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Decisão

STF rejeita ação sobre aborto para grávidas com zika

O processo, movido pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), foi analisado no plenário virtual da Corte, uma ferramenta online que permite aos magistrados votarem sem se reunir presencialmente

Por Agência Estado

01 de maio de 2020, às 13h31 • Última atualização em 02 de maio de 2020, às 10h21

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta, 30, rejeitar uma ação que pedia, entre outras coisas, o direito de aborto para grávidas infectadas pelo vírus da zika.

A Corte já havia formado maioria no sábado, 25. O último a votar foi o ministro Luís Roberto Barroso, que acompanhou a relatora, Cármen Lúcia, mas, com ressalvas, reiterando posicionamento pela descriminalização do aborto.

O processo, movido pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), foi analisado no plenário virtual da Corte, uma ferramenta online que permite aos magistrados votarem sem se reunir presencialmente. A relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, votou por rejeitar a ação – no jargão jurídico, “não conhecer” a ação, sem analisar o mérito.

Único a apresentar ressalvas, Barroso afirmou que, diante da maioria que já se formou no plenário virtual para negar seguimento à ação, não abriria divergência.

Barroso contra a criminalização

Por outro lado, disse entender que a Anadep tinha legitimidade para entrar com a ação e considera que ‘a extinção das ações adia a discussão de um tema que as principais supremas cortes e tribunais constitucionais do mundo em algum momento já enfrentaram’.

“A reflexão que se segue, portanto, parece-me necessária e, em rigor, transcende a questão da Zika e da microcefalia, alcançando os direitos reprodutivos das mulheres de maneira geral”, afirma.

Barroso ressaltou que ‘o aborto é um fato indesejável, e o papel do Estado e da sociedade deve ser o de procurar evitar que ele ocorra, dando o suporte necessário às mulheres’. “Essa é a premissa sobre a qual se assenta o raciocínio aqui desenvolvido”.

O ministro reiterou posicionamento externado durante durante julgamento na Primeira Turma, em 2016, em que se manifestou pela descriminalização do aborto na análise de prisão preventiva de médicos e funcionários de uma clínica. Na ocasião, por maioria, a turma concedeu habeas corpus para soltura dos envolvidos.

Segundo Barroso, ‘o tratamento do aborto como crime não tem produzido o resultado de elevar a proteção à vida do feto’. “Justamente ao contrário, países em que foi descriminalizada a interrupção da gestação até a 12ª semana conseguiram melhores resultados, proporcionando uma rede de apoio à gestante e à sua família”.

“Esse tipo de política pública, mais acolhedora e menos repressiva, torna a prática do aborto mais rara e mais segura para a vida da mulher”, afirmou.

Barroso disse ainda que o ‘acesso aos serviços públicos de saúde, aconselhamento adequado, informações sobre métodos contraceptivos e algumas gotas de empatia produzirão melhor impacto sobre a realidade do que a ameaça de encarceramento’.

“Atirar no sistema penitenciário mulheres que já vivem um quadro aflitivo, quando não desesperador, é não compreender a grandeza do sofrimento de quem se encontra em tal situação. Ninguém faz aborto por prazer ou por perversidade”, escreveu.

O ministro ainda afirmou ser importante ‘registrar que praticamente nenhuma democracia desenvolvida do mundo combate a interrupção da gestação com direito penal. “Justamente porque existem alternativas menos traumáticas e mais eficientes”. “Há de haver alguma razão para isso”.

Por outro lado, disse que se deve ter um ‘profundo respeito pelo sentimento religioso das pessoas’, ao lembrar que a ‘tradição judaico-cristã condena o aborto’. “E, portanto, é plenamente legítimo ter posição contrária ao aborto, não o praticar e pregar contra a sua prática”.

“Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições – tratar o próximo como desejaria ser tratado – é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama? Pessoalmente, não creio. Portanto, sem abrir mão de qualquer convicção, é perfeitamente possível ser simultaneamente contra o aborto e contra a criminalização”, concluiu.

‘Não haverá aborto’

Na última quinta-feira, 30, o presidente Jair Bolsonaro disse que enquanto for presidente “não haverá aborto”. Na saída do Palácio da Alvorada, o presidente parou para falar com apoiadores e ouvir um coral de crianças coordenadas pelo padre polonês Pedro Stepien. As crianças cantaram uma música religiosa e fizeram um pedido ao final: “Senhor presidente, temos um pedido para o senhor, não queremos aborto”.

O Código Penal prevê que a interrupção da gravidez no Brasil é permitida apenas nos casos em que a gestante corre risco de vida ou quando a gravidez decorre de estupro. Em 2012, o STF decidiu que não é crime a interrupção da gravidez em casos de anencefalia.

Omissões

Ao entrar com a ação no STF, a Anadep apontou falhas do Poder Público no acesso à informação, a cuidados de planejamento familiar e aos serviços de saúde no enfrentamento do zika, além de omissão sobre a possibilidade de interrupção da gravidez para mulheres grávidas infectadas pelo vírus.

A Anadep também pede a obrigação de haver médicos capacitados para o diagnóstico clínico de infecção por zika em unidades do SUS e a imediata disponibilidade nos hospitais de exames para a detecção da infecção.

Em 2016, em manifestação encaminhada ao Supremo, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), por meio da Advocacia do Senado Federal, alegou que o aborto nessas circunstâncias “diz respeito a um dissenso moral profundo”, sobre o qual dificilmente os parlamentares vão adotar uma “uniformidade de posições”. Para o Senado, a “repulsa ao aborto está profundamente arraigada na cultura brasileira”.

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