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Política

Grupo fraudava Lei Rouanet com ‘simulacros de projetos culturais’, diz MPF-SP

Por Agência Estado

11 de março de 2020, às 18h30 • Última atualização em 11 de março de 2020, às 19h25

A procuradora da República Karen Louise Kahn, do Ministério Público Federal em São Paulo, disse que o Grupo Bellini, condenado esta semana pela Justiça Federal por fraudes à Lei Rouanet, fazia “simulacros de projetos culturais”. Segundo Karen, “dezenas de apresentações culturais, produto dos projetos aprovados pelo Ministério da Cultura, eram manipuladas pela organização criminosa”.

A procuradora afirma que o grupo constituía “verdadeiros simulacros de projetos culturais, com um público forjado e um cenário precário que pudessem, minimamente, transmitir ao Estado a aparência de regularidade na execução de tais projetos”.

“Isto, quando o próprio projeto cultural aprovado pelo MinC não era, desde logo, substituído diretamente pelo evento corporativo em benefício exclusivo dos supostos patrocinadores e de seus clientes”, anotou Karen Louise Kahn, autora da denúncia do Ministério Público Federal que levou à condenação dos envolvidos.

Na última segunda, 9, a Justiça Federal em São Paulo condenou 12 envolvidos em desvios de recursos públicos para a promoção de atividades culturais a penas que, somadas, passam de 145 anos de prisão.

Eles foram alvo da Operação Boca Livre, deflagrada em junho de 2016.

Os principais réus integram o núcleo familiar que estava à frente do Grupo Bellini Cultural, conjunto de empresas que, segundo a Procuradoria, coordenou as fraudes com quantias captadas por meio da Lei Rouanet (Lei n. 8.313/91).

Esta é a primeira sentença condenatória no âmbito da Boca Livre. Outras 27 ações penais já foram ajuizadas contra integrantes do Grupo Bellini e representantes das empresas patrocinadoras envolvidas. “Não há, segundo as investigações, evidências de que artistas e servidores públicos responsáveis pela aprovação dos projetos tivessem conhecimento das fraudes, por isso eles não respondem pelos crimes apurados”, informa a Procuradoria.

O número da ação que levou à condenação dos 12 envolvidos é 0001071-40.2016.4.03.6181. Os réus poderão recorrer em liberdade. A tramitação do processo pode ser consultada aqui.

A Procuradoria estima que, ‘além de privar a população de espetáculos e projetos culturais que seriam financiadas com esses recursos’, as irregularidades tenham causado prejuízo superior a R$ 21 milhões aos cofres públicos.

As penas correspondem aos delitos de estelionato contra a União e organização criminosa.

O empresário Antonio Carlos Bellini Amorim, ‘responsável pela articulação dos ilícitos denunciados’, foi condenado a mais de 19 anos de prisão.

À mulher dele, Tania Regina Guertas, foi atribuída pena de 13 anos e 3 meses de reclusão.

A sentença da 3.ª Vara Criminal Federal de São Paulo também aplica sanções a dois filhos de Bellini – Felipe Vaz Amorim (17 anos e 4 meses de prisão) e Bruno Vaz Amorim (10 anos de prisão).

As fraudes que levaram à condenação dos réus foram praticadas entre 2011 e 2016, mas há evidências de que o esquema já estava em curso desde o ano 2000, destaca o Ministério Público Federal.

A Operação Boca Livre mostra que o Grupo Bellini Cultural especializou-se na realização de projetos culturais para clientes privados com financiamento por meio da lei de incentivo fiscal.

O montante captado de patrocinadores, que deveria se destinar a apresentações artísticas e outras programações culturais à população, acabava sendo usado para a promoção de interesses corporativos.

O abatimento no imposto de renda das companhias que contratavam os serviços dos réus – benefício previsto na Lei Rouanet em troca do patrocínio projetos culturais – ‘revertia-se na verdade em vantagens ilícitas para essas empresas, como a produção de livros comemorativos e shows particulares com artistas de destaque’.

Além de Bellini, da mulher e dos filhos, oito pessoas ligadas ao grupo foram condenadas, com penas que variam de 4 a 13 anos de prisão. “Elas eram responsáveis pela parte operacional do esquema e figuravam como sócias de uma série de empresas criadas com o objetivo de omitir o nome Bellini das propostas culturais apresentadas para a captação de recursos.”

A atuação dessas empresas associadas à organização criminosa tornou-se mais intensa a partir de 2013, assinala a Procuradoria.

“Naquele ano, o núcleo decidiu mudar sua estratégia para driblar a fiscalização do Ministério da Cultura, que já vinha restringindo a aprovação de projetos do grupo desde o surgimento das primeiras denúncias de irregularidades, em 2011”, pontua a Assessoria de Comunicação da Procuradoria.

Segundo o Ministério Público Federal, enquanto buscava camuflar a origem das propostas que submetia à aprovação do Ministério da Cultura, o Grupo Bellini mudou também a forma de execução dos projetos. De 2014 em diante, as realizações passaram a incluir ‘contrapartidas sociais’ – eventos gratuitos direcionados ao segmento social alvo do projeto e que, embora devessem ser o objeto principal dos contratos, ‘eram promovidos de maneira precária, somente para constar da prestação de contas’.

Em abril de 2016, por exemplo, os réus organizaram um show de comédia para 700 funcionários e colaboradores de um grande escritório de advocacia em uma casa de espetáculos em São Paulo com recursos que, segundo o projeto aprovado, deveriam financiar apresentações musicais de orquestra e cantores consagrados abertas ao público geral.

Para justificar o uso da Lei Rouanet, o Grupo Bellini realizou, no mesmo dia pela manhã, uma apresentação simples de piano no local, sem a presença dos artistas previstos, para uma plateia de apenas 300 pessoas, levadas ao teatro de ônibus.

“Restou comprovado pelas provas existentes nos autos que o Grupo Bellini e seus colaboradores tinham um sistema estruturado cujo principal escopo era a aprovação de projetos culturais por meio de pessoas jurídicas e físicas junto ao Ministério da Cultura para, posteriormente, utilizar as verbas captadas para a realização dos projetos em benefício exclusivo das próprias empresas patrocinadoras, que por sua vez deduziam tais valores do quanto devido a título de Imposto de Renda Pessoa Jurídica”, diz trecho da sentença.

Uma porcentagem do volume de dinheiro captado destinava-se aos próprios integrantes do Grupo Bellini e das empresas associadas, na forma de salários, comissões e pagamentos pelos serviços prestados.

“Notas fiscais falsas também eram utilizadas para maquiar o destino das quantias, como ocorreu em 2016 no casamento de Felipe Vaz Amorim, pouco antes da deflagração da Operação Boca Livre”, relata a Procuradoria, em referência a um filho de Bellini. “O empresário utilizou recursos do esquema para a contratação de uma atração musical da festa, mas o dinheiro foi registrado no balanço contábil como pagamento de serviços de secretariado e cenografia em projetos culturais.”

COM A PALAVRA, A DEFESA

A reportagem buscou contato com a defesa do Grupo Bellini Cultural, mas sem sucesso. O espaço se mantém aberto à manifestação.

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