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Política

PFDC sobre Sérgio Camargo: ‘Liberdade de expressão não protege discurso de ódio’

Por Agência Estado

05 de junho de 2020, às 14h15 • Última atualização em 05 de junho de 2020, às 15h24

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão encaminhou nesta quinta, 4, ofício à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no Distrito Federal pedindo abertura de investigação contra o presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, que classificou o movimento negro como ‘escória maldita’, que abriga ‘vagabundos’, e chamou Zumbi de ‘filho da puta que escravizava pretos’. O procurador federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena, viu improbidade administrativa e racismo nas declarações de Camargo e apontou que as falas são ‘incompatíveis com as finalidades institucionais’ da Fundação Palmares.

As afirmações de Camargo foram feitas durante reunião com dois servidores, no dia 30 de abril e registradas em áudio revelado pelas repórteres Vera Rosa e Julia Lindner. As declarações motivaram representações da Coalizão Negra Por Direitos, de parlamentares, de dezenas de organizações de direitos civis e representantes de religiões de matriz africana e agora da PFDC.

No documento enviado ao MPF do Distrito Federal, a Procuradoria rebateu a alegação de Camargo de que o áudio é ilegal, indicando que a gravação ‘foi legitimamente feita’ e que o momento e que as falas foram registradas ‘se tratava de reunião nas dependências de ambiente público’. Além disso, a Procuradoria destacou que não é possível aventar o direito de liberdade de expressão no caso. “Tal prerrogativa não protege falas eventualmente caracterizadoras do chamado discurso do ódio”, apontou o documento.

Racismo

Nos áudios revelados pelo Estadão, ao tratar do desaparecimento de seu celular corporativo e insinuar que o furto pode ter sido proposital, com o intuito de prejudicá-lo, Camargo afirma: “Eu exonerei três diretores nossos (…). Qualquer um deles pode ter feito isso. Quem poderia? Alguém que quer me prejudicar, invadir esse prédio para me espancar, invadir com a ajuda de gente daqui… O movimento negro, os vagabundos do movimento negro, essa escória maldita”

O órgão do MPF aponta que a conduta do presidente da entidade pode ser caracterizada como racismo e ainda lembra de trecho de representação elaborado pela então Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão Deborah Duprat após Camargo ter determinado, no dia 13 de maio – data em que a abolição da escravatura completou 132 anos -, a publicação de uma série de artigos depreciativos sobre Zumbi, símbolo do movimento negro no Brasil, no site oficial da instituição e nas redes sociais.

O documento afirmava negar ao povo negro a sua história e seus heróis, como é o caso de Zumbi, é atentar contra a instituição que Sergio Camargo preside e pedia que o mesmo respondesse na Justiça por improbidade administrativa.

Nos áudios da reunião com servidores, sob o argumento de que suas opiniões refletem ‘liberdade de expressão’, Camargo mais uma vez criticou Zumbi dos Palmares, que dá nome à autarquia. “Não tenho que admirar Zumbi dos Palmares, que, para mim, era um filho da puta que escravizava pretos. Não tenho que apoiar agenda consciência negra. Aqui não vai ter, vai ter zero da consciência negra. Quando cheguei aqui, tinham eventos até no Amapá, tinha show de pagode no dia da consciência negra”, protestou.

O trecho da representação de Derobah Duprat que foi destacado no novo ofício registra: “Pouco importa que haja parte de negros que se sintam confortáveis com a história que foi oficialmente contada sobre eles. As comunidades totalmente homogêneas, sem fissuras e desacordos, só existem no plano ideal, das ideias. Mas não foi para essa parcela que a Palmares veio a ser criada. Ela estatutariamente existe para o resgate dos valores da influência negra no Brasil”.

‘Desvio de poder’

A PFDC destacou no ofício que a conduta de Camargo, especialmente relacionada à promessa registrada nos áudios, de demitir diretores da Fundação Palmares que não tiverem como ‘meta’ a demissão de um ‘esquerdista’, revela ‘possível desvio de poder, já que transparece a intenção de prejudicar servidores da entidade apenas em razão de divergências ideológicas individuais’.

Ao se referir a processo para tirá-lo do comando da autarquia – que resultou na suspensão de sua nomeação, depois liberada pelo ministro João Otávio de Noronha – Camargo afirmou: “Esses filhos da puta da esquerda não admitem negros de direita. Vou colocar meta aqui para todos os diretores, cada um entregar um esquerdista. Quem não entregar esquerdista vai sair. É o mínimo que vocês têm que fazer”, advertiu.

Segundo a Procuradoria, o ‘conjunto de ameaças’ pode configurar desvio de finalidade e a fala do presidente da autarquia pode ser enquadrada como ato de improbidade administrativa.

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