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Economia

‘Vendemos o almoço para pagar o jantar’, diz secretário sobre crise de MG

Por Agência Estado

02 de novembro de 2019, às 12h30 • Última atualização em 02 de novembro de 2019, às 12h41

Atraso de salário e pagamentos parcelados já virou rotina para os servidores do Estado de Minas Gerais, uma das unidades da federação em situação mais crítica. O governo mineiro paga os funcionários de forma escalonada há quase cinco anos. Lá, o 13.º salário é pago fora do prazo legal há quatro anos e o de 2018 foi o que mais atrasou – a última parcela foi quitada há cerca de 15 dias.

Para pagar o salário extra deste ano, o governo de Romeu Zema (Novo) encaminhou ao Legislativo um projeto de lei que propõe a privatização da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), responsável pela exploração de nióbio no Estado, em parceria com a Companhia Brasileira de Mineração e Metais (CBMM). A expectativa é conseguir autorização para antecipar o lucro de R$ 5 bilhões previsto com essa operação. O governo, porém, não tem maioria na Assembleia Legislativa e enfrenta um calendário apertado.

“Hoje, vendemos o almoço para pagar o jantar”, diz o secretário da Fazenda, Gustavo de Oliveira Barbosa. Segundo ele, se o Estado não conseguir aderir ao Regime de Recuperação Fiscal – programa do governo federal que permite a postergação do pagamento da dívida com a União -, será impossível regularizar o calendário de pagamento dos servidores no ano que vem.

A intenção do governo mineiro é conseguir, com o regime, adiar o pagamento da dívida, como ocorreu com o Rio de Janeiro. Lá, os salários estão em dia desde o ano passado. Além do regime de recuperação, o aumento de 87% da receita com royalties em 2018, por conta da recuperação do preço do petróleo, e um Refis (programa de recuperação fiscal) ajudaram o governo fluminense a quitar o 13.º de 2018.

Recursos extraordinários

Seguindo o modelo do Rio de Janeiro, o governo do Rio Grande do Norte negocia o alongamento do perfil da dívida com o governo federal e vai recorrer a recursos extraordinários neste ano para pagar o 13º.

O Estado já repassou a gestão da folha de pagamento dos próximos cinco anos para o Banco do Brasil e, com isso, levantou R$ 250 milhões – quase 50% desse montante será destinado ao pagamento do salário extra no fim do ano. O governo de Fátima Bezerra (PT) pretende conseguir o restante dos recursos necessários – mais R$ 260 milhões – no leilão de petróleo marcado para a semana que vem, em que parte dos recursos arrecadados será repassada aos Estados, dando uma folga no caixa.

No Rio Grande do Norte, o 13.º do ano passado ainda não foi pago e os salários são escalonados. “Esperamos levantar também R$ 180 milhões com a antecipação de royalties. A ideia é conseguir R$ 600 milhões para os pagamentos que vencem em dezembro e para pagar o que está atrasado”, diz o secretário de Planejamento e Finanças, Aldemir Freire. O Estado ainda deve R$ 90 milhões a parte dos servidores referentes ao salário de novembro de 2018.

Para o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, a suspensão do pagamento da dívida com a União é uma das soluções de curto prazo para os Estados normalizarem o pagamento do funcionalismo. Essa alternativa, no entanto, não resolve o problema, destaca.

Segundo ele, para arrumar as finanças no médio e longo prazos, os Estados também precisam passar pela reforma previdenciária – “é o gasto que mais cresceu nos últimos anos” – e o País precisa retomar o crescimento econômico, sem incrementar a carga tributária. “Aumentar impostos não é uma solução viável em uma economia deprimida”, afirma.

‘Cada vez mais difícil’

Professora no Rio Grande do Sul há 38 anos, Angela Gazzana, de 62 anos, é um dos 328,8 mil servidores do Estado que sofrem para receber desde 2015. “Começou com parcelamento, depois atraso, agora é uma coisa que não dá nem para explicar”, diz.

Única fonte de renda da casa, ela sustenta, além de si, um filho universitário e o marido, que precisou parar de trabalhar por problemas de saúde. Sem data certa para receber, pede adiantamento de salário ao Banrisul desde maio do ano passado. Todo mês, 0,98% do salário vai diretamente para o banco estatal em forma de juros.

“Não parece muito, mas é revoltante pagar juros sobre o teu próprio salário para o Estado que não te paga”, afirma. “Sem isso (adiantamento), a gente não come.”

Angela é diretora da escola estadual General Daltro Filho, em Porto Alegre, há 13 anos. Por isso, acompanha a situação dos outros professores de perto. “O sentimento geral é de que está cada vez mais difícil. Alguns colegas não têm mais dinheiro nem para pegar ônibus.”

Nesses últimos anos, ela viu outros professores reduzirem sua carga horária no Estado e buscarem emprego nas redes municipal e privada de ensino. “Me lembro de dois casos assim. Com certeza a questão salarial pesou para essa decisão.”

Alívio

Enquanto isso, no Rio de Janeiro, único Estado que já está no programa desenhado pelo governo federal para socorrer aqueles que estão em situação de emergência fiscal, a regularização do pagamento dos salários foi um alívio para 466 mil servidores.

Desde abril do ano passado, os funcionários do Estado vêm sendo pagos em dia.

O agente penitenciário Iranildo Oliveira de Lima, de 40 anos, que integra o quadro de servidores fluminense há oito anos e meio, estuda agora a possibilidade de comprar uma casa própria – projeto que havia adiado por causa dos atrasos de pagamento.

Nos piores anos da crise fiscal do Rio, Lima só conseguiu manter as contas em dia com a renda de um segundo emprego em uma loja de roupas. “(À época), a gente não tinha estímulo para ir trabalhar. Chegava o final do mês, você nunca sabia se ia receber. Tinha a promessa de pagamento em um dia, esse dia chegava, e o salário não vinha. Aí o governo empurrava mais”, lembra. “Quando começaram a parcelar o pagamento foi horrível, você não tinha o dinheiro na sua mão.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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