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Política

‘Evangélicos querem mais espaço na política’, diz socióloga

Por Agência Estado

11 de janeiro de 2020, às 07h21 • Última atualização em 11 de janeiro de 2020, às 09h08

Transferência de “recursos públicos para determinados grupos ou segmentos sociais”, como os religiosos, não é uma exclusividade do governo Jair Bolsonaro, que pretende subsidiar a conta de energia elétrica de grandes templos religiosos, como revelou ontem o jornal O Estado de S. Paulo. Segundo a socióloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro Maria das Dores Campos Machado, que estuda grupos religiosos há mais de 15 anos, o avanço da pauta conservadora e de medidas de interesse das igrejas evangélicas segue um roteiro de expansão traçado para influenciar políticas públicas que se assemelha a estratégia desses grupos nos Estados Unidos. A pesquisadora lembra que, embora o atual governo tenha aberto espaço para assessores e ministros evangélicos, igrejas neopentecostais já haviam apoiado os petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. O governo Dilma chegou a transferir para comunidades terapêuticas ligadas a grupos religiosos recursos públicos destinados ao combate às drogas, medida questionada pelo Conselho Federal de Psicologia na época.

Bolsonaro quer conceder subsídio na conta de luz de templos religiosos. O que isso revela?

É transferência de recursos públicos para determinados grupos ou segmentos sociais. Estão deixando de cobrar de alguns o que é cobrado de outros. Isso acontece desde antes do governo Bolsonaro. O governo Dilma pegou recursos públicos destinados ao combate às drogas e os transferiu a comunidades terapêuticas ligadas a grupos religiosos, mas isso ocorreu sem fiscalização, transparência e controle. As auditorias feitas pelo Conselho Federal de Psicologia resultam em relatórios com uma série de denúncias.

Igrejas evangélicas estão ocupando parte do vácuo deixado pela descrença nos partidos?

A descrença com partidos não é só brasileira. Mas as igrejas crescem e aproveitam muito os vazios das instituições na sociedade brasileira. Então a crise no Brasil favorece as igrejas evangélicas. Não são só as pentecostais e neopentecostais que têm influência nesse governo. Um grupo muito importante nos últimos anos tem sido o dos batistas, que estão presentes no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A titular, Damares Alves, é batista.

Todos esses grupos são conservadores?

No Brasil, os neopentecostais ganharam uma certa hegemonia entre as igrejas evangélicas. Além disso, vários segmentos dos batistas hoje são pentecostalizados. Com a gestão Bolsonaro, há forte presença desses conservadores evangélicos na máquina do Estado, trabalhando como assessores, no Planalto ou na Esplanada.

Como a sra. avalia a atuação da ministra Damares?

Ela é a segunda ministra de maior aprovação no governo, ficando atrás apenas de Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública). Ela vem implementando uma política considerada regressiva no campo dos direitos humanos, da educação sexual e de gênero. No entanto, é a segunda mais bem avaliada.

Nos Estados Unidos, estudos mostram que o crescimento da direita religiosa foi orquestrado. O mesmo acontece aqui?

Desde que Donald Trump foi eleito presidente dos EUA, cresceu muito a circulação de valores e atores do movimento republicano conservador – que tem uma base religiosa muito forte – na América Latina e no Brasil. Entrevistei a Damares em 2011 para uma pesquisa (quando ela era auxiliar legislativa). Ela contou que tinha recebido alguns americanos que gostariam de aprovar uma proposta de abstinência na educação sexual de adolescentes. Naquele contexto, ela não achou interessante. Agora ela está desenvolvendo um programa de combate à gravidez na adolescência pelo estímulo a abstinência sexual de jovens.

Quais valores são disseminados por esses grupos?

Nos últimos anos, tem crescido muito a influência da pauta dos religiosos norte-americanos no Brasil. É uma disseminação de valores puritanos. Durante a campanha presidencial brasileira, vários evangélicos ligados diretamente à equipe de Donald Trump – eram evangélicos sionistas, ou seja, ligados à defesa do Estado de Israel – vieram a uma comemoração em Belo Horizonte e fizeram uma gravação em defesa da campanha de Bolsonaro.

E também há aproximação com o Poder Legislativo?

Hoje em dia, há parceiros brasileiros de grupos como esse no Congresso. O grupo Capitol Ministries, que é financiado pelo vice-presidente dos EUA, Mike Pence, fez em 2019 um evento no Congresso brasileiro. Eles recrutaram alguns pastores brasileiros para coordenar o processo de formação de alianças com legisladores. Primeiro, as ideias deles são defendidas por institutos e ONGs, criados para disseminar valores puritanos ligados à doutrina e à moralidade cristã. Depois esses valores aparecem como iniciativa pública.

Podemos esperar mais avanço dessas pautas?

Podemos esperar que os segmentos evangélicos queiram ampliar as suas prerrogativas no campo político. É de se esperar que esse segmento queira mais. Alguns estão disputando espaço por meio de relações clientelistas. A Igreja Universal apoiou Lula, apoiou Dilma Rousseff e agora apoiou Bolsonaro. Há um deslocamento (do grupo) para a direita.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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