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Economia

Sem recursos, Censo pode sair só em 2023

Por Agência Estado

23 de abril de 2021, às 21h55 • Última atualização em 23 de abril de 2021, às 23h09

O cancelamento do Censo Demográfico provoca prejuízos que vão desde a dados imprecisos sobre o mercado de trabalho até dificuldades na realização de amostras para condução de pesquisas eleitorais, alertou nesta sexta-feira, 23, Roberto Olinto, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O IBGE divulgou uma nota para os servidores do órgão informando que a publicação da Lei Orçamentária de 2021 sem a recomposição do orçamento original de R$ 2 bilhões para o Censo Demográfico inviabilizou a operação censitária este ano. O Censo deveria ter ido a campo em 2020, mas acabou adiado por conta da pandemia. Segundo o instituto, a direção do IBGE retomará as tratativas com o Ministério da Economia, a quem é subordinado, para planejar e promover a realização do censo em 2022.

O governo federal reduziu ainda mais a verba destinada à realização do Censo Demográfico. Dos R$ 2 bilhões previstos, apenas R$ 71 milhões foram aprovados pelo Congresso Nacional no mês passado. No entanto, o orçamento sancionado e publicado no Diário Oficial da União desta sexta-feira, 23, traz um veto do presidente Jair Bolsonaro que reduz esse valor para cerca de R$ 53 milhões, o que inviabiliza até os preparativos para o levantamento ir a campo em 2022, afirma o sindicato nacional dos servidores do IBGE, o Assibge. O texto aprovado no congresso previa R$ 53 milhões de custeio e outros R$ 17,750 milhões de investimento, que acabaram vetados pelo presidente, ressalta o sindicato.

“Primeiro que não vai ter censo este ano, mas com o dinheiro que está disponível não vai ter nem no ano que vem. Porque precisa de dinheiro para os preparativos, como a atualização do cadastro de endereços, que não pode ser feita por causa da pandemia. Tem que fazer licitação para compra de equipamentos, que precisa ocorrer com antecedência. O cenário que parece no horizonte é que não vai ter censo”, alertou Roberto Olinto, atualmente pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Os recenseadores contratados como trabalhadores temporários pelo IBGE deveriam visitar os cerca de 71 milhões de domicílios brasileiros a partir de agosto deste ano. As informações recolhidas servem de base, por exemplo, para o rateio do Fundo de Participação de estados e municípios. As informações também são essenciais para políticas de saúde, como a necessidade de alocação de profissionais e equipamentos para atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e planejamento de políticas educacionais.

“As empresas privadas também são prejudicadas. Como vão fazer investimentos se não conhecem o país? Isso vai desde o cara que vai abrir uma padaria até uma fábrica. O censo é informação, ele geo-referencia todo o país, porque você tem cada domicílio pesquisado”, explica Olinto.

As informações do censo demográfico também servem de base para pesquisas amostrais, como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do próprio IBGE, que levanta dados do mercado de trabalho, como a taxa de desemprego.

“Para você ter uma amostra que seja efetivamente representativa do país, precisa do censo. Sem atualização, a amostra perde consistência. Vai afetar os dados do mercado de trabalho. As pesquisas eleitorais também têm amostras feitas com base no censo. Qualquer instituto de pesquisas usa o censo. É uma cascata de problemas”, disse Olinto.

O sindicato de servidores do IBGE avalia que sejam necessários R$ 239 milhões para manter os preparativos do censo em 2021 de forma a possibilitar que a coleta vá a campo em 2022.

Roberto Olinto defende que haja uma articulação política conduzida pelo governo para recompor emergencialmente os recursos necessários para os preparativos deste ano para o censo, seguida por uma discussão da Lei Orçamentária Anual que garanta a verba para a coleta do ano que vem já nos trabalhos que se iniciam em meados deste ano.

“O que assusta é o descaso com que o Ministério da Economia tratou esse censo. Não houve nenhuma manifestação de defesa do censo. Além do descaso com o censo, tem o descaso com o instituto de estatísticas do país, que está abandonado”, lamentou Olinto.

O IBGE informou que se manifestaria sobre o novo cronograma do Censo Demográfico, sobre o concurso em aberto para seleção de recenseadores e sobre a nomeação do novo presidente apenas depois que os atos fossem publicados no Diário Oficial da União. Procurado novamente pelo Broadcast, o IBGE não respondeu aos questionamentos até a publicação desta reportagem.

O corte no orçamento do censo gerou uma crise na direção do IBGE. No último 26 de março, dia seguinte à aprovação pelo congresso da redução no orçamento do levantamento censitário, a presidente Susana Cordeiro Guerra informou ter pedido exoneração do cargo. Ela permaneceu à frente do órgão por mais duas semanas, até 9 de abril, quando foi substituída interinamente pela então diretora executiva do órgão, Marise Ferreira, servidora de carreira do IBGE há 37 anos.

Há pouco mais de uma semana, no dia 14, o instituto anunciou que o atual diretor de Pesquisas, Eduardo Rios Neto, foi indicado pelo Ministério da Economia para assumir a presidência, mas sua nomeação ainda não foi publicada no Diário Oficial.

Realizado a cada dez anos, o Censo Demográfico deveria ter ido a campo em 2020, mas foi adiado para 2021 em função da pandemia do novo coronavírus. O IBGE terá que cancelar pelo segundo ano consecutivo o concurso público aberto para preencher as mais de 200 mil vagas temporárias de recenseados e agentes censitários que trabalhariam no levantamento. As provas presenciais que seriam realizadas este mês já estavam adiadas, sem nova previsão de data. Um concurso anterior tinha sido aberto pelo órgão em 2020, mas acabou cancelado, e o dinheiro das inscrições foi devolvido.

Os contratados no novo processo seletivo visitariam todos os cerca de 71 milhões de lares brasileiros entre agosto e outubro deste ano, nos 5.570 municípios do País. O órgão esperava que mais de dois milhões de pessoas se inscrevessem no processo seletivo, que tinha as provas objetivas presenciais marcadas para o dia 18 de abril para as vagas de agentes censitários e 25 de abril para os recenseadores.

Quando ainda era preparado, o censo foi orçado pela equipe técnica do IBGE em mais de R$ 3 bilhões, mas Susana Cordeiro Guerra anunciou em 2019 que faria o levantamento com R$ 2,3 bilhões. Em meio às restrições orçamentárias, a direção do órgão decidiu que o questionário do censo seria reduzido, o que ajudaria na economia de recursos. Com o adiamento de 2020 para 2021, o governo federal enxugou ainda mais o valor destinado ao levantamento no orçamento deste ano enviado ao congresso, para R$ 2 bilhões. Quando o novo corte na Lei Orçamentária Anual (LOA) foi aprovado na Comissão Mista de Orçamento (CMO), o IBGE divulgou nota em que alertava sobre a impossibilidade de realizar o censo com tais recursos, e ganhou apoio de um grupo de ex-presidentes do órgão, em manifesto assinado por Edmar Bacha, Eduardo Nunes, Eduardo Augusto Guimarães, Edson Nunes, Eurico Borba, Sérgio Besserman, Simon Schwartzman e Silvio Minciotti.

“Como ex-presidentes do IBGE, instamos aos senhores Senadores e Deputados, membros da Comissão Mista do Orçamento, que preservem os recursos do censo e não deixem o país às cegas”, apelava o texto.

Dezenas de entidades de pesquisa divulgaram carta aberta em defesa do censo, mas demandando também o adiamento do levantamento para o ano de 2022, em função do recrudescimento da pandemia de covid-19 no País. Entre os signatários estavam a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (Anpege). Os pesquisadores demonstravam preocupação com a sucessão na presidência do órgão e recomendavam o adiamento da coleta do censo para o ano que vem, “de maneira a garantir a segurança não apenas dos recenseadores e todos os demais nele envolvidos diretamente, mas também da população brasileira”.

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