargas.

Propaganda da época incentivou que os paulistas fossem à luta – Foto: Divulgação

Antes com privilégios e poder, através da hegemonia paulista e mineira com a “política do café com leite”, a elite política de São Paulo passou a ter suas demandas ignoradas pelo governo federal e era constantemente alvo de interferências militares. Em oposição à Aliança Liberal (os vitoriosos de 1930), os paulistas exigiam maior autonomia, a nomeação de um governador civil e paulista e a convocação de uma nova Assembleia Constituinte.

“A base do movimento constitucionalista era uma união da oligarquia paulista com as classes médias. A elite paulista tentou diversos acordos com o Governo Vargas, todos mal sucedidos. Após o não atendimento de suas demandas, uniram forças para declarar um conflito armado liderado pela força pública paulista”, explica a historiadora Ana Paula de Souza Freitas. Ela organizou, junto ao Departamento de Cultura e Turismo de Nova Odessa, uma exposição sobre o tema no Paço Municipal.

O plano inicial das forças revolucionárias paulistas era desferir um ataque contra a capital do País (Rio de Janeiro), porém não houve apoio expressivo de outros estados brasileiros, o que resultou no isolamento paulista, com conflitos em diversos pontos do território, detalha Matias Pesce, professor de história no ensino médio do colégio Dom Bosco, em Americana. Segundo ele, a maior parte das batalhas foram concentradas na divisa com Minas Gerais e o Rio de Janeiro, no Vale do Paraíba.

Convocação feita na época – Foto: Divulgação

Estima-se que 100 mil homens foram ao combate, sendo 55 mil das tropas federais, 30 mil das forças policiais dos estados alinhados a Vargas e 30 mil soldados pelo lado paulista. Destes últimos, 10 mil eram voluntários. O saldo de mortes girou em torno de 1 a 2 mil combatentes paulistas, e pelo menos o dobro do lado federal.

Freitas conta que a propaganda de guerra de São Paulo despertou em jovens de todas as classes sociais, inclusive trabalhadores, um sentimento de “patriotismo paulista”, apesar do projeto oligárquico e elitista de manutenção do poder. Entretanto, com civis mal-armados e mal-treinados no front, as chances de vitória eram mínimas.

“Apesar da decepção com o governo e com as forças paulistas pela derrota, a Revolução de 1932 despertou um sentimento de pertencimento fabricado, que perdura até os dias atuais. Perdemos o conflito, mas temos o orgulho de ser parte de São Paulo, da bravura de termos ido a um conflito com números tão reduzidos e poucos armamentos, em uma situação onde era mais simples se submeter”, comenta Freitas.

“Muitas conquistas foram alcançadas com a revolução. Uma delas foi acelerar o processo de elaboração da nova constituição brasileira, que seria promulgada em 1934. Houve certas concessões por parte de Getúlio Vargas, como, por exemplo, a renegociação de dívidas e a nomeação de Armando de Sales Oliveira como interventor de São Paulo, o que permitiu uma ampla reestruturação econômica no estado. É inegável que o evento forçou o governo central a mudar sua postura perante as realidades vividas nos vários estados brasileiros. A política de pacificação, empreendida por Vargas após a Revolução de 1932, é sem dúvida uma dessas mudanças”, acrescenta Pesce.

Para o professor, a reestruturação foi o que permitiu um o intenso desenvolvimento industrial paulista e até a formação da USP (Universidade de São Paulo), uma das mais importantes do Brasil e do mundo.

A região da Villa Americana ganhou destaque pela participação ativa no conflito, aponta Freitas, devido ao envio de cerca de 100 alistamentos – número considerado alto para uma cidade com 5 mil habitantes.

Destes, quatro homens morreram em conflito armado: Jorge Jones, Fernando Camargo, o Capitão Manoel dos Santos Sobrinho e Aristeu Valente (da atual Nova Odessa). Inaugurado em 9 de julho de 1984, na Praça Comendador Müller, um obelisco trabalhado em granito e bronze homenageia os quatro jovens.

“Apesar de poder se classificar como um movimento estruturado pelas oligarquias, classes dominantes e elites, aqueles que se arriscaram, morreram e se feriram no front foram jovens rapazes de famílias trabalhadoras, e suas memórias não podem ser esquecidas”, finaliza Freitas. 

Contexto
Por que ontem, 9 de julho, foi feriado em São Paulo? É assim desde 1997, até com desfile cívico-militar em algumas cidades, por conta da Revolução de 1932. Marcas do episódio estão em endereços nomeados como “23 de maio” (estopim do conflito) ou “9 de julho” (início do levante armado), além de monumentos como o “Obelisco Mausoléu aos Heróis de 32”, mais conhecido como Obelisco do Ibirapuera, em São Paulo, e o Monumento ao Soldado Constitucionalista, na Praça Comendador Müller, em Americana.

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