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Política

Violência política nos EUA, receio no Brasil

Por Agência Estado

24 de janeiro de 2021, às 16h00 • Última atualização em 24 de janeiro de 2021, às 16h42

A postura do ex-presidente Donald Trump durante seus últimos dias no governo americano, marcados pela invasão do Congresso nos Estados Unidos e pela morte de cinco pessoas, levou parte dos analistas políticos no Brasil a reavaliar os riscos à democracia no País. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, a inspiração declarada do presidente Jair Bolsonaro em Trump serve como alerta no momento em que há pressão política e nas ruas (mesmo que incipiente) para a abertura de um processo de impeachment.

Entre parlamentares, há receio de que o caos no Capitólio estimule radicalismos em manifestações no Congresso, em Brasília, embora parte do espectro político seja cético sobre o risco de violência.

A avaliação leva em conta declarações de Bolsonaro que lançam dúvidas sobre a confiabilidade da urna eletrônica no Brasil – que é considerada segura por especialistas da área -, além dos ataques contra a legitimidade política de seus adversários. Um dia após a invasão do Capitólio, o presidente disse que “vamos ter problema pior que os Estados Unidos” caso o Brasil não adote o voto impresso até 2022.

Mais da metade dos brasileiros (56%) considera que a democracia corre risco no País, segundo uma recente pesquisa do Instituto Locomotiva que ouviu 1,5 mil pessoas. Para 40% dos entrevistados, Jair Bolsonaro provavelmente agiria da mesma forma que o ex-presidente americano em caso de derrota na eleição de 2022, e não reconheceria o resultado. Uma proporção equivalente, 42%, diz que ele provavelmente não agiria da mesma forma. A margem de erro da pesquisa é de três pontos porcentuais.

Urnas eletrônicas

A pesquisa também avaliou a confiança do público brasileiro nas urnas eletrônicas. A maior parte acredita que elas são confiáveis. Numa escala de 0 a 10 para a confiabilidade, 57% dá notas entre 7 e 10. Outros 19% dão notas regulares (5 e 6), e 24% dão notas ruins, abaixo de 5, para o nível de confiabilidade no sistema da Justiça Eleitoral.

“Estou mais preocupado do que feliz com o resultado”, disse o presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles. “A quantidade de pessoas que desacredita do processo pode levar a um modelo de radicalização como foi a invasão do Capitólio.”

Parte do mundo político também viu motivos para preocupação. Após a invasão da sede do Congresso americano, nas últimas semanas, grupos bolsonaristas têm convocado manifestações para o próximo dia 1º em Brasília, quando serão retomadas as atividades parlamentares e haverá eleições para as presidências do Senado e da Câmara. O líder do Cidadania no Senado, Alessandro Vieira (SE), traça paralelos entre as duas situações. “Bolsonaro se inspira no Trump constantemente, então é sim possível que ele faça essa sequência de não reconhecer resultado eleitoral”, afirmou. “Esse tipo de mobilização tem sempre aquele risco de descambar em violência, como ocorreu em Washington. É uma eleição interna, então, não faz muito sentido, a não ser para quem tem o desejo de fazer rupturas institucionais.”

A base de apoio a Bolsonaro no Congresso afasta a possibilidade de um futuro clima de violência no País. Para o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), a questão “parte do pressuposto errado”: “Não vejo como construir esse cenário, não há nem adversário para Bolsonaro”. O PP, partido do líder, está entre os cotados para filiar o presidente da República para uma candidatura à reeleição em 2022.

Cultura

Para o filósofo Roberto Romano, professor de ética e filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), há heranças culturais tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil que dão as condições para manifestações como a que resultou na invasão do Capitólio. Segundo ele, tanto Bolsonaro quanto Trump se aproveitaram dessas condições para ganhar apoio popular e, no caso brasileiro, o mau funcionamento de instituições como o Judiciário, o Ministério Público e o Legislativo aumentam os riscos à democracia.

“As instituições brasileiras não funcionam normalmente, a menos que você tenha o delírio como norma”, disse Romano.

Sobre as diferenças entre Trump e Bolsonaro, ele destaca o apoio que o presidente brasileiro ganhou especialmente entre as polícias militares. O professor diz que há uma tentativa de cooptação das forças policiais, e que os exemplos vão desde a sugestão de que PMs tenham desconto na compra de alimentos na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp) aos projetos de lei orgânica que retiram dos governadores poder sobre as polícias.

“Trump não teve condições de dar um golpe de Estado porque ele não teve aquilo que o Bolsonaro tem nas mãos, isso me preocupa muito”, disse o professor. “Ele está cooptando, à custa do perdão à violência armada, o que pode se transformar muito facilmente num exército que pode inclusive ameaçar o monopólio da força física das Forças Armadas oficiais. Esse é o ponto gravíssimo. Acho até estranho que boa parte do generalato e do almirantado brasileiro não tenha percebido uma coisa dessas até agora.”

Segundo especialistas, as redes sociais têm sido estratégicas para o sucesso da rede de apoio ao presidente. As ferramentas digitais dão a Bolsonaro a possibilidade de falar diretamente com seus seguidores, sem contraponto, o que faz com que eventuais notícias falsas ou distorções feitas pelo presidente sejam propagadas livremente. Nesse ponto, também, houve uma assimilação dos bolsonaristas das táticas dos trumpistas dos EUA.

“Da mesma forma como Trump negava a confiabilidade das eleições americanas, Bolsonaro faz isso desde as eleições de 2018 e continua fazendo”, disse a professora Rosemary Segurado, do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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