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FORÇA FEMININA

A força feminina no combate ao novo coronavírus na região

Numa guerra com rosto de mulher, com 70% da força de trabalho composta pelo público feminino, conheça histórias de profissionais que atuam contra a Covid-19 na região

Por Marina Zanaki

07 de março de 2021, às 08h11 • Última atualização em 09 de março de 2021, às 09h36

Conheça a história de cinco mulheres que atuam no combate ao coronavírus na região – Foto: Ernesto Rodrigues e Marcelo Rocha / O Liberal

A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) é uma guerra que tem sido travada pelos profissionais de saúde há pouco mais de um ano. Ao contrário das guerras mundiais, a luta é para salvar vidas. As armas são respiradores, máscaras e a garra desses profissionais.

As trincheiras estão lotadas de mulheres. Dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) apontam que 70% da força de trabalho da área da saúde no mundo é composta por mulheres.

Na Unidade Respiratória do Nova Hortolândia, a estimativa é que 95% dos profissionais na linha de frente da pandemia pertençam ao sexo feminino. O cálculo foi feito pela gestora administrativa e enfermeira responsável técnica da unidade, Renata Julião Correa.

Ela é uma das cinco mulheres retratadas pelo LIBERAL nesse Dia da Mulher, celebrado amanhã, como forma de homenagear as inúmeras profissionais que estão arriscando a vida durante a luta diária contra o coronavírus.

Isolamento e medo do desconhecido

Gestora administrativa e enfermeira responsável técnica da Unidade Respiratória do Nova Hortolândia, Renata Julião Correa enfrentou inúmeros desafios no combate à pandemia.

Renata coordena unidade que se tornou porta de entrada para casos da doença – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

De uma unidade que recebia pacientes diversos daquela região de Hortolândia, o local se transformou em porta de entrada para o coronavírus, doença cerca de mistérios e temores, em que um simples formulário tinha o risco de estar contaminado.

“Me preparei muito para lidar com a morte. Na nossa função sempre lidamos, mas quando um paciente fica na cama, a gente sabe o que ele tem, qual antibiótico, como conduzir perante a medicina, os cuidados. Quando veio a Covid, não sabia nada, supúnhamos que alguns antibióticos podiam ajudar, supúnhamos muitas coisas. Vimos pessoas internando, e em dois, três dias falecendo”, revelou.

A enfermeira aponta o isolamento social como o principal desafio da pandemia. Ela passou meses sem ver os pais por medo de levar até eles a contaminação. Outro aspecto que afetou o psicológico foi ver colegas adoecendo pela doença que enfrentam diariamente.

“Vi pessoas se afastando da família, dos filhos, eu mesma me afastei dos meus pais, até hoje não pude abraçar ou beijar os dois. Vi profissionais chorando, contraindo a doença e se afastando. Somos privilegiados, todos que contraíram Covid não tiveram sequelas mais graves e não perdemos nenhum profissional da unidade”, comemora a gestora.

Reconhecimento pelo trabalho

Primeira profissional de Sumaré vacinada, a enfermeira Carolina Lopes é gerente da UBS (Unidade Básica de Saúde) Florely. O posto é um dos seis referenciados para atendimento de coronavírus na cidade, e o maior em número de atendimentos.

Enfermeira relata medo dos profissionais da UBS em contaminar os familiares – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

A gestora viu os atendimentos da unidade se transformarem, já que originalmente o posto atendia pacientes que moram no entorno e com horário agendado. “Do dia para a noite passamos a atender queixas que eram novas, ninguém sabia como cuidar. Até hoje, depois de um ano, são tantas dúvidas”, disse a profissional.

Ela viu os profissionais ficarem angustiados pelo medo de se contaminar e de levar o vírus para a família. “Colegas minhas com medo de contaminar filho, várias passaram por apuros familiares na pandemia, perda de familiares, infelizmente casos de alguns colegas. Tivemos muito pouco em Sumaré, mas tivemos perda de ao menos dois mais próximos”, disse a profissional.

Diante de todas as dificuldades, Carolina destaca o reconhecimento do trabalho que a equipe da UBS Florely tem realizado como um dos combustíveis para continuar enfrentando a pandemia.

“Sermos escolhidos como a primeira unidade a ser vacinada foi gratificante, vimos como um presente pelo atendimento que sabemos que fornecemos”, finalizou a enfermeira.

Momento mais difícil da trajetória

Infectologista que atende no Hospital Unimed e em consultório na cidade de Americana, Ártemis Kílaris contou que nunca viveu uma situação tão dramática quanto a pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

Infectologista relata que desafios que Covid proporciona – Foto: Divulgação

“Nem na época da epidemia da Aids, que também não tinha tratamento no início, não passamos pelo que estamos vivendo agora. A Covid é altamente contagiosa, diferente do contágio do HIV, ou mesmo da dengue, que ano após ano tem surto. Em 30 anos de formada, nunca pensei em passar por isso”, disse a médica.

Ela contou que o ano de 2020 foi bastante difícil, atuando na linha de frente no consultório, pronto-socorro e UTI. A médica revelou que em 2021, a situação segue no mesmo “pique”.

“Me sentia muito cansada fisicamente e psicologicamente. Os casos que internam são graves, é uma doença ainda desconhecida e cada um responde de uma forma, então gera um estresse muito grande”, contou a médica.

A infectologista lembra que, somado ao lado profissional, as mulheres na linha de frente seguem desempenhando diversas funções.

“Para mim como mulher é mais complicado ainda. Tem que cuidar dos filhos, marido, casa, é um acúmulo de funções que a mulher nunca deixa de exercer, mesmo tendo o lado profissional”, destacou a médica.

Burnout e trabalho em equipe

A infectologista Juliana Ribon assumiu a coordenação do controle de infecção hospitalar do Hospital Municipal Dr. Waldemar Tebaldi, em Americana, apenas três meses antes da OMS declarar pandemia.

Infectologista revelou que teve Síndrome de Burnout – Foto: Ernesto Rodrigues / O Liberal

“Mal sabia que em três meses aconteceria a declaração de uma pandemia e o mundo não seria mais o mesmo. O desafio estava lançado”, disse a profissional.

A pandemia tem submetido os profissionais de saúde a níveis altos de estresse e Juliana revelou que apresentou Síndrome de Burnout. A doença está relacionada ao estresse crônico provocado pela vida profissional, que desencadeia exaustão física e emocional, com sentimento de ineficácia no trabalho.

Nessas ocasiões, o medo das incertezas da pandemia se misturava à tristeza pela perda de alguém para a Covid, seja um paciente, um colega de trabalho ou um familiar. A médica então encontrava conforto na equipe de profissionais do HM.

“Aqueles dias de dor e muitas vezes de solidão pelo isolamento social, longe da minha família, foram marcados pelo apoio e carinho das pessoas que trabalharam comigo e daquelas que ainda seguem ao meu lado. Muitas vezes, eles foram a minha família e nas horas mais difíceis estávamos nos apoiando e promovendo todos os nossos esforços frente a uma doença desconhecida e de ação devastadora”, finalizou a médica.

Batalha contra notícias falsas

Junto com a guerra contra o coronavírus, outra batalha tem sido travada, impactando diretamente na ocupação de leitos: a da informação. Nessa trincheira, a infectologista Raquel Stucchi, do Hospital das Clínicas da Unicamp, tem se destacado como referência nos últimos 12 meses.

Raquel Stucchi lidera combate às fake news – Foto: Marcelo Rocha / O Liberal

Apesar de não estar na linha de frente em função da idade, a profissional tem dado entrevistas e participado de discussões públicas sobre a doença. Ela destaca que, dentro do grande volume de informações que têm sido produzidas, é preciso ser criteriosa sobre o que abordar.

Outra face dessa guerra é o negacionismo de boa parte da população brasileira, instigado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que já defendeu medicamentos sem eficácia, definiu a doença como uma “gripezinha” e, recentemente, recomendou que a população não use máscara.

“Há uma grande dificuldade de controlar uma pandemia em um País cujo dirigente se nega a aceitar o que a ciência mostra como evidência. Isso é uma outra guerra, além do coronavírus tem que travar batalhas contra lideranças políticas, muitas que se sustentam por notícias falsas, ancoradas em grupos médicos que contrariam a ciência e divulgam ‘milagres’, possivelmente à procura de palco e holofotes”, criticou a médica.

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